O inquérito contra o jornalista Breno Altman, aberto pela Polícia Federal (PF), acusando-o de antissemitismo por suas críticas ao regime sionista e ao genocídio do povo palestino, é um assédio contra o jornalista, segundo a Associação Brasileira de Imprensa (ABI).
“Para a ABI essa investigação soa como evidente assédio a um jornalista crítico. Uma tentativa de calá-lo com ameaça de um processo criminal, o que é inconcebível no estado democrático de direito, que todos nós jornalistas sempre nos empenhamos em defender, notadamente nos últimos anos”, escreveu a instituição, em nota.
“Confundir as posições antissionistas de Altman – cidadão judeu – com crime de antissemitismo é fazer o jogo dos que defendem o genocídio que o governo de Israel comete na Palestina, ao provocar milhares de assassinatos, inclusive de inocentes crianças”, continuou.
A ABI pediu o arquivamento do inquérito ao Ministério Público Federal e à Justiça Federal.
Leia a nota na íntegra:
INQUÉRITO CONTRA BRENO ALTMAN É INTIMIDAÇÃO!
Pelas informações veiculadas na manhã deste sábado no site Brasil 247, o inquérito é resultado de reclamação descabida da Confederação Israelita do Brasil, que de forma enviesada e conveniente rotula as críticas de Altman ao sionismo como antissemitismo.
A ABI lembra que a Constituição de 1988 garante a todo e qualquer cidadão a liberdade de expressão. Da mesma forma, respaldado nesse princípio constitucional, o Supremo Tribunal Federal tem garantido por inúmeras decisões a liberdade de imprensa, assegurando a todos os jornalistas o direito à crítica.
Confundir as posições antissionistas de Altman – cidadão judeu – com crime de antissemitismo é fazer o jogo dos que defendem o genocídio que o governo de Israel comete na Palestina, ao provocar milhares de assassinatos, inclusive de inocentes crianças.
Para a ABI essa investigação soa como evidente assédio a um jornalista crítico. Uma tentativa de calá-lo com ameaça de um processo criminal, o que é inconcebível no estado democrático de direito, que todos nós jornalistas sempre nos empenhamos em defender, notadamente nos últimos anos.
Nesse sentido, entende que o próprio MPF ou a Justiça Federal, respeitando o estado democrático de direito e a Constituição Cidadã, devem providenciar o trancamento desse inquérito.
Certos de que a democracia que saiu vitoriosa no 8 de janeiro de 2023 prevalecerá e será respeitada, a ABI aguarda providências dos responsáveis por tal situação para dar um fim à campanha intimidatória que Altman vem sofrendo.
Aproveitamos o ensejo para desejar a todos um próspero 2024, no qual a democracia, a liberdade de expressão e de imprensa prevaleçam.
O deputado Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara Federal, não se conforma com a perda do seu poder. No governo passado, ele virou quase um primeiro-ministro, enquanto Jair Bolsonaro passeava de jet-ski e de moto e antecipava criminosamente sua campanha pela reeleição. Através do orçamento secreto, o líder do Centrão conseguiu eleger inúmeros dos seus comparsas, garantindo uma maioria conservadora no Congresso Nacional.
Com a derrota do fascista, ele também perdeu força e algumas regalias e passou a ser alvo de várias denúncias, como a do desvio de verbas do “kit robótica” e do emprego de parentes em estatais. Incomodado e temendo perder ainda mais poder, o coronelzão parte agora para a retaliação. Na semana passada, Arthur Lira moveu uma ação de censura na 24ª Vara Cível de Brasília para tirar do YouTube vídeos do programa ICL Notícias.
Conforme denúncia de Chico Alves no site UOL, “o processo se refere principalmente ao conteúdo veiculado no dia 6 de junho, com comentários sobre acusação de suposto recebimento de R$ 106.000,00 em propina por meio de um assessor, denúncias de envolvimento de um auxiliar na aquisição superfaturada de kits robótica para escolas de Alagoas e uma entrevista com sua ex-mulher, Jullyene Lira, que o acusa de vários crimes”.
