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O CORRESPONDENTE

Os melhores textos dos jornalistas livres do Brasil. As melhores charges. Compartilhe

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O CORRESPONDENTE

31
Ago19

A perversão desumana do lavajatismo

Talis Andrade

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Por Gustavo Freire Barbosa

 CartaCapital

Lavajatismo e bolsonarismo são fenômenos que se confundem. Seus valores são praticamente os mesmos: moralismo exacerbado, messianismo, criminalização da política, ojeriza a evidências científicas e desprezo ao que se convencionou a chamar de estado democrático de direito. Tudo temperado com um maniqueísmo adolescente e com uma profunda, bizarra e constrangedora indigência intelectual.

Moro, divindade maior do lavajatismo, nunca escondeu que a operação da qual decorre sofre de azia quando se depara com o que considera a maior arma de que os malvadões corruptos dispõem a seu favor: o devido processo legal, uma conquista civilizatória própria das democracias liberais onde o réu tem a garantia de, ao ser processado, saber de antemão quais são as regras do jogo.

As garantias da imparcialidade do juiz e da presunção de inocência também alimentam a úlcera dos lavajatistas – exceto quando são os bancos que entram na reta da operação. Estes, a propósito, têm uma suíte presidencial, com direito ofurô e vista para o mar, no coração de cada procurador e procuradora da força tarefa, como mostraram as conversas divulgadas pelo El País e pelo The Intercept Brasil no último 23 de agosto.


As cabeludas mensagens da Vaza Jato serviram para desligar de vez os aparelhos do simulacro de republicanismo que, diferentemente do Itaú, Bradesco e Santander, jamais encontrou espaço nos corações de Moro e Dallagnol. A partir daí, qualquer um com um mínimo de honestidade intelectual se viu obrigado a abandonar de vez o referencial legal na hora de passar pano nas malandragens da dupla. Mesmo o argumento miliciano de que “os fins justificam os meios” passou a ser mais coerente e honesto, embora não menos grosseiro.

Nesta terça, 27 de agosto, as novas mensagens divulgadas demonstraram que a perversidade e o cinismo também compõem as afinidades entre a turma do Planalto e os delinquentes força tarefa. Nelas, os lavajatistas tratam com ironia e deboche a morte de Marisa Letícia, esposa do ex-presidente Lula, acusado de “mimimi” e de “vitimização”; fazem chacota de seu enterro; sugerem que Lula estaria feliz, pois poderia continuar a trai-la; atribuem o AVC que sofreu ao consumo de carne salgada e levantam a possibilidade do seu aneurisma ter sido planejado. Um show de horrores.

A maldade se estende também às mortes do irmão do ex-presidente, Vavá, e do seu neto, Arthur. Enquanto os procuradores politizam a questão, interpretando o pedido de Lula para comparecer ao velório do irmão como a intenção de um “safado” que “só queria passear”, procuram desesperadamente por obstáculos logísticos na expectativa de que seu direito de velar familiares seja desrespeitado. “Preparem para nova novela ida ao velório”, comenta certa procuradora após o trágico falecimento de Arthur, de apenas sete anos de idade.

A crueldade é permeada com a hipocrisia e a antipolítica que melhor caracterizam a operação. O procurador Roberson Pozzobon, que junto com Dallagnol procurou articular um esquema de laranjas com suas esposas para enriquecer com palestras, conclui que o pesar do ministro Gilmar Mendes com a morte de Arthur seria uma tentativa vã de humanizar Lula, acusado de agir como um - vejam vocês - político ao passo que uma colega procuradora é incrivelmente acusada de “partidária” por ter comparecido ao velório da “Ré Marisa Letícia”. Narciso, afinal, acha feio o que não é espelho.

O lavajatismo é uma doença. É tão vil, criminoso e incivilizado quanto o bolsonarismo em suas mais obscenas expressões, a exemplo das afirmações de Bolsonaro sobre Fernando Santa Cruz e seus declarados desejos de eliminar qualquer coisa que, discordando de seus terraplanismos, possa ser considerada de esquerda.

