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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

30
Mai23

Após Zé Trovão pedir que EUA prendessem Nicolás Maduro, jurista questiona se ele incorreu em crime contra a soberania do Estado

Talis Andrade
 
 
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Para Marcelo Uchôa, "é preciso analisar direitinho a peça encaminhada à Embaixada dos EUA pelo deputado José Trovão pedindo a intervenção nos assuntos internos do Brasil"

 

247 - O jurista e professor Marcelo Uchôa usou as redes sociais para questionar se o deputado federal bolsonarista Zé Trovão (PL-SC) incorreu em crime contra a independência e a soberania do Estado ao enviar um ofício à Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, na segunda-feira (29), onde informava a presença do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, no país, e solicitava a verificação de “quais medidas poderiam ser adotadas pelo governo americano para a captura deste criminoso”.

“É preciso analisar direitinho a declaração e a peça encaminhada à Embaixada dos EUA pelo deputado José Trovão pedindo a intervenção norte-americana nos assuntos internos do Brasil para saber se ele não cometeu crime contra a independência e a soberania do Estado”, escreveu Uchôa no Twitter. 

No ofício enviado à representação diplomática estadunidense, Zé Trovão diz que o nome de Maduro consta no site do Drug Enforcement Administration (DEA), como “procurado por autoridades norte-americanas, acusado pelo procurador-geral dos Estados Unidos, sr. Willian Barr, dos crimes de narcotráfico, terrorismo internacional e corrupção”.  Zé Trovão, porém omitiu no ofício que ele mesmo já teve experiências com cocaína. 

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, desembarcou em Brasília na noite do domingo (28) para uma reunião com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na segunda-feira e com outros presidentes sul-americanos ao longo da semana. Nesta terça-feira (30), Maduro participa de uma reunião com líderes dos 12 países da América do Sul realizada em Brasília e proposta pelo presidente Lula visando uma maior integração entre os países da região. 

 

 

 
21
Jan23

Tenente-coronel ‘caixa 2’ de Bolsonaro ligado a atos golpistas e rachadinhas palacianas

Talis Andrade
 
 
 
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Principal investigado é o ajudante de ordens do ex-presidente, mas materiais mostram que o ex-presidente estava ciente de tudo

 

por Yahoo! /Metrópoles

Investigações que correm no Supremo Tribunal Federal (STF), obtidas pelo Metrópoles, conectam o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) à suposta existência de um ‘caixa 2’ dentro do Palácio do Planalto e o ligam à realização de atos antidemocráticos.

De acordo com a reportagem publicada pelos jornalistas Rodrigo Rangel e Sarah Teófilo, um homem de confiança de Bolsonaro gerenciava o suposto 'caixa 2', que funcionava com dinheiro vivo proveniente de saques feitos a partir de cartões corporativos da Presidência e de quartéis das Forças Armadas.

O dinheiro era usado, entre outras coisas, para pagar um cartão com despesas pessoais da ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro – criado no nome de uma amiga dela, Rosimary Cardoso Cordeiro, funcionária do Senado - e para pagar contas pessoais do clã presidencial.

As investigações estão sob o comando do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

Entenda

O tenente-coronel do Exército Mauro Cesar Barbosa Cid – conhecido como “coronel Cid” – é o personagem central das investigações. Homem de confiança de Bolsonaro, ele era:

  • Ajudante de ordens do ex-presidente até o final do mandato;
  • Guardião do celular de Bolsonaro, atendendo ligações e respondendo mensagens;
  • Responsável por tarefas corriqueiras da família, como pagar as contas – a mais sensível, no caso;
  • Camareiro real

Ele também era encarregado de pagar contas pessoais da família de Michelle.

Muitas das operações realizadas pela equipe de Cid era com dinheiro em espécie, na boca do caixa de uma agência bancária localizada dentro do Palácio do Planalto.

Durante as investigações, os policiais identificaram que o modus operandi de Cid era parecido com o apurado nas rachadinhas que envolviam o atual senador Flávio Bolsonaro, filho 01 do ex-presidente. As ações envolviam:

  • Dinheiro manejado à margem do sistema bancário;
  • Saques em espécie;
  • Pagamentos em espécie;
  • Uso de funcionários de confiança nas operações;
  • Versão palaciana do miliciano Fabrício José Carlos de Queiroz. 

A partir daí, os investigadores começaram a enxergar fortes indícios de lavagem de dinheiro. Além dos saques a partir de cartões corporativos, Cid recebia valores provenientes de saques feitos por militares lotados em quartéis de fora de Brasília. Uma zona. 

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08
Out22

Presidenta da Casa Rui Barbosa defende Bolsonaro e normaliza canibalismo

Talis Andrade

 

Leticia Dornelles comparou declaração do presidente, de que comeria indígena, com acidente aéreo na Cordilheira dos Andes, em 1972

 

O vídeo, que viralizou esta semana com as declarações de Jair Bolsonaro (PL), durante entrevista ao jornal estadunidense The New York Times, em 2016, de que só não comeu carne humana de um indígena em Surucucu porque ninguém quis ir com ele, chocou o país.

Porém, ainda há pessoas que tentam defender o que disse o presidente da República. Leticia Dornelles, presidente da Casa Rui Barbosa, foi às redes sociais para normalizar as afirmações de Bolsonaro, comparando suas declarações com uma das maiores tragédias ocorridas na América do Sul.

“O voo uruguaio 571 transportava 45 pessoas. Caiu na Cordilheira dos Andes em outubro de 1972. Os 33 sobreviventes ficaram 72 dias perdidos no gelo. Faltou alimento. Aconteceu o horror. São monstros? Não. Pode imaginar o trauma? Tirado de contexto, eles seriam canibais? Raciocine”, postou Leticia.

A comparação, no mínimo infeliz, foi com o que ocorreu no dia 13 de outubro de 1972, quando o time de rugby do Uruguai viajava para Santiago do Chile. O avião caiu na Cordilheira dos Andes, a mais de 4 mil metros de altitude.

Os passageiros que não morreram no acidente, após mais de 70 dias sem serem resgatados, tiveram de se alimentar de carne humana para sobreviver. Ou seja, havia uma situação limite, nada semelhante ao que relatou Bolsonaro.

“Morreu o índio e eles estão cozinhando, eles cozinham o índio, é a cultura deles. Cozinha por dois três dias, e come com banana. Daí eu queria ver o índio sendo cozinhado, e um cara falou, ‘se for ver, tem que comer’, daí eu disse, eu como! E ninguém quis ir, porque tinha que comer o índio, então eles não me queriam levar sozinho, e não fui”, disse Bolsonaro na entrevista.