"Trata-se de covarde e vergonhosa censura"
Além da retirada do ar de 42 vídeos do ICL Notícias, o presidente da Câmara Federal pede indenização de R$ 300 mil por dano moral. “O juiz negou pedido de Arthur Lira para que a ação corresse em sigilo e também que a retirada dos vídeos do YouTube fosse imediata, já que a decisão sumária poderia consistir, segundo o magistrado, ‘censura à liberdade de imprensa’. O mérito do processo ainda não foi julgado”, relata Chico Alves.
“Não há dúvidas, trata-se de covarde e vergonhosa censura. É inaceitável o chefe de um dos três poderes de uma República dita democrática tentar calar um canal de informações via pressão política e jurídica”, contesta Eduardo Moreira, responsável pela Editora Conhecimento Liberta, empresa que produz o ICL. Ele lembra ainda que as informações divulgadas no site são públicas: “Tudo o que foi veiculado sobre Lira trazia como fonte os principais veículos de imprensa do país e as declarações de sua ex-esposa por mais de dez anos”.
A ação autoritária do coronel do Centrão mereceu imediata repulsa. Um abaixo-assinado contra a censura ao ICL Notícias colheu mais de 100 mil adesões em menos de 12 horas. Entidades da sociedade civil também divulgaram notas de repúdio, entre elas a Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Vale conferir a nota:
ABI repudia processo de Arthur Lira contra ICL Notícias
A Associação Brasileira de Imprensa repudia com veemência a atitude do presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arthur Lira, que deveria ser o primeiro a dar o exemplo de zelar pelo respeito à Constituição brasileira, de entrar com uma ação na 24ª Vara Cível de Brasília para remover do YouTube os vídeos do programa ICL Notícias, que contêm reportagens, entrevistas e comentários críticos contra ele.
Com isso, ele tenta calar a imprensa, na defesa de seus interesses pessoais e privados.
Como político experiente, Lira sabe que a Liberdade de Imprensa é pedra fundamental do Estado Democrático de Direito.
Não será calando jornalistas e órgãos de imprensa que ele conseguirá melhorar a sua imagem pública.
Mais escandaloso ainda é saber que ao deputado foi aberto espaço para exercer a sua defesa, atitude que ele acabou desprezando.
Ao propor uma ação de indenização no valor de R$ 300 mil contra o ICL Notícias, Lira tenta inviabilizar economicamente um órgão de comunicação, caracterizando uma verdadeira intimidação não apenas ao seu alvo direto, mas a todos os demais meios de comunicação.
Da mesma forma que condena a iniciativa do presidente de uma das casas legislativas da nossa República, a ABI congratula-se com o Judiciário por ter rejeitado a censura pedida pelo parlamentar, fazendo valer o direito constitucional do povo brasileiro de ter acesso a todas as informações necessárias para que cada eleitor possa depois fazer seu juízo de valores.
Liberdade de informação sempre! Censura nunca mais.
Ele foi processado por mais de cem pastores porque disse "o brasileiro só será livre quando o último Bolsonaro for enforcado nas tripas do último pastor da Igreja Universal"
O Ministério Público Federal convocou, para o dia 13/12, uma audiência pública sobre "Liberdade de imprensa e assédio judicial contra jornalistas". O evento acontecerá a partir das 10h no auditório da Procuradoria da República no Rio de Janeiro.
A audiência contará com a presença de autoridades públicas, entidades particulares, movimentos sociais e demais cidadãos. O objetivo é contribuir para a elaboração de diagnósticos e aprofundar as discussões em andamento sobre o tema. O debate do assunto com organizações da sociedade civil e especialistas é uma demanda da Associação Brasileira de Imprensa (ABI).
O evento faz parte de um inquérito civil, em curso na Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, que busca apurar suposto assédio judicial promovido por meio do uso inadequado do acesso ao Judiciário para constrangimento individual.
No inquérito em questão, a ABI relatou um caso de possível assédio judicial contra o escritor e jornalista João Paulo Cuenca. Ele foi processado por diversos pastores da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd) devido a uma publicação no Twitter. Até julho do último ano, já existiam mais de cem processos, vindos de diversas partes do país.
Cuenca disse, no tweet: "O brasileiro só será livre quando o último Bolsonaro for enforcado nas tripas do último pastor da Igreja Universal". A frase faz referência a uma citação famosa de Jean Meslier, sacerdote francês do século XVII: "O homem só será livre quando o último rei for enforcado nas tripas do último padre".
