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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

26
Mai20

Suspeição de Moro: o que fazer quando se sabe que se sabe?

Talis Andrade

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Por Lenio Luiz Streck 

Não, não é fácil conseguir a declaração de suspeição de um juiz no Brasil. O STF chegou a dizer no HC 95518 — impetrado pelo brilhante Cesar Bitencourt — que, embora comprovado o ato abusivo do magistrado, isso não implicou parcialidade contra o réu. O juiz em questão era, nada mais, nada menos que Sérgio Moro. Isso há alguns anos. O STF disse, por exemplo, que "atua com inequívoco desserviço e desrespeito ao sistema jurisdicional e ao Estado de Direito o juiz que se irroga de autoridade ímpar, absolutista, acima da própria Justiça, conduzindo o processo ao seu livre arbítrio, bradando sua independência funcional".

Nesse caso em que o STF desenhou o retrato de Moro, esculpindo-o em carrara, embora não tenha poupado adjetivos fortes à conduta abusiva do juiz, não foi declarada a suspeição, uma vez que "o conjunto de atos abusivos, no entanto, ainda que desfavorável ao paciente e devidamente desconstituído pelas instâncias superiores, não implica, necessariamente, parcialidade do magistrado".

Veja-se. O precedente de então, e que, ao que me consta, não foi superado, é o de que apenas não se declara a suspeição por parcialidade quando as decisões decorrentes de condutas desse jaez são corrigidas por instâncias superiores.

Até faz sentido. No entanto, se a conduta abusiva do juiz impregna o conjunto probatório, como se fosse o veneno da tese dos frutos da árvore envenenada, pendo que, desde sempre, o processo deverá ser nulo. De todo modo, dependerá do exame do caso concreto. Como, aliás, deve ser a análise de um precedente. Nenhum precedente se aplica em abstrato ou automaticamente.

Para ser mais claro: no caso do HC impetrado por Bitencourt, o STF apenas remeteu cópias para a corregedoria, porque já estavam corrigidos os erros e as diatribes do juiz Moro. A contrario sensu, pode-se deduzir, então, que, se houvesse qualquer prejuízo ao paciente, a nulidade seria declarada pelo Supremo Tribunal.

Portanto, o fulcro desse precedente foi que "a alegação de suspeição ou impedimento de magistrado pode ser examinada em sede de habeas corpus quando independente de dilação probatória. É possível verificar se o conjunto de decisões tomadas revela atuação parcial do magistrado neste habeas corpus, sem necessidade de produção de provas, o que inviabilizaria o writ".

Temos então que, segundo o STF, é possível ir além do rol taxativo do artigo 254 do CPP (na contramão, recentemente o TRF4 disse que o rol era absolutamente taxativo, com o que nada podia ser feito).

Hermeneuticamente registro que essa tese da taxatividade é, claramente, o resquício da corrente textualista na interpretação brasileira. Por ela, por exemplo, o caso Brown v. Board of Education of Topeka (de 1954) teria sido julgado no sentido da continuidade da separação racial entre crianças (aliás, o ex-textualista Adrian Vermeule, professor de Harvard, diz que, pelo textualismo, a discriminação deveria continuar).

Temos de saber, então, qual é a jurisprudência que vale:

a) a que sustenta que é possível examinar a parcialidade em sede de Habeas Corpus quando há prova pré-constituída (elementos objetivos);

b) a que sustenta que "a arguição de suspeição do juiz é destinada à tutela de uma característica inerente à jurisdição, que é a sua imparcialidade, sem a qual se configura a ofensa ao devido processo legal" (STJ no HC HC 172.819/MG);

c) a que assegura que "(A CF prevê uma) Garantia processual que circunscreve o magistrado a coordenadas objetivas de imparcialidade e possibilita às partes conhecer os motivos que levaram o julgador a decidir neste ou naquele sentido" (STF — HC 110844).

Ou vale a jurisprudência que: 

d) se apega a um textualismo ingênuo e ultrapassado (Vermeule I), sustentando que o rol do artigo 254 é taxativo, com o que a parcialidade acaba ficando de fora ou se constituindo quase que em uma "prova diabólica"?

Eis a questão: valem "a", "b" e "c", lidos separadamente ou conjuntamente, ou vale a alternativa "d"?

Ora, I) uma coisa é dizer que, no artigo 254, estão elencadas hipóteses de afastamento do juiz; outra coisa é II) dizer que o dispositivo elenca (tod)as hipóteses de afastamento. Veja-se que se trata de uma regra. E onde está o princípio? Ou a imparcialidade não é um princípio? Não encontrei quem dissesse que não. Consequentemente, a resposta deveria ser óbvia.

De saída, o próprio texto de lei tem lá suas idiossincrasias. Como a parcialidade não está elencada, entendem, parte da doutrina e jurisprudência (dominantes?) que, fora das hipóteses (taxativas) do artigo 254, a parte não conseguirá demonstrar a suspeição. Não há algo errado nisso?

Se a tese da taxatividade do rol do artigo 254 for vitoriosa, então sequer poderemos cumprir os ditames do Tribunal Interamericano, que diz que é garantia do acusado ser julgado por um tribunal imparcial. Assim, por aqui, se não enquadrarmos nenhum ato do juiz ou do tribunal naquele rol taxativo, mesmo que o juiz tenha sido parcial até as grimpas, nada acontecerá. Ou minha leitura é equivocada?

Vamos a um exemplo: o juiz pode esculachar o réu, cometer abusos (como o fez o juiz Moro no HC mencionado), mas, se ele não é "inimigo capital", nem parente, nem cônjuge, sócio etc., não haverá parcialidade. É a tese da taxatividade. (Continua)

24
Jan20

Suspensão do juiz de garantias é "uma bomba no sistema de Justiça", afirma jurista

Talis Andrade

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Cristiane Sampaio
Brasil de Fato 

 

A suspensão da implementação do “juiz de garantias” por parte do vice-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, na quarta-feira (22), gerou controvérsias entre diferentes especialistas. Para o advogado Patrick Mariano, da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), a decisão extrapola as competências da Corte.

“É uma excrescência jurídica o que ele fez. Não cabe ao presidente do Supremo ou a qualquer relator do STF determinar liminarmente a suspensão de uma lei que já foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo presidente da República”, argumenta Mariano.