Vale ressaltar que a Casa Rui Barbosa é um dos principais centros de intelectuais, pensadores e pesquisadores do Brasil.

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23
Set22

Corrupção no MEC: Empresário afirma ter recebido pedido de propina escondido em pneu

Talis Andrade

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O empresário e candidato a deputado estadual pelo PP no Pará, Ailson Souto da Trindade, acusou o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, de negociar propina para construção de igrejas das denominações dos pastores Arilton Moura e Gilmar Santos, que, segundo denúncias, atuavam como lobistas no Ministério da Educação (MEC).

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, Trindade afirmou que a propina no valor de R$ 5 milhões seria entregue aos religiosos no pneu de uma caminhonete que faria o trecho de Belém (PA), onde está localizada sua empresa de construção a Goiânia (GO), sede da igreja dos pastores.

O advogado de Milton Ribeiro, Daniel Bialski, negou a acusação. Segundo ele, a acusação é "leviana, mentirosa e feita com intuito e interesse eleitoreiro".

Ailson Trindade atua no ramo da construção civil e responde por crime de estelionato. De acordo com o jornal, o empresário foi acusado de aplicar golpes em beneficiários do Bolsa Família, o que ele nega.

Em março, o jornal havia revelado a existência de um esquema no Ministério da Educação no qual pastores ofereciam facilitar o acesso a recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) em troca de benefícios. Ao GLOBO, o prefeito Kelton Pinheiro relatou pedido de propina entre R$15 mil e R$40 mil e até mesmo solicitação para compra de bíblias feita pelo pastor Arilton Moura. Na ocasião, há seis meses, outros prefeitos também foram à público relatar pedidos semelhantes.

As denúncias levaram à Polícia Federal a investigar o caso e à prisão do ex-ministro Milton Ribeiro e dos dois pastores. Eles acabaram sendo liberados no dia seguinte.

Trindade, que só decidiu falar agora, disse que esteve no MEC em 13 de janeiro de 2021, quando participou de uma reunião de Ribeiro com prefeitos de todo país. Na ocasião teria ocorrido a negociação da propina. Em troca do pagamento, a construtora do empresário seria beneficiada com obras do MEC.

— Funcionou assim: o ministro fez uma reunião com todos os prefeitos. Depois houve o coquetel, num andar mais acima. Lá, a gente conversou, teve essa conversa com o ministro. Eu não sabia nem quem era o ministro. Ele se apresentou: 'Eu sou Milton, o ministro da Educação, e o Gilmar já me passou o que ele propôs para você e eu preciso colocar a tua empresa para ganhar licitações, para facilitar as licitações. Em troca você ajuda a igreja. O pastor Gilmar vai conversar com você em relação a tudo isso’— disse o empresário ao jornal "O Estado de S. Paulo".

De acordo com ele, os pastores pediram pagamento imediato de R$ 5 milhões e depois de 15 dias outros R$ 50 milhões. O empresário afirma que suspeitou do método de pagamento e disse que precisava de um contrato e efetuar o pagamento em conta. E que desistiu porque ficou "com medo desse tipo de negociata".

 

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08
Ago22

A formação das milícias bolsonaristas

Talis Andrade
 
 
por Victor Farinelli
 

 

A flexibilização da legislação para comercialização, aquisição e porte de armas de fogo por parte de civis, o que inclui a multiplicação de CACs (caçadores, atiradores desportivos e colecionadores de armas) e dos clubes de tiro, não só é uma das promessas feitas por Jair Bolsonaro em sua campanha de 2019 e cumpridas durante seu mandato como Presidente da República. Também parece ser um dos pontos centrais da estratégia política com a qual pretende, ao menos, assegurar um setor da população fiel ao seu projeto político e manter-se no poder através dela.

Esta peça do Xadrez da Ultradireita abordará como o bolsonarismo não só impulsionou decretos favoráveis à disseminação de armas de fogo nas mãos da população civil como também aproveitou brechas legais para alimentar certos setores, como os CACs e clubes de tiro.

Além disso, recordará os casos em que essas políticas terminaram sendo aproveitadas por grupos paramilitares e facções criminosas.

 

O javali e a multiplicação dos CACs

 

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A introdução do javali no território brasileiro mudou completamente um panorama onde a caça era uma atividade totalmente proibida em todo o território nacional, há até pouco tempo.

Se trata de uma espécie natural das matas brasileiras: estudos indicam que os primeiros javalis entraram no Brasil pela fronteira com o Uruguai na Década de 1960. No começo deste século, se tornaram uma praga para os agricultores do Rio Grande do Sul, que reclamavam que o animal consumia parte de suas plantações, e também aumentava o risco de transmissão de doenças. Por essa razão, em 2013, o IBAMA autorizou a caça desse animal em todo o território nacional, com o objetivo de evitar sua reprodução – e, ainda assim, acrescentando regras para a atividade de forma a coibir os maus tratos.

No entanto, os resultados dessa política mostram um retumbante fracasso nesse objetivo. Em 2002, segundo dados do Plano Nacional de Prevenção, Controle e Monitoramento do Javali (programa coordenado pelo Ibama), havia presença de javalis em apenas 12 municípios brasileiros, todos eles no Rio Grande do Sul. Em 2015, já eram 472 cidades com javalis, incluindo estados do Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste. Após a autorização, o salto foi ainda maior: entre 2015 e 2019, com a caça já legalizada em todo o Brasil, o número de munícipios que registraram presença dessa espécie quase dobrou, chegando a 816 no final desse período.

Além do fracasso dessa política em controlar a suposta praga, também é chamativo o fato de que ela desencadeou outra tendência que vem crescendo nesse mesmo período, a partir de 2015, que é a de licenças para CACs (sigla para Caçadores, Atiradores Desportivos e Colecionadores de Armas), status que facilita o porte e a aquisição de armas de fogo.

A caça do javali foi a porta de entrada de muitos CACs, através de uma das modalidades pela qual se pode solicitar tal licença: obviamente, a dos caçadores. Com a desculpa de que atuariam no combate à disseminação dessa espécie no interior do Brasil, o número de CACs vem aumentando paulatinamente.

Segundo uma reportagem da BBC News, em 2014 havia somente 9 mil licenças vigentes para CACs no Brasil. Em 2018, esse número saltou para 88 mil – os números são do Exército, que é quem entrega essas licenças a civis.