Também será discutida, na audiência, a Recomendação 127/2022 do Conselho Nacional de Justiça, que recomenda aos tribunais a adoção de cuidados para coibir a judicialização predatória que possa cercear o direito de defesa e limitar a liberdade de expressão. Com informações da assessoria de imprensa do MPF.
Clique aqui para ler a representação da ABI Inquérito 1.30.001.004961/2020-41
Coerente com sua longa história de lutas em defesa da liberdade de imprensa, da liberdade de expressão, dos direitos humanos, da soberania nacional, da justiça social e do Estado Democrático de Direito, a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) reafirma seu apoio à eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Sob um forte clima de apreensão, inclusive internacional, forças policiais foram a campo no terceiro dia de buscas pelo indigenista Bruno Pereira e pelo jornalista inglês Dom Phillips, agora com ajuda de mergulhadores e especialistas em resgate na selva, e com atuação da Marinha. Comunidades indígenas e entidades da imprensa cobram esclarecimentos e criticam a ausência do poder público na região.
A cada hora que passa, a esperança de localizar Pereira e Phillips diminui para ativistas que conhecem os problemas da região. "Eu, pessoalmente, considero mínimas as chances de serem encontrados com vida, uma vez que Bruno sempre foi muito diligente, sempre trocava muito ideia conosco", afirmou àRFIo indígena e advogado Eliesio Marubo, secretário jurídico da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Unijava).
Marubo argumenta que se o indigenista e o jornalista colaborador do jornalThe Guardiantivessem condição de se manifestar, "já teriam avisado a todos nós". "As chances, se é que existem, é que eles estejam feridos em algum lugar, e a gente espera que isso possa estar acontecendo”, disse o advogado.
Para Marubo, “esse desaparecimento representa a omissão do Estado brasileiro". Ele ressalta que o servidor licenciado da Funai já vinha sendo ameaçado há algum tempo. "Isso é de conhecimento das autoridades, foi repassado às autoridades, e infelizmente o crime está compensando para essas pessoas", lamenta o representante da Unijava.
O advogado lembra que se trata de uma área com histórico de violência contra quem ergue a voz pela causa indígena. “Já temos um histórico na região. Nós tivemos um servidor da Funai que foi morto a tiros em Tabatinga, em 2019, e até hoje nada sobre isso foi elucidado", afirma Marubo. "As informações estão com a Polícia Federal desde então, mas sem qualquer resposta até aqui”, critica o defensor da Unijava.
“O que nós sabemos até o momento? Que no meio do caminho teriam se encontrado com duas pessoas, que já estão detidas pela Polícia Federal, estão sendo investigadas", declarou Bolsonaro. "Realmente, duas pessoas apenas num barco, numa região daquela, completamente selvagem, é uma aventura que não é recomendável que se faça, tudo pode acontecer", disse o presidente.
"Pode ser um acidente, pode ser que eles tenham sido executados, tudo pode acontecer", acrescentou, antes de dizer que espera que os dois homens sejam encontrados brevemente. "As Forças Armadas estão trabalhando com muito afinco na região”, completou.
A União do Povos Indígenas do Vale do Javari, no entanto, diz que é preciso maior empenho."O governo não tem realizado nenhum tipo de investigação para identificar os suspeitose elucidar essa possibilidade de crime, de forma nenhuma", frisou Marubo. "Não há qualquer tipo de ação investigativa", insistiu. "Eu, que fui advogado criminalista por muito tempo, posso afirmar com toda precisão que não há, até o dia de hoje, qualquer investigação nesse sentido", alertou.
Situação "inadmissível" para ABI
O presidente da Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Octávio Floro Barata Costa, mostrou-se indignado com a situação de violência na região.
"Infelizmente esse dia de hoje está sendo quase que dramático para nós jornalistas. Nós temos um jornalista britânico, Dom Phillips, desaparecido na Amazônia, jornalista doThe Guardian, junto com o indigenista Bruno Pereira, no Vale do Javari. Até agora não foram encontrados, e há realmente um temor, não só no Brasil, mas no mundo todo, de que o jornalista Dom Phillips tenha levado o mesmo destino da missionária Dorothy Stang”, disse Costa, referindo-se à missionária americana assassinada em 2005 no Pará.