A figura do juiz de garantias está prevista no chamado “Pacote Anticrime”, aprovado em dezembro pelo Congresso Nacional, e é um dos trechos inseridos por opositores na proposta quando esta tramitava na Câmara dos Deputados. A inserção no texto se deu a contragosto do ministro da Justiça, Sérgio Moro, autor do pacote, que entra em vigor nesta quinta-feira (23).

“[A suspensão] é uma bomba no sistema de Justiça e na organização judiciária do Brasil. E, mais, uma bomba nos fundamentos da própria República, por conta da divisão de Poderes. É o absolutismo do Judiciário”, considera Patrick Mariano.

A iniciativa do ministro Fux foi criticada também por atores políticos, como é o caso do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). “Desnecessária e desrespeitosa com o governo federal, o parlamento e principalmente com o presidente do Supremo", disse em entrevista à imprensa sobre o assunto.

Pelo texto aprovado no final do ano, o juiz de garantias deve responder pelo acompanhamento dos processos judiciais sem participar do julgamento. Resultado das críticas à conduta de membros do Ministério Público Federal (MPF) e do Poder Judiciário na operação Lava Jato, a criação desse instituto atende a demandas populares que buscam garantir maior isenção do magistrado responsável por tomar decisões relativas aos pedidos judiciais.

Por cima de Toffoli

A decisão de Fux revoga um despacho anterior dado pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, que, no último dia 15, havia adiado por seis meses a implantação da nova medida. O vice-presidente argumentou que a criação do instituto deveria ter partido do Judiciário, pelo fato de se tratar de mudança que afeta a rotina da instituição, e ainda que precisaria vir acompanhada de cálculo sobre o seu impacto orçamentário.

Para o professor Martonio Mont’Alverne Barreto Lima, do curso de Direito da Universidade de Fortaleza (Unifor), a suspensão tende a gerar maior insegurança jurídica em torno do tema, que segue em disputa especialmente por conta da oposição de lavajatistas à figura do juiz de garantias.


"A decisão do Toffoli já foi estranha, mas a do Fux é outro nível de interferência."
“A decisão dele frustra, primeiro, uma expectativa do Poder Legislativo e, depois, uma expectativa da segurança dos direitos e garantias fundamentais”, afirma Lima, também integrante da ABJD.

O vice-presidente do STF suspendeu ainda, em caráter temporário, outros três trechos do pacote, que tratam das novas regras para o arquivamento de inquéritos, da norma para soltura de presos e audiência de custódia, além da proibição dirigida a juízes que tomem decisões processuais baseadas em provas consideradas inadmissíveis.

“A decisão do Toffoli já foi estranha, mas os seis meses você poderia até entender como o fato de que, para a vigência original da lei, de fato, você não consegue mudar uma estrutura da noite pro dia. Mas a do Fux é outro nível de interferência. E é engraçado que, sobre o restante da lei aprovada, ele não falou nada. Então, se é pra suspender por [questão de] eficácia, por que não suspende todo o Pacote Anticrime? Além de tudo, o Fux ainda foi seletivo”, critica Patrick Mariano.

Entenda os trechos vetados por Fux

No caso do juiz de garantias, ele terá poder para decretar e prorrogar prisões preventivas, deliberar sobre aceitação de denúncias e procedimentos como quebra de sigilo, busca e apreensão, interceptação telefônica e obtenção de provas, mas não poderá tomar decisões finais sobre o pedido judicial que orienta o processo em questão.

Quando uma denúncia ou queixa oferecida pelo Ministério Público (MP) for aceita pelo Judiciário, o caso passa automaticamente a ser acompanhado por outro magistrado, que será o juiz responsável pelo julgamento. É ele quem vai ouvir testemunhas e dar a sentença do caso.

Já no ponto que trata do acesso a provas consideradas inadmissíveis, o Pacote Anticrime prevê que o magistrado que tiver acesso a esse tipo de conteúdo não pode proferir sentenças ou acórdãos.

“De alguma forma, atinge o juiz de garantias, que iria rever os atos sobre direitos e garantias fundamentais e ver se o devido processo legal foi observado. Então, na medida em que ele [Fux] suspendeu isso, ele suspende o acesso do juiz de garantias, aí esvazia o sentido dele”, aponta Martonio Mont’Alverne.

Terceiro trecho vetado pelo vice-presidente do STF, a norma sobre audiência de custódia aprovada pelo Congresso Nacional prevê que, caso esse encontro não ocorra no prazo de 24 horas após a prisão, o preso poderá ser solto. Fux argumentou “dificuldades práticas locais de várias regiões do país” para a implementação da medida, que, segundo ele, enfrentam entraves logísticos.

Já o último ponto suspenso trata da regra do Pacote Anticrime segundo a qual o MP deve comunicar à vítima sobre o arquivamento de inquéritos que lhe digam respeito. Além disso, o órgão deve enviar esse tipo de informação para a polícia e encaminhar o inquérito para homologação, a ser feita por instância específica dentro da instituição responsável.

A suspensão dessa norma pelo STF atende a um pedido da Associação Nacional dos Membros do MP (Conamp), que alegou necessidade de mais tempo para adaptação à mudança.

Edição: Rodrigo Chagas

 

22
Jan20

Procurador que denunciou Glenn reforça a ideia de um Brasil selvagem

Talis Andrade

Abuso dos procuradores provocou repúdio da grande mídia internacional ao relator da ONU

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por Luis Nassif

Com sua denúncia do jornalista Glenn Greenwald, o procurador da República Wellington Divino de Oliveira conseguiu colocar o Brasil nas manchetes mundiais. No The New York TimesCNNWashington Post, ao relator da ONU, reforçou a ideia de um país selvagem que, rapidamente, vai erodindo os valores centrais de uma democracia, dos quais a liberdade de imprensa é um dos pilares. Antes disso, abriu processo contra o presidente da OAB nacional, por críticas contra o ministro da Justiça Sérgio Moro.

Assim como o ex- Secretário de Cultura, Roberto Alvim, Wellington é um primário que se excede no uso de ferramentas fascistas. É tão ignorante que não avaliou a repercussão de seu abuso contra um jornalista premiado internacionalmente. Sua denúncia compromete não apenas a imagem do Brasil no mundo, como do próprio Ministério Público Federal, ainda mais quando confrontado com o trabalho profissional realizado pela Polícia Federal nessa operação.