Porém, foi no governo de Jair Bolsonaro que os CACs não só se multiplicaram exponencialmente como passaram a contar com novos benefícios, através das novas portarias que facilitaram a aquisição de armamento de maior qualidade, e em maior quantidade.

Segundo reportagem do Fantástico da Rede Globo, também com dados entregues pelo Exército, foram registradas 193 mil licenças de caçadores (uma das modalidades de CACs) entre janeiro de 2019 (início do governo de Bolsonaro) e agosto de 2021, um aumento de 243% em comparação com todo o governo de Michel Temer (maio de 2016 a dezembro de 2018). Como o javali é a única espécie cuja caça é legalizada, supõe-se que todo esse contingente estaria atuando exclusivamente no combate a esse animal.

 

Sem limites para a aquisição de armas

 

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Esse crescimento no número de CACs levou a um cenário inédito na história do Brasil: atualmente, existem mais civil que militares e policiais com autorização para usar armas de fogo. Sim, porque os CACs atualmente são 605 mil (segundo dados do Exército), enquanto o número de militares na ativa nas três Forças Armadas é de cerca de 360 mil, segundo o Global Fire Power Index, e as forças policiais brasileiras reunidas possuem cerca de 406 mil, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Junto com esse aumento das licenças está o maior acesso dessas pessoas a armamentos pesados e em quantidades que nem os policiais e militares possuem. Tal situação foi proporcionada pelos decretos assinados por Jair Bolsonaro em 2019, logo em seus primeiros meses de governo, com o qual iniciou o cumprimento de suas promessas de flexibilização do acesso às armas outorgando facilidades e benefícios aos CACs.

Essa situação preocupa até mesmo policiais ativos, como o vereador porto-alegrense Leonel Radde (PT-RS), que é policial civil licenciado e que defende um discurso de que o armamento da população civil aumenta substantivamente os riscos para o trabalho policial.

“Os colecionadores não têm limites para a aquisição de armas de fogo, os atiradores e caçadores têm um limite de 60 a 100 armas de fogo, o que é gravíssimo porque pra quê um indivíduo teria acesso a essa quantidade de armas de fogo, e uma quantidade absurda de acesso a munições de todos os calibres”, comentou o vereador, em entrevista ao GGN.

Radde também chama a atenção para o esforço de Bolsonaro em dificultar a possibilidade de rastreio das armas adquiridas por CACs. Em abril de 2020, o presidente revogou as portarias 46, 60 e 61 (todas elas de março de 2020), cuja finalidade era permitir o rastreamento dos chamados PCEs (Produtos Controlados pelo Exército), como são as armas e munições dos CACs. “Um indivíduo que diz defender a segurança pública negar o rastreio de armas de fogo não tem nenhum sentido lógico”, reclamou o vereador gaúcho.

Porém, na época, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) tinha outra opinião a respeito da revogação das portarias: “Atiradores e CACs sempre apoiaram Bolsonaro para que tenhamos pela primeira vez um Presidente não desarmamentista. É inadmissível que se faça portarias restringindo a importação. A quem isso interessa? Certamente não ao Presidente, que determinou a revogação destas portarias”. O filho do presidente ainda terminou seu tuíte com uma promessa: “mais medidas virão”.

 

Desvio de armas dos CACs para milícias e facções

 

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Um dos maiores temores relacionados à flexibilização das armas no Brasil é que uma nova legislação nesse sentido favorecesse o desvio de armas para organizações paramilitares e para o crime organizado, seja de forma involuntária, com o cidadão armado mas inexperiente perdendo suas armas para criminosos organizados, seja de através do uso voluntário das novas regras para vender ou desviar armas para grupos como milícias e facções criminosas.

Matéria do jornalista Rafael Santos, publicada em fevereiro de 2022 em O Globo, mostra que existem ao menos 25 processos tramitando em Tribunais de Justiça de todo o Brasil sobre o envolvimento de CACs com o crime organizado ou com grupos paramilitares, como as milícias do Rio de Janeiro. Em alguns desses processos, os CACs envolvidos já foram condenados pelos ilícitos, que incluem a facilitação de armamento para os grupos criminosos com os quais colaboram.

A reportagem cita o caso de uma invasão miliciana na favela do Quitungo, na Zona Norte do Rio de Janeiro, no início de 2021. Após alguns meses de domínio da região por parte da milícia, a Polícia Civil fluminense montou uma operação que terminou com a captura de seis integrantes da organização. Após os interrogatórios, os policiais descobriram que dois dos detidos possuíam armas obtidas de forma legal: Marcelo Orlandini e Wallace César Teixeira possuíam licença emitida pelo Exército para atiradores desportivos, uma das modalidades dos CACs.

Em sua defesa, Orladini e Teixeira argumentaram que portavam suas armas enquanto estavam em caminho a um clube de tiro, situação que é legal desde fevereiro de 2021, quando um novo decreto pró-armas de Jair Bolsonaro autorizou o porte de armas municiadas por parte dos CACs “em qualquer itinerário para o local da prática do tiro”.

Um caso que teve repercussão ainda maior, e que também foi lembrado na matéria de O Globo, é o de Vitor Furtado Rebollal Lopez, também conhecido como Bala 40, segundo a Polícia Civil do Rio de Janeiro. Furtado possuía licença de colecionador de armas, outra das modalidades de CACs, e a utilizou para montar um esquema de compra legal de armas, que posteriormente eram vendidas para milícias e facções do crime organizado.

Furtado foi preso em fevereiro de 2022 quando se encontrava em Goiânia, em meio a uma viagem – supostamente de negócios. Em sua bagagem, a polícia encontrou mais de 11 mil balas de fuzil. Dias depois, em uma outra diligência em sua casa, na Zona Norte do Rio de Janeiro, foram apreendidas 54 armas, incluindo 26 fuzis.

Segundo o promotor Rômulo Santos Silva, responsável por investigar o caso, Furtado “usava a prerrogativa de ser CAC para comprar uma quantidade muito grande de armas e munição, o que é permitido atualmente, e depois vender para traficantes”.

Em abril de 2021, a ministra Rosa Webber, do STF (Supremo Tribunal Federal), suspendeu temporariamente alguns dos decretos de Bolsonaro que facilitavam a aquisição e o porte de armas de fogo no Brasil, incluindo as aqueles que beneficiavam os CACs.

Na ocasião, em entrevista para a CNN Brasil,o ex-ministro da Justiça Raul Jungmann (Governo Temer) disse que concordava com a decisão da ministra, e que os decretos de Bolsonaro, especialmente os que outorgavam regalias aos CACs, estavam sendo aproveitados por organizações criminosas para obter armas de fogo legalmente.

