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11
Jul22

Memória da Ditadura: Verdade, justiça e reparação

Talis Andrade

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Quando se trata de passados ditatoriais, a transição entre ditadura e democracia precisa oferecer mecanismos para a reparação das graves violações aos direitos humanos, decorridos de períodos autoritários. Para isso, são necessárias medidas que promovam na esfera política, jurídica e social a memória, associada às dimensões de Justiça, verdade e reparação, para apaziguar a cólera e recuperar, até certo ponto, os traumas vividos por uma sociedade.

Nesse sentido, tudo o que fazemos – justiça, verdade, medidas de reparação- tem de estar inspirado pela reconciliação, mas a reconciliação verdadeira, não a falsa reconciliação que na América Latina se pretendeu como desculpa para a impunidade. A única maneira de se ter uma reconciliação séria e verdadeira é através dos mecanismos de justiça, verdade e reparação (MENDÉZ, 2007, p. 171).

Porém, nem sempre esses três estágios desenvolvem-se de maneira harmônica como descrito anteriormente. No caso do Brasil, os agentes do autoritarismo do Estado não foram sequer julgados pela violência cometida, muito menos foram punidos. A reparação das vítimas pode ter ocorrido, em certa medida, pelos discursos homologados nas narrativas historiográficas, mas sem nenhuma atuação judiciária, o que configura um enorme esquecimento.

No Brasil, temos uma grande profusão de pesquisas e levantamentos documentais sobre a tortura, dentre eles o realizado pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo que resultou na elaboração do livro “Brasil: nunca mais”, publicado em 1985. Porém, na dimensão jurídica e política dos anos de 1980 e 1990 não ocorreram esforços para responsabilizar o Estado pelas violações durante a ditadura militar. Os governos democráticos após 1985 não se empenharam na luta pela verdade, justiça e reparação das vítimas do regime autoritário.

Pelo contrário, ocorreu no Brasil, após a ditadura, a imposição do esquecimento do tema ditadura nas esferas jurídicas e simbólicas, já que esse processo se deu como uma alternativa para “cicatrizar” as feridas do passado doloroso, servindo de argumento para “esquecer” a memória política do país. O que pode ser confirmado pela célebre colocação do presidente José Sarney em defesa da anistia: “(...) É necessário um esforço nacional para, de uma vez por todas, sepultarmos esses fatos no esquecimento da História. Não remexamos nesses infernos, porque não é bom para o Brasil” (SILVA apud BRITO, 2017, p. 35).

Desse modo, há um movimento que intercala três categorias: verdade, justiça e reparação. Sendo que, em casos de recuperação bem sucedida desses passados traumáticos, primeiro se apura os fatos para depois estabelecer a justiça. Ela se efetivará com a punição ou absolvição, para posteriormente iniciar uma política de reparação das vítimas e seus descendentes. No caso do Brasil, não percebemos claramente essa trajetória, pelo contrário, constatamos um longo processo de esquecimento, o que parece ser muito diferente dos embates em torno da memória na Argentina.

Na Argentina, a questão da memória surge em íntima conexão com os crimes. Desaparecimentos, torturas e perseguição feita pelo terrorismo de Estado da última ditadura militar. Embora a luta pela memória (verdade e justiça) tenha começado no trabalho das organizações de direitos humanos durante a própria ditadura (por exemplo, Madres de Plaza de Mayo), podemos dizer que a construção da memória está fortemente ligada à investigação realizada pela Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas (CONADEP), a publicação de seus resultados no Relatório Nunca Mais e no Julgamento das Juntas Militares em 1985 (GONZALEZ, 2014, p. 34).

Na Argentina é fundada a Comissão Nacional sobre o Desaparecimento de Pessoas (CONADEP), criada pelo presidente Raúl Alfonsín em dezembro de 1983, no início da redemocratização, para investigar as violações aos direitos humanos durante a ditadura militar.

Além disso, desde a época de ditadura são vivenciadas ações diárias na Argentina de “ritos de recordação” do passado sensível, como as passeatas semanais das Mães e Avós da Praça de Maio e dos “HIJOS” (Filhos, pela Justiça contra o Esquecimento e o Silêncio) que praticam os “escraches”. “Escrachar” significa colocar alguém em evidência, mostrar a face de quem quer se esconder, utilizando, por exemplo, uma fotografia. As formas de escrache adotadas pela agrupação “HIJOS” foram diversas, tais como manifestações com o uso de pinturas e músicas que visam revelar a face de um agente de Estado que praticou violência durante a ditadura. Uma das estratégias mais comuns foi à colocação de cartazes nas casas de repressores em que se afirmam: “Perigo: aqui mora um assassino”.

Enquanto no Brasil, a Comissão Nacional da Verdade (CNV) que tem por finalidade apurar graves violações de Direitos Humanos ocorridas entre 1946 e 1988 só foi constituída quase 50 anos depois da implantação da ditadura militar. Esse processo, portanto, insere-se numa grande demanda por memória que tem se revelado marcante, sobretudo nos dias atuais. Leia mais

 

Ellen Natucha Pedroza

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