O problema não é Wellington. De um lado, o episódio mostra como o processo de naturalização do fascismo, trabalhado pela mídia esses anos todos, em parceria com a Lava Jato, se incorporou no Ministério Público. Mais que tolerados, todos os abusos foram enaltecidos. Foi dado tratamento escandaloso a qualquer episódio, tom de acusação final a qualquer suspeita, ignoraram-se aspectos mínimos de respeito aos códigos e às provas: bastavam convicções, já que o objetivo era destruir os inimigos.

O resultado está aí, com os métodos fascistas entranhados no Ministério Público Federal. O outro ponto complicado é que esse abuso não foi questionado publicamente por nenhum outro procurador.

Na outra ponta, mesmo sob o comando de Sérgio Moro, a Polícia Federal conduziu um inquérito republicano, tocado pelo delegado Luiz Zampronha. Desde o início, evitou a escandalização, os vazamentos. Na primeira semana, interrogou o principal hacker sobre o ponto central da questão: recebeu ou não pagamento pelas informações. A negativa do hacker foi prontamente divulgada, evitando manipulações futuras do caso.

No final do processo, o Ministério Público Federal sai menor do episódio e a PF de Zampronha se redime dos períodos de sensacionalismo e violência da banda paranaense. Wellington se tornou o principal garoto propaganda da lei anti-abuso que tramita no Congresso. É o exemplo acabado da impossibilidade de se conferir tamanho poder individual a uma corporação que perdeu totalmente o compromisso com as leis e a Constituição.

 

18
Jan20

O Juiz de Garantia: Marco da evolução da democracia brasileira

Talis Andrade

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por Clemilton Saraiva

A mais de um ano publiquei este artigo no https://www.brasil247.com/…/os-monarcas-absolutistas-e-o-ju…. Nele procuramos refletir, sem muitas pretensões, e discorrer um pouco sobre a percepção que tínhamos com relação as profundas raízes absolutistas que estão fincadas e marcam parte da gênese da justiça brasileira.

Com a aprovação da Lei que instituiu o Juiz de Garantia pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República do Brasil, entidades de representação dos magistrados brasileiros foram ao Supremo Tribunal Federal - STF pedir a inconstitucionalidade da lei alegando, segundo elas, falta de recursos para sua implementação. Será?

Em sentido contrário a Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, afirmou que a implementação do Juiz de Garantia no País não implicará em necessidade de novos recursos pois o sistema de Processos Judiciais Eletrônico – PJE, ferramenta de gestão do judiciário brasileiro, garante a proteção dos cidadãos de possíveis abusos de certos “monarcas judiciais” e que a intuição do Juiz de Garantia as decisões judiciais poderão não mais estarem eivadas da falta de imparcialidades e menos contaminadas do viés de cunho político ideológico ou de partes estranhas ao processo.

É de conhecimento geral que o expressivo envolvimento do Juiz no curso de um processo criminal, por exemplo, o envolve muito e na maioria dos casos traz prejuízos incalculáveis a necessária imparcialidade no momento de suas decisões. O Juiz de Garantia inova ao criar a fase de instrução processual da lide, ou seja, a realização de um levantamento legal e criterioso de informações que irão subsidiar a formação do juízo de julgamento.

Há uma máxima corrente no ambiente dos operadores do direito, usada de forma jocosa, que diz: " tem juiz que não ‘se acha’ que é Deus! Ele tem certeza." Apesar de bem-humorada, a expressão é carregada de um caráter de cunho absolutista que nutre o mental e a cultura, de parte dos “togados” ou “capas pretas” brasileiros, que em certos casos exaram comportamentos perceptíveis por meio dos fundamentos de suas decisões públicas ou até mesmo em suas ações no mundo privado, frente a investidura e poder do cargo público, como seres que devem ser “temidos” ou seguidos. Lembra do adágio popular: “sabe com quem está falando”, ele tem na sua “genética” os resquícios de uma cultura totalitária que ainda marcam a sociedade brasileira. 

Diante destas questões que povoam as subjetivas formações de caráter do nosso povo, o Juiz de Garantia vem em boa hora e poderá se transformar em um marco de evolução da democracia brasileira, impedindo que certos atores do judiciário se valham de artifícios interpretativos e procurem se absterem de julgamentos e decisões que fujam da estrita observância aos preceitos do devido processo legal e ao irrestrito e amplo direito de defesa.

10
Out19

As motivações políticas da Lava Jato

Talis Andrade

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”

 

O que se coloca em jogo na Lava Jato não é a mera existência de política e, sim, o papel que essa dita “política” exerceu sobre as atuações das organizações jurídicas, as motivações da operação, as alianças indisfarçáveis que vão se tornando cada vez mais nítidas entre as forças que geraram, primeiramente, algumas escoriações no Estado democrático de direito e que, agora, deixam-no cada vez mais capenga. É esse o esforço ao longo desse texto, mostrar que, em que pese a existência de política no direito, tal reconhecimento não pode entravar a sua busca e reivindicação por autonomia, a constante restrição de sua discursividade, exigindo alianças cada vez mais consistentes. Embora o direito seja também política, sabe-se que ele não é somente isso.

O grande problema da Lava Jato, para falar com Deltan Dallagnol, é que a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior, que é o político.

O problema da Lava Jato não é somente quando existe alguma política norteando as decisões, mas quando esse Estado fica tão moribundo que a questão jurídica se torna filigrana dentro do contexto “maior”, que é o político, em sentido oposto do qual deveria ser pensada a discursividade do mundo do direito, em que o contexto político é que deveria ser a filigrana.

A Lava Jato se torna um absoluto quando adquire o poder do rei, quando passa a ser incontestada, dona da verdade e da bondade; quando não se envergonha de utilizar métodos neofascistas de tortura para atingir os seus objetivos, tal como quando cinicamente autorizou devassa na vida da filha de um acusado da operação, com o claro objetivo de amedrontar e martirizar o seu pai; ou quando demonstra desdém e absoluto desrespeito perante a morte dos familiares dos investigados, “esses que não são gente como a gente”, tal como no falecimento da esposa e neto de Lula, chegando ao absurdo higienista e separatista da procuradora Thaméa Danelon afirmar que a presença e humanidade de um membro do MP no funeral era mesmo uma traição, demonstrando “partidarismo”; claro, os partidários são sempre os outros!

A Lava Jato vira soberana quando, passando a ocupar o lugar de Deus, Onisciente e Onipotente, a posição do Neutro, ignora seus próprios problemas, inclusive, a sua própria corrupção e política, e passa a perseguir a corrupção e a política dos outros, esses sim, essa “gentalha política corrupta e atrasada”, que é menos “gente” que eles, tal como os nazistas, em outros tempos, contextos e proporções, mas que também construíram os judeus como outros que não humanos, demarcando o fim da humanidade ao menos como pensada pelo humanismo iluminista.