Em sua argumentação, Jungmann recordou o episódio de 1995 em que o próprio Bolsonaro, então deputado federal, foi assaltado quando estava em sua moto e tentou se defender com sua arma, mas essa também acabou sendo roubada pelo assaltante. Colecionadores, atiradores e caçadores são uma fonte de arma para o crime organizado. Assalto na vida real não é filme de bang bang e quem fica com a arma são os criminosos”.

Outra reportagem, da Agência Pública, revelou, em novembro de 2021, que apenas no ano passado, segundo dados obtidos junto ao Comando do Exército via Lei de Acesso à Informação, as polícias registraram cerca de 840 armas roubadas ou extraviadas dos CACs entre janeiro e novembro do ano passado, o que significa uma média de 3 armas desviadas por dia.

“A maior parte dessas armas foi levada em roubos ou furtos: 692 neste ano, uma média de 2,5 por dia. O número é maior que em 2020 e em 2019. A legislação estabelece que no caso de arma roubada ou extraviada, um CAC deve procurar uma unidade policial local para fazer um boletim de ocorrência e levar uma série de documentos para comunicar à Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC)”, diz a matéria assinada pelos jornalistas Bruno Fonseca e Laís Martins.

Mais recentemente, em junho de 2022, a Polícia Civil de São Paulo iniciou uma investigação sobre a existência de um possível esquema de venda de armas registradas legalmente em nome de CACs para organizações criminosas como o PCC.

Segundo matéria da Folha de S.Paulo, o pedido de abertura de investigação foi solicitado após duas operações recentes na capital paulista nas quais foram apreendidas grandes quantidades de armas de fogo de alto calibre, incluindo fuzis e submetralhadoras, e quantidades ainda maiores de munição.

Ainda segundo a reportagem, ambas as operações teriam sido realizadas em endereços ligados a supostos membros do PCC e boa parte das armas apreendidas teriam seu registro legal atrelado a pessoas com licenças de CACs.

 

Benefício ao crime organizado

 

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Em entrevista para o GGN, o advogado Felippe Angeli, do Instituto Sou da Paz, explicou como a flexibilização do acesso às armas por parte dos decretos de Bolsonaro, especialmente aqueles que beneficiam os CACs, acabam sendo aproveitados pelas milícias e facções do crime organizado: “agora a gente começa a ver o crime organizado mesmo comprando armas, registrando laranjas como CACs, que são os caçadores, atiradores e colecionadores, e arrumando laranjas para adquirir armamento no mercado legal a partir dessas pessoas, porque, no fim, a arma no mercado legal acaba sendo mais barata que a arma no mercado ilegal”.

Angeli completa dizendo que “a arma de fogo utilizada em crimes em algum momento foi legal. As armas de fogo são instrumentos industriais, salvo alguns raros casos de armas artesanais, feitas por armeiros, cuja circulação no mercado ilegal ou sua apreensão em operações policiais são situações muito excepcionais. A grande maioria das armas de fogo tem marca, é Beretta, é Smith Wesson, é Glock, é Taurus… São produtos industriais que em algum momento, em algum país, foram fabricados dentro da legalidade, e que, em outro momento aquilo foram desviados para o mercado ilegal. Sempre é preciso ter em mente que a arma ilegal já foi legal um dia”.

O vereador porto-alegrense Leonel Radde (PT-RS) considera que essa política de facilitação do acesso às armas por parte do Governo Bolsonaro obedece a uma lógica de fortalecimento de grupos específicos. “O que nós vemos é uma vulgarização e uma propagação ilimitada de armas de fogo, e uma propagação e vulgarização também dos clubes de tiro, com objetivos muito evidentes de armar pequenos grupos paramilitares e milícias. Não por acaso, enquanto nós não temos nenhuma política pública de segurança pública neste momento, também temos que conviver com essa realidade de propagação de armas de fogo entre a população não policial”, analisou o legislador, que também é policial civil licenciado.

 

Benefício ao bolsonarismo

 

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Este tópico não é uma continuação do anterior, que abordou a forma como o crime organizado se aproveita da flexibilização da legislação com respeito às armas de fogo.

Seria uma acusação infundada dizer que Jair Bolsonaro pretende armar o crime organizado com as políticas que promove. Seus interesses em armar a população são outros, e o desvio desses produtos às facções criminosas parecem ser somente um efeito colateral que o bolsonarismo está disposto a aceitar em nome de causas maiores.

O primeiro e primordial interesse tem a ver com cumprir suas promessas à indústria de armas, talvez a mais fiel patrocinadora da sua carreira política desde os tempos em que era um deputado sem pretensões presidenciais, e também da carreira política dos seus filhos.

O advogado Felippe Angeli, do Instituto Sou da Paz, lembra que “em sua longa carreira como deputado federal, Jair Bolsonaro sempre defendeu a maior circulação de armas de fogo, a ampliação do comércio de armas de fogo, sempre foi sua pauta histórica e também dos seus filhos quando ingressaram na política. Sua campanha presidencial também trouxe esse tema, e não foi surpresa que tenha se tornado uma das principais obsessões do Governo Bolsonaro”.

Efetivamente, o discurso a favor de facilitar a aquisição de armas de fogo por parte da população civil é uma marca registrada de Jair Bolsonaro e todos os seus filhos, especialmente através do mantra de que “armar a população é a melhor forma de evitar que se instale uma ditadura no Brasil” – ideia que costuma ser repetida pelo presidente em vários dos eventos públicos em que participa, e também em suas lives transmitidas via redes sociais.

Porém, nenhum outro membro da família, nem mesmo o próprio Jair Bolsonaro, marca tanta presença junto a eventos da indústria ou da ideologia armamentista quanto o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que assim como o pai, também tem uma forte ligação com a indústria de armas.

“É notório o envolvimento da família Bolsonaro, especialmente o Eduardo Bolsonaro, com a indústria de armas, com empresas como a Glock, como a SIG Sauer, a participação do Eduardo em eventos comerciais de armas de fogo nos Estados Unidos, no Brasil, a presença dele em reuniões entre representantes comerciais dessas empresas e o governo. É uma atuação direta junto ao mercado de armamento, uma atuação forte da família como um todo, mas especialmente do deputado Eduardo Bolsonaro, isso é público”, comenta Angeli.

O terceiro filho de Jair Bolsonaro, que é deputado federal por São Paulo, também é o principal interlocutor da família e do governo com representantes a NRA (sigla em inglês da Associação Nacional do Rifle, maior organização estadunidense em favor do discurso e da ideologia armamentista.