A ligação é orgânica, umbilical, inconfundível. Além de Moro, ao menos dezoito nomes da Lava Jato ocupam cargos no governo - incluindo a delegada Erika Mialik, responsável por conduzir um inquérito destrambelhado que, após desgraçar a vida de Luiz Carlos Cancelier, ex-reitor da UFSC, levou-o a tirar a própria vida.

“Eu hoje, como professor da UFSC, sou uma pessoa que tem orgulho e alegria. Como desembargador, tenho vergonha. (…) Porcos e homens se confundem, fascistas e democratas usam as mesmas togas. Eles estão de volta. Temos que pará-los. Vamos derrubá-los novamente”, disse Lédio Rosa de Andrade, professor e desembargador do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em discurso sobre o suicídio do seu colega e amigo.

A mistura de estupidez, fascismo e desumanidade que ceifou a vida de Cancelier é a mesma que, conjugada com um desavergonhado ódio à democracia, contribuiu para criar a atmosfera que possibilitou o encarceramento da maior liderança popular do continente. Foi ela também que ajudou a abreviar a vida de Dona Marisa.

Além da degeneração moral e da notória mediocridade intelectual, há no lavajatismo uma perversidade sádica que deságua na ausência de qualquer empatia e sensibilidade com quem elege como inimigos (não deveriam existir “inimigos” em processos judiciais, é bom lembrar), comportando-se à imagem e semelhança daquele que, segundo Carlos Fernando Santos Lima, ex-integrante da força tarefa, era o favorito da Lava Jato nas eleições de 2018. “Não quero a Lava Jato vista como perseguição ao PT e co-responsável pelas eleições”, desabafou a procuradora Jerusa Viecili em conversa publicada no final de junho. Foi Viecili que referiu à ida de Lula ao velório do neto como uma “novela”.

José Carlos Mariátegui, jornalista e escritor peruano, escreveu pequenas biografias sobre personalidades históricas compiladas no livro “Do sonho às coisas: retratos subversivos”. Ao tratar de Mussolini, Mariátegui define o fascismo não como uma seita programática e conscientemente reacionária, mas como um movimento organizado que se considerava revolucionário em seus propósitos de “limpar” a sociedade.

Rosa de Andrade já explicou: sobre os ombros de democratas e fascistas caem a mesmas vestes.

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31
Ago19

Uma onda de insanidade invadiu o país pós-Bolsonaro

Talis Andrade

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por Ribamar Fonseca

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Alguém precisa urgentemente apresentar um projeto de lei, ao Congresso Nacional, tornando obrigatório o exame de sanidade mental para candidatos a cargos eletivos, especialmente candidatos a prefeito, governador e presidente da República, e também candidatos ao serviço público, sobretudo no Judiciário e no Ministério Público. Se essa lei já existisse certamente não teríamos hoje um governador como Wilson Witzel e um presidente como Jair Bolsonaro, bem como juízes como Sergio Moro e procuradores como Deltan Dallagnol, Pozzobom, Laura Tessler e outros integrantes da Lava-Jato. A insanidade deles é gritante, pois uma pessoa normal, em seu juízo perfeito, jamais comemoraria ou debocharia da morte de um ser humano. O governador carioca, na tentativa de capitalizar o sucesso da operação policial que interrompeu o sequestro de um ônibus na ponte Rio-Niterói, comemorou, como se fora um gol, a morte do sequestrador, um jovem de 20 anos que não feriu ninguém, apenas “queria entrar para a história”, segundo depoimento de um passageiro do ônibus. William Augusto da Silva, conforme as notícias, usava uma arma de brinquedo e foi abatido por atiradores de elite. Witzel e Bolsonaro comemoraram a morte do rapaz, uma atitude insana condenada pela grande maioria dos brasileiros. Surpreendentemente, porém, eles não são os únicos. Ainda existe muita gente que também fica feliz com a morte de alguém, um comportamento que se tornou rotineiro sobretudo entre seguidores do capitão-presidente. Será que uma epidemia de loucura se alastrou no país após a eleição de Bolsonaro?