Isso se torna claramente um problema quando, não podendo atuar sobre os poderes nas urnas, investe-se pesadamente no messianismo jurídico que, enquanto projeto de poder, tem por objetivo utilizar as estruturas do direito e a “supremacia moderna” de suas organizações, para atingir os fins que somente seriam possíveis de serem atingidos através da política, agora, no sentido “moderno” do termo, quando este se torna, para falar como Isabelle Stengers, uma restrição leibniziana, um modo de construção de sentido possuidor de suas próprias regras de ingresso e disputa.

Não importa que exista política na Lava Jato, o que interessa é quando a Lava Jato se torna propriamente a política, só que disfarçada de direito; quando existe tal discursividade norteante, bailando e maculando cada ato da operação e seus atores.

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É quando roboticamente e obsessivamente o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, fala em um membro do MP concorrendo ao Senado por Estado, o que, nos termos de Dallagnol, equivaleria a um partido da Lava Jato (...)

Esses propósitos de Dallagnol seriam ainda mais perniciosos se não fosse a morte prematura da tal “organização” ou, melhor falar, “partido” da Lava Jato, formado com os fundos de R$ 2,5 bilhões da Petrobras, quando alguns agentes da operação viram nesta algo como a “galinha dos ovos de ouro”, um passo adiante da notável lucratividade da “luta” contra a corrupção, anteriormente colocada apenas a título de remuneração de palestras, livros e eventos. Naquela ocasião, a promessa era de que o fundo iria incentivar projetos “apartidários” anticorrupção, aquilo que, após ação de Raquel Dodge, foi suspenso pelo STF.

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”: afinal, após o conflito interno no MPF, entre Raquel Dodge e Lava Jato, os membros ministeriais da operação informaram ter “desistido” da atuação – como se fosse possível desistir após o fracasso, como se restasse alternativa ao que já estava decidido, um modo de demonstração de poder, coerente ao projeto lavajatista, que Gilmar Mendes tão bem definiu como “projeto de poder”.

Agora, após o início da Vaza Jato, sabe-se bem quais são essas organizações “apartidárias” de Deltan Dallagnol, que seriam beneficiadas pelo fundo bilionário administrado pela Lava Jato, que, inclusive, foram utilizadas para forçar o impeachment de Dilma Rousseff. Outra influência direta da Lava Jato nos modos de operação da política foi a divulgação seletiva das conversas grampeadas de Lula que, ao longo das temporalidades da Lava Jato, desencadeou uma série de ações: nomeação de Lula para a Casa Civil -> que gerou cancelamento via decisão de Gilmar Mendes -> que aprofundou a crise do governo de Dilma -> que desencadeou, ao longo da série sucessiva de episódios, o golpe de Temer e a prisão de Lula. Talvez agora Gilmar Mendes se arrependa de ter alimentado o monstro, mas, ao que tudo indica, na cadeia de eventos no tempo, a sua atuação foi no mínimo fundamental para chegar onde chegamos. Transcrevi trechos   

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20
Set19

As motivações políticas da Lava Jato

Talis Andrade

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Ana Paula Lemes de Souza

Para falar com Kelsen, mas, igualmente, contra Kelsen, não existe um “Direito Puro”. A construção teórica do direito puro, completamente despido de outros interesses, tais como os políticos e os econômicos, deve ser fruto do ópio dos modernos, esse discurso esterilizante ao mesmo tempo em que hipnótico e analgésico, por meio do qual se tentou construir o ideal do direito purificado de todas as paixões, junto com a estruturação da imparcialidade, que, ao longo do aprofundamento da lógica da racionalidade moderna do Estado burocrático, gerou a supremacia do direito sobre a política. Aliás, esse argumento da suposta autonomia positivista do direito serviu, ao longo da história ocidental, menos como frenagem e mais como o motor legitimador das mais diversas arbitrariedades.


Interesses políticos se colocam em tela, seja através da luta epistêmica pelo “dizer o direito” entre os tribunais, com suas relações de forças, conflitos e jogos de poder, seja através da produção de sentido entre forças nitidamente sociais, como entre as doutrinas dominantes e outras formas de produção de saberes, nos conflitos entre centros e periferias, diferenças de escalas e escolas, perspectivas e visões de direito – para não falar em choques de mundos! – ou, ainda, através de alianças momentâneas com os interesses ditos impuros, como os industriais, os econômicos e os estatais. Não se discute se existe ou não política no direito – pois o direito está mesmo repleto de política! – ainda mais se considerarmos, assim como na perspectiva proposta por Viveiros de Castro e Danowski, que a política dita dos ocidentais é apenas um departamento da cosmopolítica.

 

O que se coloca em jogo na Lava Jato não é a mera existência de política e, sim, o papel que essa dita “política” exerceu sobre as atuações das organizações jurídicas, as motivações da operação, as alianças indisfarçáveis que vão se tornando cada vez mais nítidas entre as forças que geraram, primeiramente, algumas escoriações no Estado democrático de direito e que, agora, deixam-no cada vez mais capenga. É esse o esforço ao longo desse texto, mostrar que, em que pese a existência de política no direito, tal reconhecimento não pode entravar a sua busca e reivindicação por autonomia, a constante restrição de sua discursividade, exigindo alianças cada vez mais consistentes. Embora o direito seja também política, sabe-se que ele não é somente isso.

 

O grande problema da Lava Jato, para falar com Deltan Dallagnol, é que a questão jurídica é filigrana dentro do contexto maior, que é o político.

 

O problema da Lava Jato não é somente quando existe alguma política norteando as decisões, mas quando esse Estado fica tão moribundo que a questão jurídica se torna filigrana dentro do contexto “maior”, que é o político, em sentido oposto do qual deveria ser pensada a discursividade do mundo do direito, em que o contexto político é que deveria ser a filigrana.

 

A Lava Jato se torna um absoluto quando adquire o poder do rei, quando passa a ser incontestada, dona da verdade e da bondade; quando não se envergonha de utilizar métodos neofascistas de tortura para atingir os seus objetivos, tal como quando cinicamente autorizou devassa na vida da filha de um acusado da operação, com o claro objetivo de amedrontar e martirizar o seu pai; ou quando demonstra desdém e absoluto desrespeito perante a morte dos familiares dos investigados, “esses que não são gente como a gente”, tal como no falecimento da esposa e neto de Lula, chegando ao absurdo higienista e separatista da procuradora Thaméa Danelon afirmar que a presença e humanidade de um membro do MP no funeral era mesmo uma traição, demonstrando “partidarismo”; claro, os partidários são sempre os outros!