O primeiro contato de Eduardo com a NRA foi em 2016, quando foi apresentado a eles pelo ex-lutador Royce Gracie e pelo instrutor de tiro Tony Eduardo, pertencente à família proprietária do clube de tiro Ponto 38 de Santa Catarina – o estabelecimento ficou conhecido nacionalmente em 2018, porque foi visitado pelos filhos de Jair Bolsonaro e por Adélio Bispo dias antes da facada sofrida pelo então candidato em Juiz de Fora, durante evento de campanha.

 

Talvez pela proximidade com a NRA estadunidense, Eduardo Bolsonaro tenta potenciar a consolidação de uma versão brasileira da organização, participando de eventos armamentistas e incentivando movimentos que defendem esse discurso.

Embora nenhuma organização armamentista nacional tenha alcançado ainda a força que a NRA tem nos Estados Unidos, algumas começam a fazer barulho, especialmente com a ajuda das redes sociais. A mais barulhenta delas é o Movimento Pró-Armas, liderado pelo advogado Marcos Pollon – e não causará nenhuma surpresa citar que este é uma pessoa próxima ao deputado Eduardo Bolsonaro.

Dias antes, em 1º de setembro de 2021, Pollon e Eduardo Bolsonaro se reuniram com Silvinei Vasques, diretor-geral da PRF (Polícia Rodoviária Federal, a mesma entidade responsável pela morte do trabalhador Givanildo Santos em Sergipe, em maio passado). O site do Governo Federal diz que o encontro serviu para “apresentação do manual de fiscalização de CACs, que visa trazer segurança jurídica e orientação aos policiais rodoviários federais e já está em fase final de elaboração”. Contudo, parte da imprensa especulou com um suposto pedido para flexibilizar a fiscalização de pessoas que viajavam para Brasília, onde ocorreria o ato de 7 de setembro, convocado pelo presidente para pressionar o STF.

Também foi em um evento do Movimento Pró-Armas, ao lado de Marcos Pollon, que Eduardo Bolsonaro disse que “não tem que respeitar esses caras (da esquerda)”. A frase foi dita em Brasília, e seu discurso transmitido ao vivo pela internet na tarde de 9 de julho de 2022.

 

 

Horas depois, em Foz do Iguaçu, o agente penitenciário Jorge José da Rocha Guaranho, bolsonarista fanático, invadiu uma festa de aniversário na qual não estava convidado, em fúria ao saber que a decoração do evento homenageava o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu partido, o PT. Depois de uma primeira discussão na porta do clube onde era realizada a festa, ele deixou o local prometendo “matar todo mundo”. Voltou minutos depois, armado e disparando ao entrar. Assassinou o aniversariante, o guarda municipal Marcelo Arruda, militante petista, mas também terminou sendo ferido – o que impediu que ele continuasse atirando e cumprisse a promessa que tinha feito pouco antes.

O caso de Foz do Iguaçu termina sendo um alerta para outro possível interesse de Bolsonaro ao armar os cidadãos, ao promover os CACs e a se tornar um ídolo para as pessoas que não só defendem a liberdade de ter armas de fogo como uma ideologia e que conseguiram, graças aos seus decretos, um acesso mais fácil a esses produtos.

Ataques como o de Guaranho, se reproduzidos em vários lugares do Brasil, poderiam gerar o caos que alguns analistas políticos consideram propício para levar adiante estratégias que visem adiar as eleições ou desconhecer os resultados eleitorais se estes forem desfavoráveis a Bolsonaro – e se essa possível derrota, junto com o mantra de que a oposição pretende fraudar as eleições, provocar a ação de lobos solitários dispostos a fazer justiça com as próprias armas.

O vereador porto-alegrense Leonel Radde afirma que toda a oposição – e mais especificamente os partidos de esquerda, como o PT e o PSOL – deve estar preparada para essa possibilidade.

“Eu não digo que a esquerda tenha que temer a lógica desses grupos antidemocráticos, mas ela tem que considerar isso um risco real, e uma grande probabilidade de que isso vai acontecer, senão uma certeza. Nós teremos ações violentas vinculadas ao processo eleitoral, vinculadas a uma disputa ideológica, uma disputa de programas de governo, e isso vai acontecer, não sei se de uma forma estruturada, a ponto de desestabilizar todo o país, mas vai acontecer em algumas regiões”, afirmou Radde, em uma entrevista ao GGN que aconteceu antes do assassinato do petista Marcelo Arruda por ação do bolsonarista Jorge Guaranho.

 

***

Essa reportagem faz parte da investigação do projeto “Xadrez da ultradireita mundial à ameaça eleitoral“, uma campanha do Catarse para produzir um documentário sobre o avanço da ultradireita mundial e a ameaça ao processo eleitoral. Colabore!

 

Equipe de proteção de Lula aponta opositores armados e radicais como 'adversidades'

 

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  • Documento fala sobre acesso ampliado a armas em 2019, após decreto de Bolsonaro
  • Delegados chamam de 'cenário inédito' na democracia brasileira
  • PF diz que ameaças contra Lula são frequentes

 

Entre as “adversidades” enfrentadas pela equipe da Polícia Federal que realiza a segurança do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), foi apontado o "acesso a armas de letalidade ampliada decorrente das mudanças legais realizadas em 2019" como uma das principais.

A PF tem feito a proteção do candidato durante a campanha eleitoral. O documento elaborado pela equipe, ao qual o jornal Folha de S. Paulo teve acesso, pede apoio às superintendências dos estados por onde Lula irá passar.

"O contexto político e social no qual se realizará a operação de segurança é composto por, entre outras adversidades, opositores radicalizados e acesso a armas de letalidade ampliada decorrente das mudanças legais realizadas em 2019", diz o documento. Naquele ano, o presidente Jair Bolsonaro (PL) editou um decreto que ampliou o acesso a armas de fogo entre a população.

Ainda de acordo com a equipe, há "ameaças de morte ao candidato e representantes dos partidos, bem como a perpetração de atos de intimidação e violência, identificados antes do início da campanha, como o atentado ao ônibus da caravana ao ex-presidente Lula, alvejado em maio de 2018 na cidade de Quedas do Iguaçu e Laranjeiras do Sul/PR".

A equipe que protege o petista é de responsabilidade dos delegados federais Andrei Augusto Passos Rodrigues (coordenador), Rivaldo Venâncio (operacional substituto) e Alexsander Castro Oliveira (chefe operacional).

