Da Operação Brother Sam à entrega da base em Alcântara
V - Porque Moro é mais perigoso até do que Bolsonaro
por Carlos Tautz
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A rigor, ameaça desse tipo e iminência já ocorreu. Em 1964, o então governador de Minas Gerais e dono do falecido Banco Nacional tramou para derrubar o Presidente constitucional João Goulart. Magalhães Pinto desejava a guerra civil para dividir o Brasil. Seu plano, que não deu certo, era declarar Minas um “estado beligerante” e receber apoio logístico e militar dos 4 mil fuzileiros navais dos EUA que estavam na costa do Brasil, prontos para invadir o país com apoio da submissa e traidora elite das Forças Armadas brasileiras. O plano todo ficou conhecido como Operação Brother Sam e está registrado no Centro de Pesquisa e Documentação da Fundação Getúlio Vargas.
Agora, pelo menos outros dois casos são exemplares de avanços concretos dos EUA em suas intenções de afincar-se no território brasileiro. Bolsonaro apoiou e apoia um e outro, mas ainda não demonstrou capacidade de liderar nenhum dos dois processos. Ambos encontram-se sob condução da elite militar representada em seu governo, que também não os levou a termo, apesar da longa história de submissão gostosamente voluntária da alta oficialidade brasileira em relação a seus pares nos EUA.
A primeira grande ameaça recente à unidade do território brasileiro teve seu ápice público em 2016 sob o golpista Michel Temer. Segundo a BBC Brasil, “tropas americanas foram convidadas pelo Exército brasileiro a participar de um exercício militar na tríplice fronteira amazônica entre Brasil, Peru e Colômbia em novembro deste ano. Segundo o Exército [brasileiro], a Operação América Unida terá dez dias de simulações militares comandadas a partir de base multinacional formada por tropas dos três países da fronteira e dos Estados Unidos”.
Registre-se: foi a primeira vez que tropas americanas pisaram, pelo menos oficialmente, a porção brasileira da bacia amazônica.
A possibilidade dessas tropas se assentarem em definitivo em um enclave dos EUA no território do Brasil está aberta, e parada no Congresso Nacional, desde que Bolsonaro retomou em março de 2019 um acordo para entregar a base aeroespacial de Alcântara (MA). A trama já foi tentada no governo de outro entreguista, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, nos anos 1990, mas não foi adiante. A rigor, os EUA não querem, e nem precisam de, mais uma base aeroespacial.
O valor de Alcântara para Washington em verdade é militar e estratégico. Seria uma forma de os EUA manterem tropas no território da sua maior ameaça na América do Sul, além de ser, devido à posição geográfica em frente à África, uma forma de controlar todo o Atlântico sul e se aproximar estrategicamente do Golfo da Nigéria, onde estão enormes reservas de petróleo semelhantes ao pré-sal brasileiro.
Perigos desse tipo – perigos maiores até do que o risco de convulsão social que se vive sob Bolsonaro, porque irreversíveis – parecem fazer mais sentido em um possível governo Moro daqui a dois anos. Ele já desenvolveu ligações orgânicas com os EUA, o hegemon global, e, internamente, possui aceitação superior até a Bolsonaro.
Enfeixado em apoios decorrentes do nihil obstat dos EUA, onde possui as ligações aqui demonstradas, além de internamente manter aliança permanente com as Organizações Globo e outras frações da burguesia, Moro seria uma força política capaz de organizar em torno de si tamanha coesão social que a meia-esquerda que nos representa não conseguiria sequer esboçar argumentos contrários.
Este é, no fundo, o problema que mais preocupa.