A Lava Jato vira soberana quando, passando a ocupar o lugar de Deus, Onisciente e Onipotente, a posição do Neutro, ignora seus próprios problemas, inclusive, a sua própria corrupção e política, e passa a perseguir a corrupção e a política dos outros, esses sim, essa “gentalha política corrupta e atrasada”, que é menos “gente” que eles, tal como os nazistas, em outros tempos, contextos e proporções, mas que também construíram os judeus como outros que não humanos, demarcando o fim da humanidade ao menos como pensada pelo humanismo iluminista.

Isso se torna claramente um problema quando, não podendo atuar sobre os poderes nas urnas, investe-se pesadamente no messianismo jurídico que, enquanto projeto de poder, tem por objetivo utilizar as estruturas do direito e a “supremacia moderna” de suas organizações, para atingir os fins que somente seriam possíveis de serem atingidos através da política, agora, no sentido “moderno” do termo, quando este se torna, para falar como Isabelle Stengers, uma restrição leibniziana, um modo de construção de sentido possuidor de suas próprias regras de ingresso e disputa.

 

Não importa que exista política na Lava Jato, o que interessa é quando a Lava Jato se torna propriamente a política, só que disfarçada de direito; quando existe tal discursividade norteante, bailando e maculando cada ato da operação e seus atores.

 

É quando roboticamente e obsessivamente o coordenador da Lava Jato, Deltan Dallagnol, fala em um membro do MP concorrendo ao Senado por Estado, o que, nos termos de Dallagnol, equivaleria a um partido da Lava Jato, o que não é difícil de se imaginar, ainda mais em tempos de conflitos entre Sergio Moro e Bolsonaro, quando o messianismo de Moro, o faxineiro moralizante da política, sobrepõe-se ao “Messias” de Jair Messias Bolsonaro, tal como apontado pela Datafolha recentemente, que aponta o índice de aprovação do “superministro” de 52% (cinquenta e dois por cento), enquanto, em período coincidente, sobe a reprovação de Bolsonaro para 38% (trinta e oito por cento).

Esses propósitos de Dallagnol seriam ainda mais perniciosos se não fosse a morte prematura da tal “organização” ou, melhor falar, “partido” da Lava Jato, formado com os fundos de R$ 2,5 bilhões da Petrobras, quando alguns agentes da operação viram nesta algo como a “galinha dos ovos de ouro”, um passo adiante da notável lucratividade da “luta” contra a corrupção, anteriormente colocada apenas a título de remuneração de palestras, livros e eventos. Naquela ocasião, a promessa era de que o fundo iria incentivar projetos “apartidários” anticorrupção, aquilo que, após ação de Raquel Dodge, foi suspenso pelo STF.

Instaura-se o paradoxo: a luta anticorrupção é boa, desde que não se fale em corrupção da própria “luta anticorrupção”: afinal, após o conflito interno no MPF, entre Raquel Dodge e Lava Jato, os membros ministeriais da operação informaram ter “desistido” da atuação – como se fosse possível desistir após o fracasso, como se restasse alternativa ao que já estava decidido, um modo de demonstração de poder, coerente ao projeto lavajatista, que Gilmar Mendes tão bem definiu como “projeto de poder”.

Agora, após o início da Vaza Jato, sabe-se bem quais são essas organizações “apartidárias” de Deltan Dallagnol, que seriam beneficiadas pelo fundo bilionário administrado pela Lava Jato, que, inclusive, foram utilizadas para forçar o impeachment de Dilma Rousseff. Outra influência direta da Lava Jato nos modos de operação da política foi a divulgação seletiva das conversas grampeadas de Lula que, ao longo das temporalidades da Lava Jato, desencadeou uma série de ações: nomeação de Lula para a Casa Civil -> que gerou cancelamento via decisão de Gilmar Mendes -> que aprofundou a crise do governo de Dilma -> que desencadeou, ao longo da série sucessiva de episódios, o golpe de Temer e a prisão de Lula. Talvez agora Gilmar Mendes se arrependa de ter alimentado o monstro, mas, ao que tudo indica, na cadeia de eventos no tempo, a sua atuação foi no mínimo fundamental para chegar onde chegamos.

Quanto à (i)legalidade da decisão de Moro, que autorizou a divulgação e anexou conversa entre Dilma e Lula ocorrida após o fim dos grampos, somada à problemática da incompetência quanto à divulgação da conversa da presidenta, que gozava de foro privilegiado, bastaram as “respeitosas escusas” à corte, nesta e em outras ocasiões, coisa que deveria ser o problema essencial a ser enfrentado pelo modo de operação jurídica.

Contudo, para falar como o procurador Andrey Borges de Mendonça, os filigranas jurídicos não iriam “convencer ninguém”, apesar de Dallagnol ter confessado que tal grampo ilegal era de “notável relevância no mundo jurídico”, que, diga-se, deveria ser a legítima preocupação dos membros do Ministério Público Federal.

Isso sem contar a confissão do ex-procurador lavajatista Carlos Fernando dos Santos Lima de que a Lava Jato teve lado nas eleições, que era o de Bolsonaro e não o “daquele outro” candidato, o do PT, “decisão óbvia”, mostrando o alinhamento partidário eleitoreiro dos agentes jurídicos e maculando mais uma vez a constituição e o Estado democrático de direito.

 

Quando o MPF cava a própria cova

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O mesmo se diz quanto ao Ministério Público, com a indicação de Augusto Aras para a Procuradoria Geral da República pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), fora da lista tríplice, contrariando a autonomia do órgão que, desde 2003, é chefiado por pessoas que minimamente representam a investida democrática, já que a indicação presidencial se dá entre os três mais votados por processo de escrutínio interno da organização.