Pereira e Phillips faziam uma viagem por essa região do Amazonas e o último registro dos dois foi no domingo, na comunidade de São Rafael. O indigenista, especialista na causa indígena e servidor licenciado da Funai,vinha sofrendo ameaças de grupos de garimpeiros, madeireiros e pescadores.
"O Brasil só tem confirmado nos últimos anos a inoperância com a proteção ambiental, com a proteção dos povos indígenas, e também com a proteção daquelas pessoas que se colocam contra o sistema que de alguma maneira tem facilitado que esses grupos criminosos atuem contra as comunidades indígenas", afirmou o advogado da Unijava.
“Terrível. Para a imagem do Brasil é óbvio, mas para todos nós homens e mulheres de imprensa. É inadmissível, inadmissível que isso se repita no Brasil. Inadmissível que a Amazônia ainda conviva com esse tipo de episódio, com pessoas desaparecidas em terras indígenas por ação de grileiros, alvo de grileiros. É inadmissível, inadmissível. É lamentável que este episódio esteja ocorrendo exatamente no dia dedicado à liberdade de imprensa”, condenou o presidente da ABI.
Eliane Brum
@brumelianebrum
O que vocês entendem desta declaração oficial do Comando Militar da Amazônia? "...o Comando Militar da Amazônia (CMA) está em condições de cumprir missão humanitária de busca e salvamento, contudo as ações serão iniciadas mediante acionamento por parte do Escalão Superior."
Carlos Alberto Jr.
@cajr1569
O general Villas Bôas conta em seu livro que uma vez, quando comandava na Amazônia, o coronel Pavanelo mobilizou um helicóptero Pantera do Exército para enviar-lhe uma revista Playboy. Mas para achar o
Nas entrevistas que dei depois de assumir a presidência da Associação Brasileira de Imprensa, uma pergunta de meus colegas tornou-se inevitável. A que motivos atribuo a queda do Brasil para o 110º lugar no ranking de liberdade de imprensa e o aumento de casos de violência contra jornalistas? A resposta é imediata. Num país em que o mais alto mandatário incita o ódio contra a imprensa desde os primeiros minutos de seu governo, não se pode esperar outra consequência. Com suas agressões, Jair Bolsonaro alimenta o ódio de seus seguidores. E não é nenhum exagero afirmar que ele é a voz de comando dos ataques a jornalistas.
Foi exatamente esse o entendimento da juíza Tamara Hochgreb Matos, da 4ª Vara Cível de São Paulo, ao condenar o Capitão Corona a pagar uma indenização de R$ 100 mil por dano moral coletivo à categoria dos jornalistas. Ao dar ganho de causa ao Sindicato de SP, a juíza afirma que Bolsonaro busca “desmoralizar os jornalistas com termos ofensivos, vulgares e até mesmo ilícitos, incompatíveis com a urbanidade e maturidade esperada de um presidente da República”. Na decisão, ela lista vários episódios e os classifica como “grave assédio moral contra profissionais de imprensa e manifestações homofóbicas”.
No triste Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, marcado pelo desaparecimento do jornalista Dom Phillips e do sertanista Bruno Pereira, a sentença da doutora Tamara trouxe um pouco de conforto a todos nós, jornalistas. Mas, ao contrário da nobre juíza, nós não esperamos nada do ensandecido Bolsonaro. Muito menos urbanidade. Todos sabemos que o ex-capitão não está à altura do cargo que ocupa. Por sinal, nesta terça-feira o execrado presidente voltou a atacar os meios de comunicação. Ao criticar o STF por punir bolsonaristas que divulgam fake news nas redes sociais, vociferou: “Se for para punir com fake news a derrubada de páginas, fechem a imprensa brasileira que é uma fábrica de fake news. Em especial, Globo e a Folha”. Ou seja, “fechem a imprensa” no dia dedicado à liberdade de imprensa.
Desesperado com as pesquisas que apontam a vitória do ex-presidente Lula no primeiro turno das eleições de outubro, Bolsonaro certamente vai baixar ainda mais o nível de suas agressões. Se é que isso é possível. Ontem, ao falar do desaparecimento de Phillips e Bruno, ele disse que os dois se envolveram numa “aventura que não é recomendável que se faça”. É mesmo um insensato. Basta ver a lista de suas frases selecionadas pelo colunista Bernardo Mello Franco, do jornalO Globo. Eis o bestialógico de Bolsonaro contra a imprensa:
“Esse jornalismo que vocês fazem é um jornalismo podre”
“Cala a boca! Não te perguntei nada!”