O jornalista Luis Nassif recebe a jornalista Letícia Oliveira e o historiador e professor Michel Gherman. Letícia é editora do El Coyote e monitora grupos de extrema-direita há 10 anos. Michel é Professor de Sociologia da UFRJ, diretor acadêmico do Instituto Brasil Israel, coordenador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos Judaicos-NIEJ do Instituto de História da- UFRJ, Coordenador do LAREP e pesquisador associado do Centro de Estudos Judaicos da USP e do Centro Vital Sasson de Estudos de Antissemitismo da Universidade Hebraica de Jerusalém. Juntos, eles discutem sobre os movimentos da ultradireita no país. 📌 A democracia brasileira é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo capaz de lançar luz sobre a escuridão. Junte-se a nós: http://www.catarse.me/jornalggn

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31
Jul22

Bolsonaro conseguiu uma façanha: destruir a imagem do Brasil de forma muito acelerada, diz Jamil Chade

Talis Andrade

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247 - O jornalista Jamil Chade, em entrevista à TV 247, comentou a mudança da imagem internacional do Brasil durante o governo Jair Bolsonaro. Enquanto governos anteriores levaram o País a ser admirado em todos os cantos do planeta, hoje ele é percebido como uma ameaça à sobrevivência da humanidade, relatou Chade, que vive em Genebra. 

Segundo o correspondente do portal UOL, questões como o aumento do desmatamento, a má gestão do governo federal da pandemia de Covid e as constantes ameaças contra a democracia nos últimos anos contribuíram para o deterioramento da percepção geral dos europeus sobre o Brasil.

“O governo Bolsonaro conseguiu uma enorme façanha, destruir a imagem do Brasil no exterior de uma forma extremamente acelerada e eficaz", sentenciou. "São três elementos que colaboraram com isso: primeiro, os incêndios e a questão do desmatamento na Amazônia. É muito interessante, porque vários líderes internacionais sabiam quem era Bolsonaro, mas a opinião pública, os estudantes e as pessoas na rua conheceram o Bolsonaro pelas chamas na floresta. Foi em 2019 que o nome Bolsonaro passou a fazer parte do ambiente internacional da opinião pública, do taxista, da vendedora de pão, as pessoas que não estão envolvidas diretamente com a política. O nome dele desembarca naquele momento, e o Brasil é apresentado como uma ameaça planetária e à sobrevivência em termos ambientais”, disse. 

“Em seguida, com a pandemia, o Brasil passa a ser uma ameaça sanitária internacional”, enumerou. “Isso é completo com a ameaça democrática. Essa é a destruição”. 

Chade avaliou que o estrago está feito e que a recuperação da imagem internacional do Brasil deve passar por um árduo processo de reconciliação. “A visão que o mundo tinha do Brasil também era errada e ilusória, de um país legal e que não tem problemas, que sabemos que era mentirosa. A história do País é uma história de estupro e violência, e mesmo assim conseguia passar ao mundo uma ideia de um país simpático. Hoje, não existe mais essa imagem. É mais complexa, talvez mais realista, mas que contou com uma destruição avassaladora nos últimos três anos e meio”, sentenciou. 

No Piauí, terra de Ciro Nogueira, chefe da Casa Civil de Bolsonaro e do Orçamento Secreto, e da mãe dele senadora Eliane Nogueira:

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Luiz Ricardo Saldanha de Oliveira
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Capa do jornal Meio Norte traz foto aérea de ato no Piauí e manchete: "Multidão vai a evento de Lula em Teresina"
 
Capa do jornal O Dia com foto aérea do ato e manchete "No Piauí, Lula impulsiona chapa de Rafael e promete combater a pobreza"
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 Lula em Teresina, Piauí, foto Ricardo Stuckert
 

 
14
Mai22

Direito McDonald's: picanha não é picanha, direito não é direito

Talis Andrade

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Por Lenio Luiz Streck /ConJur

Arnóbio Rocha escreve belo texto denunciando o mundo fake (ver aqui). O articulista utiliza o recente caso do McDonald's, que cinicamente respondeu que o McPicanha não era de picanha, mas o molho dava a impressão da experiência do gosto de picanha. Foi obrigado a retirar do cardápio, mas não deve demorar para "repaginar" o sanduíche que era vendido a preço absurdo e com um "toque de chef, gourmet".

Como é possível que alguém engane o consumidor a esse ponto? Claro que é possível. Trata-se de um mundo fake, diz Arnóbio. Correto. E fica chique com um toque do chef.

Há décadas venho falando do direito fast food. Talvez eu tenha sido o primeiro a denunciar esse modelo, que Warat, antes de mim, chamava de direito prêt-à-porter.  A famosa mcdonaldização. Que foi sendo aperfeiçoada com TikTok, visual law e coisas do gênero. E vem mais por aí.

No direito vende-se direito que não é direito. McPicanha... que não é de picanha. Não contém picanha.  Direito sem direito. Direito só com molho de direito — claro, com um toque do chef.

Fast food jurídico é mcdonaldização.  Tudo rápido. Curtinho. Não escreva nada que tenha muitas linhas. E, é claro, desenhe. Mas não é mais direito... E daí? Tem molho à moda do chef.

O resultado da jusmcdonaldização? Comunidade jurídica mal alimentada. Obesa. Como não há picanha, só o cheirinho, só o molho, no direito ocorre algo parecido. Como não há direito no direito, o sujeito se forma reacionário, para dizer o menos. E usa o direito para levar adiante esse reacionarismo.

Vejam um bom exemplo de direito sem direito: não posso afirmar que a estatística ainda vale, porém lembro que, durante nossa luta pela presunção da inocência, 63% da comunidade jurídica era contra as ADCs 43, 44 e 54 (que buscavam a alteração da posição do STF). Ou seja: 63% das gentes formadas em direito eram contra a garantia constitucional da presunção da inocência. A maioria da área do direito era contra o direito.

Agora, o ódio e o rancor voltam. Não seria desarrazoado dizer que esse mesmo percentual de 63% agora acha que o presidente da República pode tudo (e todos os dias), chamando ministros do STF de canalhas e afrontando o Poder Judiciário com um decreto de indulto mcdonaldizado. A parcela da área jurídica que defende o presidente e defende esse ato de indulto acredita que o decreto dispensa qualquer fundamentação que diga respeito ao interesse público e à moralidade. Afinal, como disse um articulista (tem gente buscando fundamento no originalismo norte-americano), é um ato do príncipe.

Até juristas que, em 2016 diziam, com veemência, que Dilma não podia nomear qualquer um para ministro (por exemplo, a nomeação de Lula anulada pelo STF), agora dizem que "presidente pode tudo". É o que eu chamo de "anarco-textualismo", que, por vezes, vira "anarco-voluntarismo".