Ignorando completamente a lista e indicando Augusto Aras para o cargo de procurador-geral, trata-se de mais uma investida contra a autonomia do Ministério Público, mais uma queda para a Constituição da República, mais um ataque ao Estado democrático de direito. Isso sem contar o “duplipensar” inerente ao ato, já que, em que pese a defesa institucional do Ministério Público do meio ambiente e dos direitos das minorias, o escolhido eleito para representar essas defesas institucionais deve ser justamente aquele que não defende o meio ambiente e nem as minorias. O flerte de Augusto Aras com o cargo já tinha se tornado evidente há algum tempo, quando passou a declarar abertamente ser contra “ideologia de gênero” e assinou carta de compromissos com a Anajure – Associação Nacional de Juristas Evangélicos, em que se compromete a lutar por uma série de questões inclusive já pacificadas pelo STF – tal como atuar pela família monogâmica e heterossexual, contrariamente à posição do STF que aceita a relação homoafetiva, apoiar a “cura gay”, fora outras pautas igualmente bizarras, como o apoio às ideias de base da “Escola Sem Partido” e ao ensino religioso confessional nas escolas.

Ainda, deve ser lembrada a questão ambiental, que era fundamental para a escolha de Bolsonaro, pois o chefe da Procuradoria da República não deve ser “xiita ambiental” e deve tratar as “minorias como minorias”, coisa que Aras está bem “alinhado”, pois afirmou em abril desse ano que não se pode “radicalizar” a defesa do meio ambiente e da proteção aos povos indígenas, afirmações que, sendo missão institucional primordial do MP a defesa do meio ambiente e das minorias, deve ser radicalizado no sentido mais genuíno do termo. Ainda, afirmou que existem “minerais estratégicos” em reservas indígenas, discursivamente se relacionando aos desmontes ambientais que constituem o grande marco do governo de Bolsonaro. Esse “duplipensar” indica o pathos de desmonte generalizado, já que o mesmo ocorre em outros meios, inclusive com a nomeação de Marcelo Augusto Xavier da Silva, que assessorou a bancada ruralista e é declaradamente contra os indígenas e suas reservas, para chefiar o Funai – Fundação Nacional do Índio.

Cumpre observar que Augusto Aras é alinhado também da Lava Jato, indicando os membros higienistas da operação para compor sua equipe, tal como Thaméa Danelon, cujo o cinismo e mau caratismo vêm sendo dissecados pela “Vaza Jato”. Mais uma vez, é Dallagnol quem assume a postura neutral do Sirius e advoga apenas em causa própria, ignorando o desrespeito à lista tríplice do Ministério Público e defendendo “ação conjunta” com Aras, convocando seus pares zumbificados e mortificados para levantar do túmulo, afinal, tudo vale pela sua pseudo-luta “contra” a corrupção; é questão de fé, mesmo que isso signifique, no dizer popular, “vender a alma para o diabo”, pois, ao que tudo indica, os portões infernais já foram abertos.

Por fim, cumpre observar que, em que pese a própria cova que o Ministério Público tem cavado para si próprio, ainda leva junto consigo a Constituição. É claro que a definição do que o direito é nunca é neutra. Ela é historicizada e confere direitos e deveres aos seus autores. Ela ao mesmo tempo exclui e inclui, proíbe e cria um modelo. Mas alimentar politicamente as organizações do direito é dotar a política de novas formas de ingresso na disputa, o que – deveria ser desnecessário dizer! – é uma relação duplamente perigosa, tanto para a legitimidade do direito, quanto para a política. E salve-se quem puder: as fumaças escuras parecem nunca nos abandonar, enquanto as covas são incansavelmente abertas.

29
Jun19

JUSTIÇA DE ATORES HOSTIS E DISCRICIONÁRIOS

Talis Andrade

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por ROBERTO M. PINHO

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(...) “O judiciário nunca possuiu uma dinâmica de trabalho. São patrões de si mesmo. Daí hostis e discricionários. Não existe controle rígido das tarefas, essas sequer são cobradas, eis que inexiste controladoria capaz de romper a blindagem do serviço público”.

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou, no dia 26 de junho o projeto conhecido como dez medidas da corrupção, que inclui a punição ao abuso de autoridade de magistrados e integrantes do Ministério Público. A partir de agora o cerco se fecha em cima de magistrados, promotores e autoridades, indo no sentido do pleito dos deputados que inseriram a definição de abuso de autoridade justamente para restringir o poder dos investigadores. Juízes e membros do Ministério Públicos ficam proibidos, por exemplo, de atuar com "evidente motivação político-partidária" e de participar em casos em que sejam impedidos por lei. Há uma restrição para a realização de comentários públicos de casos em andamento, mas ela é mais rígida para juízes (de quem é proibida qualquer "opinião").
 
Nepotismo - O Judiciário é o Poder mais fechado do país e alinha-se com o executivo e o legislativo como um dos mais corruptos e insolentes. Isso acaba provocando grandes distorções e facilitando a orgia de salários nos tribunais, além de outras praticas nocivas. Nepotismo com artimanhas envolvendo parentes, troca de nomeações entre os gabinetes e sessões. Para melhor avaliar a lesão causada às contas da União, pesquisa realizada em 2016 mostrou que 76,48% dos magistrados ganham acima do teto constitucional de (R$ 33,7 mil), valor com as gratificações e penduricalhos, chegam a R$ 100 mil/mês. Com isso o orçamento de 2017 consumiu 93,2% com a folha de salário. Os maiores salários são recebidos por ministros dos tribunais superiores, desembargadores e juízes.
 
Dados levantados e divulgados pela entidade Contas Abertas, apontam que a União gastou em 2017 R$ 72,8 bilhões com o Judiciário, incluindo restos a pagar. O valor engloba salários, benefícios e estrutura do Judiciário Federal. Não inclui, portanto, os gastos dos Judiciários Estaduais. O valor surpreende, principalmente quando se compara aos gastos da União com Saúde: 109,8 bilhões em 2017, e Educação: 129,6 bilhões. Só Justiça Federal, no mesmo ano, gastou R$ 40,6 bilhões e do Trabalho R$ 19,9 bilhões. Mas não é possível pegar só um número e se analisar, é preciso ver com detalhes como está sendo gasto.
 
Juízes TQQ - O judiciário nunca possuiu uma dinâmica de trabalho. São patrões de si mesmo. Conseqüentemente hostis e discricionários. Não existe controle rígido das tarefas, essas sequer são cobradas, eis que inexiste controladoria capaz de romper a blindagem do serviço público. Nas varas o preposto do patrão (União) é o juiz, mas existe uma troca de favores, para que este não fique assoberbado e tenha folgas alem do permitido. Quem conhece as entranhas de um tribunal, sabe perfeitamente que nos gabinetes e secretarias, os servidores, formam grupo de trabalho, de forma que todos só trabalhem quatro dias por semana. Os magistrados por sua vez, só trabalham três duas vezes por semana. Por conta disso os advogados os denominam de TQQ (terças - quartas e quintas).
 