“Vocês atrapalham o Brasil com esse tipo de notícia”
“Minha vontade é encher tua boca de porrada”
“Você tem uma cara de homossexual terrível”
“Jornal patife e mentiroso!”
“Vocês são uns canalhas!”
“Vá para a p… que pariu!”
Como nos ensinou Shakespeare em sua peçaMacbeth, não há longa noite que não encontre o dia. Vamos nos livrar do inominável nas urnas.
Aperseguição a jornalistas por meio de processos judiciais vai além das ações impetradas pelos próprios magistrados e sempre ameaçou a liberdade de imprensa. Nos últimos anos, porém, essa prática aumentou tanto que ganhou até um nome: assédio judicial. Isso acontece quando são orquestradas várias ações contra um mesmo veículo ou jornalista, por várias pessoas ou entidades diferentes, e quando uma mesma pessoa processa um jornalista várias vezes, explica a advogada Tais Gasparian, que há mais de 10 anos defende vítimas de processos como esses.
Um exemplo é um caso ocorrido no Paraná em 2016, em quedezenas de juízes e promotoresdo Ministério Público se incomodaram com uma reportagem sobre seus supersalários, publicada na Gazeta do Povo. De forma simultânea, os juízes e promotores citados no texto moveram mais de 40 processos contra todos os profissionais que assinaram a matéria, incluindo os repórteres e um analista de sistemas.
As ações foram movidas em várias cidades, obrigando os profissionais a viajarem o estado inteiro para audiências. Somados, os pedidos de indenização ultrapassaram a quantia de R$ 1 milhão. O caso foi tão absurdo que o Supremo Tribunal Federalsuspendeutodas as ações. A corte agora decide se elas devem ser julgadas pelo Judiciário local ou pelo próprio STF. Valores de indenização muito altos, reforça Gasparian, cumprem a função de intimidar e prejudicar financeiramente o jornalista.
Segundo umlevantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, com dados até 2021, jornalistas e veículos de comunicação foram alvo de mais de 4 mil processos por calúnia, injúria e difamação desde 2002 – 97% das ações, contudo, foram movidas nos últimos 10 anos. A maioria delas são de políticos, mas há também os casos que envolvem magistrados, como revela o mapeamento que fiz para esta reportagem. Mesmo quando não é praticado pelo Judiciário, o assédio judicial conta com o apoio de juízes e desembargadores, pois são eles quem condenam os jornalistas ou os veículos a pagarem altas indenizações ou a retirarem conteúdo do ar. Em outras palavras, são os magistrados que ajudam a censura a se concretizar.
Se você fizer uma busca na internet pelo blog paraense Rondon Sem Censura, por exemplo, não vai encontrá-lo. Ele foi censurado. Em 2012, o juiz Gabriel Costa Ribeiro alegou que sua honra estava sendo atacada pelas publicações e conseguiu uma liminar que obrigava o Google a retirar“do mundo virtual”não apenas os textos que o citavam, mas todo o blog. Caso o Google não cumprisse a determinação, a multa diária seria de R$ 100 mil. Como o site ficou no arpor mais de um mês, a justiça do Pará ainda mandou bloquearR$ 3 milhões nas contas da multinacional.
97% dos processos por crimes contra a honra que miraram jornalistas desde 2002 foram movidos nos últimos 10 anos.
A liminar requerida pelo juiz Ribeiro foi julgada em apenas dois dias na comarca de Rondon do Pará, cujo único magistrado, na época, era ele mesmo. A decisão foi tomada por um colega, o juiz substituto Jonas da Conceição, que estava temporariamente responsável pelos processos na cidade durante os dois dias que Ribeiro se ausentou por uma licença-médica.
Por considerar que a decisão feria “os princípios constitucionais da livre manifestação de pensamento e liberdade de expressão”,o Google recorreu. A empresa alegou que a maior parte das publicações do blog sequer citavam o juiz Ribeiro e, por isso, excluí-lo por completo causaria “uma gritante desproporção na aplicação da razoabilidade”.
