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O CORRESPONDENTE

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O CORRESPONDENTE

03
Abr22

Se Noronha falasse

Talis Andrade

 

por Gustavo Krause

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Começaria pedindo humildemente ao distinto público “Paz e Respeito”. Não lhe faltariam razões. O nascimento do arquipélago de origem vulcânica no meio do mar é um ato de rebeldia geográfica que aflora frente ao gigantesco oceano. Inspira, como seus irmãos espalhados, mundo afora, sentimentos díspares: desafiam e encantam; enternecem e assustam; aconchegam e isolam. Todos têm atributos paradisíacos.

Quem sabe se o ficcionista Thomas Morus (1480-1535) não escreveu a Utopia (1516) a partir do sonho com uma comunidade insular. Morus propunha atualíssimas regras de preservação ecológica a começar pela limitação do número de habitantes; “viver de acordo com a natureza”; proibir que se “tragam coisas sujas para evitar a poluição e a doença; cuidar do “Rio Anidro” fonte escassa de água potável; enfim, acreditar que o engenho humano pode construir uma sociedade em que haja equilíbrio nas relações Homem/Natureza, indivíduo/coletividade, prosperidade geral/bem-estar social.

No mundo real é diferente. Por que não buscar a “utopia concreta”, vertida, simplesmente, no conceito de sustentabilidade?

Com mais ênfase, afirmaria Noronha: “este é o meu destino e vocação” (Americo Vespúcio já dissera “o paraíso é aqui”). “Desde que nasci, vivo sob o clima da instabilidade, da insegurança e das dúvidas: Loronha ou Noronha? Descoberta em 1501 ou 1503? Capitania Hereditária que não conheceu seu dono? Provei de tudo: abandono, invasão, presídio, Território Federal Militar na II Guerra Mundial, Território Federal e, por força do artigo 15 do Ato Das Disposições Constituições Transitórias, a reincorporação da área ao Estado de Pernambuco”.

A partir de então, um conjunto de normas alicerçam o esquema de proteção à Unidade de Conservação do Arquipélago: o Dec. 92.755/86 definiu uma Área de Proteção Ambiental; o Dec. 96.693/88 que criou o Parque Nacional Marinho; no âmbito estadual, decreto estadual 13.553/89 declarou o Arquipélago como Área de Proteção Ambiental.

Do ponto de vista formal, o valioso ecossistema de Noronha estava delineado, culminando com reconhecimento, em 2001, pela UNESCO como Patrimônio Natural da Humanidade. O grande desafio tem sido adotar no plano político-administrativo medidas que assegurem a preservação ecológica e a atração do ecoturismo, uma das grandes potencialidades econômicas do século XXI.

De fato, além de intervenções na infraestrutura, obedecidos critérios de sustentabilidade, houve uma significativa mudança cultural dos empreendedores: compreenderam que os peixes vivos valem mais do que as “vítimas” da pesca predatória e o valor da água limpa é uma resposta saudável e civilizada aos danos da água poluída.

Trata-se, no entanto, de luta permanente. Noronha ganhou a relevância de objeto do desejo exatamente porque fez prevalecer a integridade do ecossistema. O jogo das pressões políticas e a visão equivocada de que economia e meio ambiente são incompatíveis ameaçam a sustentabilidade do Arquipélago.

Assustado, Noronha mandou um grave alerta às autoridades brasileiras e a todos que, no Planeta Terra, são apóstolos dos cuidados com natureza viva e generosa: “a passagem do ‘boi e da boiada´ é uma agravante métrica do crime ambiental: por onde passam golfinhos, mamíferos sociáveis, passam, também, cardumes de ‘tubarões’ famintos de fauna e de lucros.

Uma demanda judicial movida pelo Governo Federal (AGU), junto ao STF sob a argumentação do descumprimento por Pernambuco das cláusulas dos acordos celebrados entre a União e o Estado, ratifica a supremacia do conflito sobre a serenidade do diálogo. Noronha precisa e pede paz. Importante registrar: o atual governo não tem demonstrado o menor compromisso com a questão ambiental.

E por que merece respeito? Porque é “um bem da vida” tal como o poeta Thiago de Mello se referia à Amazônia.

E “Cancún” não é aqui.

Pernambuco e União duelam por Fernando de Noronha | Brasil | Valor Econômico

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