O pano de fundo: a liberdade de expressão. Como disse uma autoridade não faz muito, "prefiro perder a vida do que perder a liberdade". Que liberdade? A do AI-5? McNífico, não? Ups. Por coincidência,  McNífico é outro sanduíche do McDonalds.

Deixo Antônio Prata, um não-jurista, falar por mim:

"Poucas discussões estão mais mal colocadas, hoje, do que essa sobre a liberdade de expressão. Quando (i) temos bilhões de dólares e a ciência mais avançada (da matemática à psicologia) criando algoritmos que privilegiam, (ii) incentivam e propagam em escala global as opiniões mais extravagantes, chocantes e violentas; (iii) quando o resultado deste comércio desregulado de ideias é o esgarçamento do tecido social, (iv) o afunilamento do espaço público, a polarização política, as guerras culturais,  (v) o crescimento vertiginoso da depressão, ansiedade e suicídio entre jovens; (vi) quando esse sambalelê civilizacional põe a democracia em risco e se fala em Guerra Civil, nos Estados Unidos, e golpe militar, no Brasil, simplesmente defender a liberdade de expressão como um princípio absoluto e pronto, acabou-se, é meter a cabeça num buraco para não ver o que se passa."

E Prata pergunta: "Qual a solução? Mudar os algoritmos? As plataformas melhorarem seus filtros e regras de conduta? Criar-se uma espécie de constituição global para as redes sociais? Não tenho ideia, mas talvez o primeiro passo seja tirar os antolhos da "liberdade de expressão über alles!" e encarar o problema." Pronto. Disse tudo.

O mundo está doente, complementa o articulista:

"(...) uma das causas da doença é a transformação da opinião em commodity e a aplicação da lei da oferta e da procura ao campo das ideias, o que faz com que quebrar a placa com o nome da vereadora assassinada eleja um deputado, mas propostas sólidas sobre educação e saúde pública, não."

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E digo eu: o direito adoeceu. As ofensas (liberdade de expressão über alles) em redes sociais e aqui mesmo no ConJur (está cada vez mais difícil ziguezaguear no entremeio dos palavrões, ataques e nesciedades) demonstram exatamente isso que digo. Pior: gente escondida atrás de apelidos. Imaginem no Twitter.

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Pior de tudo é que o mote principal é exatamente aquilo que se faz todos os dias: em nome da liberdade de expressão está a liberdade de agressão. Das mais abjetas.

Por isso,

(i) Quando defender a tese de que se-pode-tudo

(ii) Quando incentivar, aos histéricos berros, que a Suprema Corte deva ser invadida e que cabeças de ministros devam ser quebradas

(iii) Quando se diz que tudo isso faz parte da liberdade de expressão e quando essa defesa de "liberdade über alles" é feita por gente do direito,

...é porque rotundamente fracassamos.

Na verdade, de há muito chovia na serra... e todos foram comer um McPicanha... sem picanha.

Mas com um toque do Chef!

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27
Abr22

Ex-ministro do Mec faz disparo de arma de fogo que é crime com pena de 2 a 4 anos de cadeia

Talis Andrade

 

 

 
 
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Lenio Luiz Streck
O Brasil é incrivel. Armado, o ex min Milton do mec faz disparo de arma de fogo, que é crime com pena de 2 a 4 anos de reclusão. Isso se ele tem porte. Se não, piora. Provavelmente será dito que foi o demônio que disparou. Pastores Arilton e Gilmar já estão no local. Armados!Image
 
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Em Nova Iorque - lugar tido como exemplo por adoradores de armas - o ex-min da educação seria preso e algemado. Mas por aqui “os rigores da lei são para os inimigos”. Para os amigos, a benevolência. Por isso os pastores só foram ao palácio para orar. Obraram!Image
 
 
De todo modo, poderá ser indultado (sarcasmo!!!).

Grozny Arruda
@ArrudaGrozny
TEMPOS NEONAZISTA . . . . Ex-ministro Milton Ribeiro disparou acidentalmente uma arma de fogo dentro de Aeroporto em BSB. Estilhaços de munição atingiram uma pessoa. Quando se troca livros por armas a tragédia é iminente.
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@LenioStreck
Acréscimo: fosse um pé-de-chinelo portando arma e DISPARANDO, seria preso, algemado e outras quejandices. Simples assim!!!!!
16
Abr22

O viagra do general, o pênis inflável do capitão e a impotência de um povo socialmente sodomizado pelo militarismo bolsonarista

Talis Andrade

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por Ricardo Nêggo Tom

- - -

Alguns produtos na lista de compras feitas pelos militares e que vieram ao conhecimento público deixam em dúvida se a dispensa a ser abastecida era a de quartéis ou de prostíbulos. Leite condensado, whisky, picanha, viagra e até próteses penianas, figuram entre as aquisições feitas por nossos milicos guardiões da pátria, ou seria das putas, com todo respeito que as profissionais do sexo merecem. Ora, mas qual é o problema de os militares tomarem um “royal salute” para aquecer as turbinas ou incrementar a brincadeira mais antiga do universo com leite moça? Nenhum. Desde que a orgia verde-oliva não esteja sendo bancada com o dinheiro público. Porque aí é crime. E militares não cometem crimes, pressupõe-se.

Quando vimos ser noticiado que foram gastos R$ 3,5 milhões em recursos públicos para a compra de pênis infláveis, temos a nítida sensação de que alguma coisa está sendo introduzida nos nossos monossílabos sem acento. Foram 60 próteses penianas, que variam entre 10 e 25 centímetros, e custam entre 50 e 60 mil reais cada unidade. Além disso, também foi apurada a compra de 35 mil comprimidos de viagra, o famoso “azulzinho”, para ajudar os militares cuja bandeira se mantêm a meio mastro. Houve também um desvio de verbas públicas destinadas ao combate à pandemia, que foram utilizadas na compra de picanha e filé mignon, um escárnio retumbante diante de uma grande parcela da população que passou à condição de mísera bilidade, consumindo ossos para sobreviver. Parece que a mamata não acabou. Pelo menos, para os defensores da honra e da soberania nacional.