Camuflagem - Quem controla o judiciário? A resposta é que não há controle. Ele navega “livre, leve e solto”. Apesar disso reagem raivosos, quanto a receber criticas da sociedade. Do outro lado soberano e vetusto, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), na cúpula dos tribunais é um órgão que possui a missão de contribuir para o aperfeiçoamento da justiça, possui composição de membros que coincide com o perfil dos magistrados brasileiros, no entanto são corporativistas e decidem no sentido de favorecer seus pares. O que chama a atenção é o fato de as informações, mesmo sendo públicas, estarem camufladas. É quase impossível ter acesso às folhas de salários dos tribunais do Brasil. Não há uniformização nos procedimentos de busca, o que dificulta o entendimento e a interpretação dos dados pelos cidadãos. Em suma inexiste uma simbiose com o cidadão-contribuinte.
 
 
06
Mar19

O Estado de polícia de Moro e Bolsonaro: holocausto da esquerda

Talis Andrade

bolsonaro raising_the_brazilian_flag__enrico_bertu

 

por Pedro Maciel

 

"Sou da opinião de que a reflexão sobre a cultura brasileira deve ser o ponto de partida para o debate sobre as opções do desenvolvimento".                        (Celso Furtado)

 

- O que é Estado de Polícia?

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Bem, me socorro do "Dicionário de Política" de Bobbio, Matteucci e Paquino para dizer que o Estado de Polícia é instrumento de se que serve "o príncipe" para impor a sua presença e autoridade, contra as forças tradicionais ou contra o chamado arranjo institucional vigente.

O Estado de Polícia de Moro e Bolsonaro é a representação de uma indesejada transição do Estado Constitucional, do Estado Social e Democrático de Direito, para um campo nebuloso onde Direitos são relativizados.

Em síntese, o Estado policial é o tipo de organização estatal fortemente baseada no controle da população (e, principalmente, de opositores e dissidentes) por meio da polícia politica, das forças armadas e outros órgãos de controle ideológico e repressão política.

Historicamente, o Estado de polícia é um tipo de Estado em que o soberano é isento de qualquer limite formal ou controle jurisdicional. Em decorrência disso, o campo de ação da polícia acaba por se estender por toda a administração pública, à exceção das forças armadas e nos assuntos financeiros, sendo assim, Paulo Guedes – representante do braço financeiro e ultraliberal de um governo servil a interesses do Império - pode seguir diligentemente trabalhando pela entrega do controle da Previdência ao setor financeiro.

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Segundo teóricos do absolutismo a ampliação dos poderes do Estado seria moralmente justificável por sua finalidade, que seria a de trazer bem-estar e felicidade aos indivíduos; e, diziam, só o Estado absoluto poderia dispor do poder e dos meios necessários (inclusive a coação física) à realização de tal finalidade, por não estar sujeito às suas próprias leis.

Tal concepção resulta em uma confusão entre fins (a felicidade dos súditos) e meios (o poder do Estado). É essa confusão que fundamenta o surgimento do Polizeistaat - o Estado de polícia ou Estado policial.

Historicamente ao Estado policial sucede o Estado de Direito, mas Moro e Bolsonaro buscam inverter a roda do processo civilizatório.

Não há dúvida alguma que no contexto das democracias constitucionais contemporâneas a instituição de um Estado Policial é um retrocesso, trata-se de decisão que contamina as estruturas e instituições, que corrompe os poderes e seus membros. Vemos a inauguração de um Estado marcado pelo uso intenso das forças da ordem ou de policia secreta, basta imaginarmos a alegada relação de Bolsonaro e seus filhos com as milícias. A ideia de Estado policial aparece, então, ligada ao totalitarismo e toda a ideologia que o sustenta e justifica.

- Exemplos indicativos da preferência de Moro e Bolsonaro pelo Estado de Polícia, em detrimento do Estado Social e Democrático de Direito.

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Bolsonaro e Moro tem indisfarçada preferência pela relativização dos direitos constitucionais.

O presidente chegou a afirmar que fecharia o congresso e daria um golpe militar (é verdade que isso foi dito nos anos 1990, mas ele disse essa estultice).
 

Assim como elogiou o ditador paraguaio Alfredo Stroessner em público. O ex-ditador paraguaio é responsável por crimes contra a humanidade, foi chamado de "estadista" por Bolsonaro.

E mais, Eduardo Bolsonaro, filho do presidente, foi ao Chile e elogiou o ditador Augusto Pinochet, ignorando que o ex-ditador chileno, foi condenado por crimes contra a humanidade e corrupção. O próprio presidente Bolsonaro confessou ser admirador de Pinochet, a quem num telegrama ao seu neto chamou de "saudoso general".

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Mais exemplos da falta de apreço do presidente Bolsonaro pela democracia e pelo arranjo institucional de 1988?

Vamos lá.

O presidente não se constrange em elogiar torturadores que atuaram na Ditadura Militar no Brasil, como o coronel Carlos Brilhante Ustra.

Bolsonaro já afirmou: "Brasil só vai melhorar quando nós partirmos para uma guerra civil aqui dentro..." e que as coisas ficariam ainda melhores "Fazendo o trabalho que o regime militar não fez, matando uns 30 mil, começando com o [então presidente] FHC. Não deixar pra fora, não, matando. Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente".

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Há dezenas, centenas de exemplos envolvendo Bolsonaro. Mas vamos a Moro.

Sérgio Moro, desde que eu ouvi falar dele, não é um magistrado, é um agente politico a serviço de um Estado Policial, autoritário e ultraliberal.

E, por razões que apenas o tempo revelará, recebeu do Tribunal Regional Federal da 4ª Região autorização para ignorar a lei e a Constituição Federal, transformando a 13ª Vara Federal de Curitiba num bunker cujo único objetivo era criminalizar a Política, os partidos e os políticos de esquerda, de tal sorte que a ultradireita voltasse ao Planalto.

Moro gravou a presidente da República, divulgou as gravações às vésperas das eleições de 2014 com evidente objetivo político, assim como divulgou a delação de Palocci, despida de qualquer documento, às vésperas das eleições de 2018; abusou das prisões preventivas e instrumentalizou a mídia a seu bel prazer, destruindo reputações e vidas.

Moro é um velhaco.

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Método Nazista para dominação.