Para Gasparian, obrigar a retirada de uma reportagem do ar é uma ordem extrema que afeta gravemente não apenas a liberdade de expressão, mas a liberdade de informação. “Os sistemas de publicação dos sites de notícias permitem que um texto seja corrigido, se for o caso. Mas excluir um conteúdo e banir informação do conhecimento público é censura”, diz a advogada.
Argumentos como esses não convenceram a desembargadora do Tribunal de Justiça do Pará, Gleide Pereira de Moura, que analisou o recurso do Google. Ela manteve a decisão de retirar o blog do ar e apenas reduziu a multa diária para R$ 2 mil.“Nada há de pedagógico ou informativo no blog referido, mas sim comentários pueris e injuriosos”, escreveu a magistrada. Como queria o juiz Ribeiro, o Rondon Sem Censura desapareceu da internet.
Todos os magistrados foram procurados por meio da assessoria do Tribunal de Justiça do Pará, que não respondeu aos questionamentos feitos.
Em 2014, foi a vez da justiça do Rio Grande do Sul, que censurou uma matéria do repórter Rogério Barbosa, publicada no Conjur, site especializado em assuntos jurídicos. Ele escreveu que a juíza Fabiana dos Santos Kaspary usava o espaço das notas de expediente, publicadas no site do tribunal estadual, para dar conselhos amorosos como esse: “Não precisa agir como um ogro.O amor acabou, mas vocês já se divertiram um bocado juntos”.
Essa e outras dicas para o fim de um relacionamento realmente estavam lá, mas a juíza alegou que foi um “erro cartorário” e que o jornalista se aproveitou disso para ridicularizá-la com “matéria de cunho vexatório”. Ele e o site foram condenados a pagar, juntos, R$ 12 mil. O texto foi excluído do Conjur, maso encontreireproduzido em outra página.
Por meio da assessoria do tribunal, a juíza Kaspary respondeu que “o processo em questão não tem relação com liberdade de imprensa e nem com assédio judicial”, portanto, o caso “não se enquadraria no tema abordado” pela reportagem.
Em Pernambuco, a juíza Blanche Maymone Pontes Matos ganhou, após acordo, R$ 10 mil e um direito de resposta no UOL. Ela moveu dois processos contra o veículo e a jornalista Fabiana Moraes, então colunista do site e atualmente colunista do Intercept. A magistrada se incomodou com o texto“Ministra Rosa, juíza Blanche e preso preto: tudo é cor no Brasil de Kafka”, no qual a jornalista recorreu a um jogo de palavras e cores para tratar do racismo estrutural no Judiciário. A juíza foi citada porque, entre outras decisões questionáveis mencionadas no texto, ela considerou legal a prisão em flagrante de um homem negro, acusado de furtar uma bicicleta de aluguel – mas o objeto sequer tinha sido encontrado com ele. Em sua defesa, a juíza Blanche alegou que não é racista, pois é até “casada com um negro”.
Os argumentos dela convenceram o juiz Sérgio Paulo Ribeiro da Silva, da comarca de Recife, que concedeu o direito de resposta à colega de toga. Embora tenha reconhecido que é “inegável e nefasta a existência de racismo estrutural” – exatamente o ponto principal do texto da jornalista –, o magistrado se recusa a admitir que as decisões judiciais tenham alguma coisa a ver com isso, pois acredita que não “sejam eivadas de discriminação racial, a ponto de serem elas as responsáveis pelo perfil dos detentos do país”. Umrelatório do Conselho Nacional de Justiçade 2020, contudo, aponta que combater o racismo no Judiciário é urgente.
Os dois magistrados foram procurados por meio da assessoria do Tribunal de Justiça de Pernambuco, que não respondeu aos questionamentos e me orientou a enviá-los para a associação de magistrados do estado. A assessoria da entidade, porém, disse que “não responde por processos movidos individualmente por magistrados e magistradas” e que não tem autorização para passar seus contatos de telefone.
Mais recentemente, em fevereiro deste ano, o jornalista Rubens Valente foi obrigado a pagar cerca de R$ 310 mil por danos morais ao ministro Gilmar Mendes pela publicação do livro “Operação Banqueiro”. A sentença, reformada pelo STJ e confirmada pelo STF, mesmo tribunal do qual Mendes faz parte, ainda impôs ao jornalista que inclua, em uma futura edição do livro, a sentença e a transcrição da petição do ministro, que tem cerca de 200 páginas.