Ao se queixar do “exagero” em torno dos protestos feitos contra essa farra sexual bélica, o vice-presidente da república, General Hamilton Mourão, disparou: “Eu não posso usar o meu viagra, pô? O que são 35 mil comprimidos de viagra para 110 mil velhinhos que tem? Não é nada.” E ele também deve pensar o que são 19 milhões de pessoas passando fome, graças à gestão do governo que ele faz parte, para 212 milhões de brasileiros existentes. Não é nada, não é General? O relativismo no julgamento e a seletividade da comoção, são características inatas aos juízes dos tribunais de exceção. A cara nem arde, tamanha a certeza de que a autoridade que a farda lhe confere é capaz de silenciar manifestações mais incisivas, como deveriam haver, contra essa sacanagem militarizada.

Também veio à tona que as forças armadas reservaram R$ 546 mil para a compra de botox, alegando que era para fins medicinais e não estéticos. Assim como Mourão, Bolsonaro também entende que tudo isso “não é nada”. E não é mesmo! Principalmente, para um governo autocrata, cujo conceito de ética, moral e honestidade se baseia apenas em suas próprias convicções. Até porque, não pode mesmo existir corrupção onde o poder está personalizado na figura de um presidente cuja política se confunde com suas ações pessoais. “Comer gente” com o dinheiro do auxílio moradia, fazer rachadinhas, usar assessores como laranjas e condecorar milicianos como heróis são alguns exemplos do caráter distópico inato ao bolsonarismo.

Enquanto os Generais militares bolsonaristas estão de pau novo, o povo vai ficando cada vez mais brocha e impotente diante da sodomização social a qual é submetido sob a gestão do Capitão Messias. Os militares que compõem o atual governo não são dignos da confiança do povo brasileiro. Muito pelo contrário, demonstram total desrespeito e desprezo por aqueles pelos quais deveriam zelar pela segurança e bem-estar. Aqueles que pagam os seus salários, suas aposentadorias integrais, o seu filé mignon, o seu bom whisky e o seu viagra. O militarismo bolsonarista é inimigo da nação e não se deve prestar continência para General de dez estrelas que fica atrás da mesa com a prótese peniana na mão.

Que pais é esse?

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A prótese peniana dos militares

 

05
Fev22

“Não me matem”

Talis Andrade

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O grito de um jovem congolês linchado na praia do Rio de Janeiro pode ajudar os brasileiros a decidirem devolver a felicidade ao país

 

por Juan Arias /El País

Seu nome era Moise Mugenyi Kabagambe, o congolês de 24 anos que foi linchado na praia da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, em frente ao quiosque Tropicália em 24 de janeiro. Apesar de os brasileiros estarem tristemente acostumados a conviver com uma das maiores taxas de homicídios do mundo, desta vez, a severidade do crime comoveu o país inteiro. O grito do jovem antes de morrer, “Não me mate!”, continua a ressoar nas redes sociais e na consciência de quem, apesar de tudo, aposta e trabalha todos os dias a favor da paz e da harmonia.

De acordo com o promotor que analisa o caso, que foi gravado pelas câmeras de segurança do quiosque, “constata-se uma ação do mais alto grau de crueldade, perversidade, desprezo pela vida”. O jovem que trabalhava como garçom no quiosque é descrito pelos clientes como “alegre e educado”. Ele perdeu a vida apenas por ter pedido ao dono do bar da praia que lhe pagasse 200 reais (33 euros ou pouco menos de 38 dólares) que lhe devia.

O jovem que gritava para não ser morto foi linchado por cinco homens com chutes, socos e golpes de madeira. De acordo com exames médicos, Moise entrou em agonia 10 minutos antes de morrer e foi encontrado com as mãos e os pés amarrados, com os olhos ainda abertos.

Talvez a execução brutal realizada na areia da bela praia do Rio, a inveja do mundo, esteja causando dupla indignação na sociedade e tenha explodido nas redes sociais porque o país vive politicamente em um clima onde o governo do fascista Jair Bolsonaro tem como lema que o “melhor bandido é o bandido morto”. Se for executado, melhor ainda.

O presidente é defensor da tortura e da pena de morte. Sua política, seus gostos, seus esportes estão todos relacionados às armas, cujo mercado facilitou porque seu sonho é que todo o país esteja armado. Seu gesto favorito é simular com as mãos o ato de disparar um revólver. Durante a campanha eleitoral, uma cena em que o candidato a presidente do país pega uma menina de cinco anos nos braços e a ensina a imitar, rindo alegremente, o ato de disparar uma arma com a mão inocente, foi ultrajante.

Toda essa paixão pelas armas do chefe de Estado vem criando um clima no país em que a violência e as execuções sumárias se tornaram normal. Eu diria desportivo, se o adjetivo não me machucasse na boca.

Alguns teorizam que o Brasil sempre foi um país violento. É apenas parcialmente verdade. É que hoje essa violência é institucional, alimentada pelos instintos de morte de um presidente que zomba, por exemplo, daqueles que se protegem da pandemia, considerando-os “covardes”.

Estou neste país há 20 anos e sou testemunha de que a violência de hoje mudou de cara porque é alimentada por quem está no poder com o desprezo pela vida e a exaltação da ditadura militar. Hoje, talvez como reação a esse clima de morte que se instalou, cresce um movimento de solidariedade sem precedentes em todo o país, com o aumento de moradores de rua que vivem e morrem na rua.

Talvez o excesso de falta de humanidade do presidente esteja despertando na sociedade um movimento de defesa da vida, de acolher os deixados à própria sorte pela grave crise econômica. Aquele Brasil que reage à violência com sentimentos de compaixão e ajuda os que ficaram para trás na vida lembra-me a cena que presenciei quando cheguei aqui. Foi na praia de Copacabana, no Rio, quando uma idosa caiu inconsciente. Em poucos segundos, uma dezena de pessoas se reuniu com seus celulares na mão chamando uma ambulância. No Consulado me disseram então que os espanhóis que vieram para o Brasil queriam ficar. Eles comentaram que aqui “as pessoas são gentis, alegres e solidárias”.

Hoje, essa alegria e esse espírito acolhedor se perdem em meio à fumaça dos sentimentos de hostilidade, desconfiança e violência instigados por quem está no poder. Como disse o ex-presidente Lula da Silva, que aparece nas pesquisas como o candidato mais forte para derrotar Bolsonaro, “o Brasil precisa recuperar a alegria perdida”.

O grito do jovem trabalhador congolês de “Não me mate!” que continua ressoando na areia branca das praias do Rio onde foi executado vilmente e morreu de olhos abertos, talvez sirva, um triste paradoxo, para que quando chegar a hora de ir às urnas, os brasileiros decidam desta vez devolver ao país a felicidade perdida depois de ter se libertado do pesadelo do que já é considerado o pior e mais violento dos governos democráticos deste país.

 

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