Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

O CORRESPONDENTE

13
Mai23

Sobre o luto e a morte de David Miranda, Rita Lee e nós

Talis Andrade
 
 
 
Cria do Jacarezinho, David Miranda virou deputado federal como suplente de  Jean Wyllys e foi defensor da causa LGBTQIA+ | Rio de Janeiro | G1

Estar vivo significa continuar construindo sentido e a memória dos mortos faz parte disso

 

por Marcia Tiburi

- - -

Nessa semana, o Brasil perdeu duas pessoas públicas que deixam muita saudade. O deputado David Miranda morreu depois de meses na UTI lutando contra uma doença que durou meses. David completaria 38 anos no dia de seu funeral. A morte de uma pessoa tão jovem sempre comove e, mais ainda, a quem conheceu sua trajetória de vida. David era um sobrevivente, um menino que havia perdido a mãe e havia sido criado por uma vizinha. Tendo ele mesmo, junto com seu marido, adotado 3 meninos, David sabia da importância da solidariedade e da generosidade.  

 Uma pessoa que sobrevive à condenação por classe, raça e sexualidade e que, superando o contexto, passa a lutar pelos outros, merece todo o respeito e admiração. Considerando a miséria moral e política do congresso nacional, uma pessoa como David vai fazer muita falta na esfera publica, tanto quanto deverá fazer aos filhos que ele deixa.  

 
Rita Lee (1967) - Acervo - Estadão
 
 

Sofremos também com a morte de Rita Lee que deixa um vazio imenso na cultura popular brasileira. Um extenso legado musical no consola. Rita Lee nos deixou canções - e livros - que alegravam, mas também passavam mensagens de amor, coragem, liberdade e ousadia. A impressão que Rita passava era de que ela se divertia sendo ela mesma. Rita foi uma pop star que não precisava posar de pop star.

Renunciando a ser rainha na sociedade do espetáculo, ela era democrática demais para fazer cena na monarquia da fama, sendo livre por dentro e por fora, sem chatice ou simulação. Ela parecia intima de todos nós, admiradores e fãs, porque Rita era pura alegria e luz, abertura ao outro, amor para todo lado.  

 A ausência de uma pessoa gigante se transforma em memória. A cultura musical brasileira recebeu muito dessa artista generosa e a gratidão é o sentimento que surge no luto que sentimos por ela.

 Eu fiquei muito triste com a perda dessas pessoas. Pensando nesse sofrer que se sente pelas pessoas públicas, pensei no reconhecimento de sua importância na comunidade. A importância do reconhecimento é ainda maior numa época em que o ressentimento impede a gratidão. O contrário da gratidão é a inveja, mas o ressentimento que nos impede de amar, faz parte disso.  

 As famílias perdem seus entes queridos, o povo perde as pessoas que melhoravam a esfera pública de um país como o Brasil, cuja esfera pública anda tão empobrecida.  

 Certamente, quando a morte chega – a morte dos outros, pois só experimentamos a morte dos outros, a nossa, como dizia Epicuro, chega quando já não estamos - aprendemos também a saudade, aprendemos a falta que uma pessoa faz e o luto não é outra coisa do que esse trabalho de aprender a viver a perda.  

 Aprende-se também que é preciso meditar e refletir sobre sentido que a vida pode ter e que precisa continuar sendo produzido à cada dia, apesar de tantas vezes ela parecer sem sentido.  

 Estar vivo significa continuar construindo sentido e a memória dos mortos faz parte disso. A morte não deveria existir, nem o sofrimento e nem o luto, mas eles existem e, existindo, nos obrigam a pensar no que faz sentido e viver da melhor forma a partir disso, tanto a vida íntima quanto a vida comunitária, social e pública.

 E pensando nisso, vai a pergunta: o que legaremos aos outros quando chegar a nossa vez? Nessa pergunta reside a importância que damos à vida num mundo onde há gente tão negligente que pensa que não vai morrer e que viver é apenas uma questão de aproveitar cada segundo como se nenhum comprometimento com o existir fosse uma questão. Pois nos tornamos seres humanos, seres genéricos pertencentes a essa espécie, por que meditamos sobre a morte.  

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

Arquivo

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
Em destaque no SAPO Blogs
pub