De acordo com um levantamento da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji, noticiado pela Agência Pública, a jurisprudência criada pelo STF para condenar o jornalista Valente foi usada em quatro processos no STJ e em outros 10 julgamentos nos tribunais estaduais de primeira e segunda instâncias até dezembro de 2021. Os mesmos argumentos serviram como parâmetro também para o cálculo de reparação por danos morais, com valores semelhantes aos milhares cobrados de Valente.
Em abril de 2021, a Abraji lançou o Programa de Proteção Legal para Jornalistas, para dar apoio jurídico a profissionais de imprensa. A iniciativa, diz otexto de apresentaçãodo projeto, é uma “resposta ao crescimento das ameaças à liberdade de imprensa e do assédio judicial”.
Outra iniciativa para coibir a perseguição à imprensa vem da Associação Brasileira de Imprensa, a ABI, queentrou com duas ações, atualmente em andamento no STF. Uma delas cobra que “apenas a divulgação dolosa ou gravemente negligente de notícia falsa possa legitimar condenações”. A outra pede que os ministros assegurem aos jornalistas “o direito de não responder a ações penais por calúnia ou por difamação pelo simples fato de exercerem com destemor seus ofícios”.
Atualização: 10 de maio, 19h18 No dia seguinte à publicação deste texto, a Associação dos Magistrados Piauienses enviou uma nota afirmando que “o desembargador Erivan Lopes é um cidadão e, como tal, tem direitos” e agiu conforme a lei permite para “defender sua imagem e honra que, no seu entender, estavam sendo atacadas criminosamente pelo jornalista” Arimatéia Azevedo. A Amapi continua, dizendo que a reportagem “omite sabidamente” que Azevedo já havia sido preso em 2005 e tece “considerações tendenciosas”, por, no passado, “a autora da matéria” ter trabalhado no “mesmo grupo de comunicação” que ele. Esclarecemos que o processo a que se refere a nota não tinha relação com o tema desta reportagem, por não haver indício de que o caso configure assédio judicial. Reforçamos ainda que toda a investigação está ancorada em fatos, além de apresentar diversas outras histórias para além da de Azevedo, não havendo qualquer motivação escusa para a publicização do que vem ocorrendo com este e outros profissionais da imprensa.
[Nota deste correspondente: Em mais de 70 anos de jornalismo, escrevendo texto, editando jornais, criei dezenas de termos. Assédio Judicial, inclusive]
O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), também chamado de Dudu Bananinha, é realmente muito escroto. Pelo Twitter, ele voltou a ironizar a bárbara tortura sofrida por Míriam Leitão, da Rede Globo, durante a ditadura militar. Ele postou: “Ainda com pena da [emoji de cobra]”. O fascistoide conta com o cretinismo parlamentar para manter a sua imunidade!
Quando tinha apenas 19 anos e estava grávida, a hoje conhecida jornalista foi presa e torturada por carrascos da ditadura dos generais (1964-1985). Em uma sessão de tortura, ela foi deixada nua em uma sala escura com uma cobra. O tuíte do filhote 03 do presidente gerou manifestações de repúdio até dos que discordam da colunista global.
Lula presta solidariedade à jornalista global
O ex-presidente Lula, que sempre sofreu críticas ácidas da jornalista e da Rede Globo, foi um dos primeiros a repudiar o fascista. “Minha solidariedade à jornalista Míriam Leitão, vítima de ataques daqueles que defendem o indefensável: as torturas e os assassinatos praticados pela ditadura. Seres humanos não precisam concordar entre si, mas comemorar o sofrimento alheio é perder de vez a humanidade”, postou nas redes sociais.
A Federação Nacional dos Jornalistas divulgou nota em que lembra que “não foi a primeira vez que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, tratou a tortura como uma prática banal e defensável. Também não foi a primeira vez que a jornalista Míriam Leitão foi desrespeitada pela família Bolsonaro, em sua história de militante e presa política”.