Moro e Bolsonaro, assim como Hitler, não tem apreço à democracia, à diversidade cultural e ideológica.

No ano de 1923, Hitler tentou tomar o poder no estado da Baviera, em Munique, mas foi preso e condenado.

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Bolsonaro não tentou "tomar o poder", mas já defendeu o fechamento do congresso e outro golpe militar, e para sua vitória em 2018 contou com Moro, que instrumentalizou a lei e a constituição a seu bel prazer, relativizando direitos e arranjos institucionais. Como revela a sabedoria popular: "o juiz apitou o jogo, roubou e agora é funcionário do time que ganhou o jogo. – Pode isso Arnaldo?".
 

Voltemos a Hitler. No seu julgamento em 1923, suas palavras expressavam o ódio às sanções do Tratado de Versalhes e o ressentimento nacionalista e racista que daria o tom da sua ideologia. Bolsonaro, desde que chegou ao congresso nacional em 1990, vem afirmando que a democracia e a política não são um caminho adequado e prega o retorno ao período de excepcionalidade institucional, a pena de morte, a redução da maioridade penal e a liberação das armas, dando a esse discurso matiz libertário e nacionalista.

Nos seis meses em que ficou preso, Hitler desenvolveu sua ideologia no livro intitulado "Minha Luta" (Mein Kampf), que se tornou política do Estado totalitário quando os nazistas tomaram o poder em 1933.

Entre as ideias defendidas pelos nazistas, estava o antissemitismo, isto é, aversão aos judeus e atribuição da culpa da decadência econômica alemã a esse povo, além da atribuição da "degenerescência moral e física" da população alemã também à presença dos judeus e de outros povos. Para Bolsonaro a culpa da decadência econômica brasileira é da esquerda, o inimigo do Estado é à esquerda, todos os partidos de esquerda e Lula é a representação do seu ódio.

Assim como Hitler Bolsonaro escolheu seu inimigo.

A eugenia também era marca do nazismo e estava diretamente associada ao arianismo, isto é, à eleição da raça branca como uma raça superior às demais. Bolsonaro elegeu como superiores todos que se reconhecem de direita, tanto que quando Eduardo Bolsonaro, disse que as "Mulheres de direita são mais bonitas que da esquerda", fez-se um recorte que deveria ter merecido atenção dos setores progressistas, pois a frase foi dita um dia depois do ato que reuniu mulheres contrárias ao então candidato do PSL.

Assim como no nazismo de Hitler a dupla Moro e Bolsonaro usa a propaganda política como instrumento de convencimento, constrangimento e implantação de certezas.

A propaganda política busca "imbuir o povo, como um todo, com uma doutrina e, para o público em geral, funciona a partir do ponto de vista de uma ideia, e o prepara para quando da vitória daquela opinião", são palavras de Hitler, o qual defendia o uso de propaganda política para disseminar seu ideal de Nacional Socialismo. O Nazismo compreendia o racismo, o antissemitismo e o antibolchevismo. E, pasmem, em 2004 Sergio Moro, no seu, "Considerações sobre a Operação Mani Pulite", defendeu o uso da propaganda, o vazamento seletivo de informações através da imprensa e o uso da imprensa para obter apoio da opinião pública sobre as investigações; defendeu a relativização de direitos e afirmou ser inevitável alguma "lesão indevida à honra do investigado ou acusado" mas isso seria uma externalidade, como crê Bolsonaro: "Se vai morrer alguns inocentes, tudo bem, tudo quanto é guerra morre inocente".
 

Vamos em frente.

Após a chegada do nazismo ao poder em 1933 Hitler criou o Ministério do Reich para "Esclarecimento Popular e Propaganda", encabeçado por Joseph Goebbels. O objetivo do Ministério era garantir que a mensagem nazista fosse transmitida com sucesso através da arte, da música, do teatro, de filmes, livros, estações de rádio, materiais escolares e imprensa, tudo controlado pelo governo nazista. Por aqui Bolsonaro extinguiu o Ministério do Cultura, o Ministério do Trabalho e agora informa a instalação da "Lava-Jato da Educação". Nas palavras de Carlos Bolsonaro, filho do Presidente: "A Lava-Jato do MEC está vindo aí para fazer a vagabundagem chorar mais ainda" e nas palavras do Presidente: "Há algo muito errado (...). Para Investigar isso o MEC junto com o Ministério da Justiça, Policia Federal, AGU e CGU criaram a Lava-Jato da Educação". Mais um movimento da dupla Moro-Bolsonaro, na implantação do Estado Policial.

 

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Existiam várias audiências para receber e assumir as propagandas nazistas. Os alemães eram constantemente relembrados de suas lutas contra inimigos estrangeiros, e de uma pretensa subversão judaica.

No período que antecedeu a criação das medidas executivas e leis contra os judeus, as campanhas de propaganda criaram uma atmosfera tolerante para com os atos de violência contra os judeus, particularmente em 1935, antes das Leis Raciais de Nuremberg, e em 1938, após a Kristallnacht, quando do fluxo constante de legislação antissemita sobre os judeus na economia. Aqui no Brasil a relativização de direitos constitucionais foi tratada como necessária no inadiável combate a corrupção.

A propaganda também incentivou a passividade e a aceitação das medidas iminentes contra os judeus, uma vez que o governo nazista interferia e "restabelecia a ordem" (derrubada pela derrota alemã na 1ª Guerra Mundial). No Brasil de Moro e Bolsonaro as prisões preventivas e a desqualificação dos juristas garantistas tem sido o método. Tudo com apoio ou silêncio obsequioso da imprensa e de uma sociedade parcialmente anestesiada.

Mesmo tendo vencido as eleições, Bolsonaro, com assessoria de Steve Bannon, segue sua guerrilha nas redes sociais, emporcalhando-a com mentiras e versões, rebatizadas de memes. Não deixa seus adeptos esquecer que Lula e a esquerda, especialmente o Partido dos Trabalhadores, são os inimigos e devem permanecer na linha de tiro. Não importa a verdade que o meme comunica, o que importa é manter em estado de guerra seus adeptos contra o inimigo.

Conclusão.

A esquerda vive seu holocausto e não se deu conta disso.

Não há conciliação possível com o a dupla Moro e Bolsonaro, o único caminho é a Política de verdade, a Política do debate, a Política do movimento, a Democracia e a denúncia cotidiana ao país e ao mundo de quem são e o que pretendem esses neonazistas e a horda de canalhas que estão no entorno deles.

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