O texto da Fenaj também enfatiza que “passa da hora de os demais poderes constituídos da República brasileira agirem para garantir o Estado de Direito, com a punição cabível para autoridades que insistem em agir fora dos preceitos legais e democráticos”. A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) também afirma que a “apologia à tortura é crime e quem a pratica deve se submeter aos rigores da legislação”.
Cadê o Conselho de Ética?
PSOL e PCdoB já protocolaram representações no Conselho de Ética da Câmara Federal em que pedem a cassação do mandato do parlamentar. Para a líder do PSOL, deputada Sâmia Bomfim, a postagem dele sobre a tortura é “desumana”. “Quando ele faz piada com essa situação, reafirma, mais uma vez, que é um criminoso inimigo da democracia”.
No mesmo rumo, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) afirma que é urgente punir Eduardo Bolsonaro “por respeito à democracia, à sociedade e às mulheres. A publicação dele é repugnante. Se isso não é quebra de decoro, o que será? A leniência da Câmara em outros tempos normalizou barbaridades como o elogio a tortura”.
O deputado Alexandre Molon (PSB-RJ) também reagiu indignado. “Que tipo de monstro é capaz de debochar da tortura de uma mulher grávida?”, perguntou pelo Twitter. Já o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) afirmou que o comentário é “nojento, covarde e asqueroso”. E a deputada Natália Bonavides (PT-RN) exigiu uma postura dura da Câmara Federal.
Às vésperas do 7 de setembro, um agrupamento de motociclistas tenta intimidar a ação da maior entidade sindical de trabalhadores do Estado de Mato Grosso do Sul
Na ditadura cívico-militar que se abateu sobre o Brasil durante os anos de 1964 a 1985, o político mineiro Pedro Aleixo cunhou a famosa frase que traz em si, até os dias de hoje, enorme sabedoria política: “o problema é o guarda da esquina”. A frase foi dita na reunião presidida pelo então Presidente General Costa e Silva quando da decisão, em dezembro de 1968, da adoção do Ato Institucional nº5 (AI 5), a mais cruel de todas as investidas da ditadura contra o povo brasileiro, quando se autorizaram perdas de mandatos parlamentares, intervenções em Estados e municípios e perseguição cruel a adversários políticos, com prisões arbitrárias e assassinatos clandestinos.
Após mais de 50 anos depois do fato transcrito acima, a incitação feita pelo atual Presidente Bolsonaro de que o próximo dia 07 de setembro no Brasil será um divisor de águas no país, fomentando atos de desrespeito às leis e ataques à adversários, nos remete, mais uma vez, àquela passado sombrio da ditadura de 1964. Ninguém se importa com as palavras toscas e agressivas de Bolsonaro, cada vez mais isolado, acuado e sem apoio do povo brasileiro. O problema, mais uma vez, como nos disse Aleixo em 1968, é o guarda da esquina.
O que se viu em Campo Grande/MS no último dia 30 de agosto foi exatamente a reverberação das palavras do presidente nas ações de populares. Em um momento de intenso incremento de armas circulando no meio da população, um grupo de motociclistas se aglomerou em frente à casa do presidente da maior entidade sindical de trabalhadores do Estado de Mato Grosso do Sul para, única e exclusivamente, intimidar a ação política da FETEMS (Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul). Seu presidente Jaime Teixeira já denunciou o caso para as autoridades locais, indicando as práticas fascistas da ação.
O que cabe agora fazer é reverberar esse caso para além das fronteiras do Estado, o levando para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal e da Ordem dos Advogados do Brasil, à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, do Ministério Público Federal e, quiçá, essa situação de intimidação às ações dos/as trabalhadores/as em educação do Estado deve também ser denunciada no âmbito da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA. Exigimos do Governador Reinaldo Azambuja e do Prefeito Marcos Trad a apuração rigorosa dos fatos ocorridos. Não esperemos que aconteça uma tragédia para que ações sejam tomadas.
Os/as educadores/as de todo o país estão atentos a esse caso, irão levá-lo e reverberá-lo em todos os espaços nacionais e internacionais a que temos acesso para que isso não se repita. Ações de intimidação são atitudes típicas de regimes autoritários, em especial quando feitas contra lideranças sociais e políticas.
Todo apoio ao Professor Jaime Teixeira e a FETEMS! Não nos intimidarão jamais!
Brasília, 02 de setembro de 2021 Direção Executiva da CNTE