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Um exemplo de que a insanidade parece ter tomado conta de boa parte da população foi dado pela  blogueira Alessandra Strutzel, que comemorou a morte do neto de Lula, uma criança de apenas 7 anos de idade. Bolsonaro, aparentemente, liberou, com seu discurso de ódio, os piores instintos do ser humano e, lamentavelmente, muita gente de má índole, até então contida, deu vazão às suas taras. A violência explodiu, as agressões, sobretudo contra quem não rezava pela cartilha do capitão, se tornaram rotina, o feminicídio cresceu em todo o país e os ruralistas incrementaram as queimadas, especialmente na Amazônia, considerando-se liberados pelo Presidente, inclusive para ocupar as terras dos indígenas. E o país, já classificado de lixo pelo próprio Bolsonaro, conforme pronunciamento feito durante a campanha eleitoral, se transformou num grande hospício. Hoje fala-se em matar com a maior naturalidade, como se a vida não valesse nada, sob aplausos de quem se diz religioso e evoca o nome de Deus, cujo 5º mandamento determina: “Não matarás”. O ódio, disseminado pela mídia e redes sociais e potencializado pelo capitão-presidente, contaminou parte da população, principalmente  ocupantes de cargos públicos com poderes sobre a vida das pessoas, destruindo reputações e causando enormes estragos em todos os setores de atividades. E a insanidade passou a determinar o comportamento de quem se identificou com a nova ordem implantada por um homem despreparado para ocupar o mais alto cargo da Nação e que, deslumbrado com o poder, provavelmente imagina que seria bom  renunciar à nossa soberania em favor dos Estados Unidos, o seu país do coração. 

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No mesmo nível de insanidade estão os procuradores da Lava-Jato, à frente Deltan Dallagnol, que debocharam da morte da esposa, do irmão e do neto do ex-presidente Lula, conforme revelou o The Intercept ao divulgar os diálogos secretos dos membros da força-tarefa. Nem Freud talvez conseguisse explicar o  ódio que endureceu o coração desse pessoal. Não satisfeitos com a condenação e prisão de Lula, embora injustas porque sem provas, os integrantes da força-tarefa passaram a tripudiar sobre a sua dor, revelando uma crueldade sem precedentes na história do Ministério Público. Se pudessem eles já o teriam condenado à morte e provavelmente dariam gargalhadas histéricas quando a sentença fosse cumprida. Com mais de 70 anos de idade, o ex-presidente poderia então dizer o mesmo que disse Sócrates, que também tinha mais de 70 anos  quando condenado a beber cicuta por seus julgadores: “Se eles esperassem mais um pouco não precisariam carregar na consciência o peso da minha morte. A natureza se encarregaria de matar-me”. Todo mundo sabe que o ex-presidente foi condenado e preso como resultado de  uma verdadeira farsa, comandada pelo hoje ministro da Justiça Sergio Moro, apenas para impedi-lo de concorrer às eleições presidenciais e permitir a ascensão de Bolsonaro. Ainda assim, talvez por medo dos militares, o Supremo Tribunal Federal até hoje tem negado a sua liberdade.

O julgamento do habeas corpus de Lula e do pedido de suspeição do ex-juiz Sergio Moro vem sendo adiado seguidamente pelo presidente do Supremo, ministro Dias Tóffoli, para possivelmente agradar aos que desejam manter o líder petista na prisão mesmo conscientes da sua inocência. A sua defesa pediu agora a anulação da sua condenação, a exemplo da recente decisão que anulou a condenação de Bendine, ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobrás, mas considerando o comportamento acovardado da Corte, duramente criticada  até pelos procuradores da Lava-Jato conforme vem revelando o The Intercept, tem-se a impressão de que mais uma vez o pedido de Lula será  negado, assim como foi negada a absolvição sumária da sua esposa Marisa Letícia, mesmo depois de morta, do processo  dirigido pelo então juiz Sergio Moro. Com essa decisão o Supremo não se mostra  muito diferente  da força-tarefa, cujos integrantes  debocharam da morte da esposa do ex-presidente, do seu irmão e do seu neto, um comportamento que expõe, de maneira assustadora, a face cruel daqueles membros do Ministério Público. E ninguém toma qualquer providência para puni-los, como se as instâncias superiores aprovassem a atitude deles. Aliás, ao contrário do esperado, o corporativismo do Conselho Nacional do Ministério Público tem arquivado, sistematicamente, todas as ações contra o coordenador da força-tarefa, Deltan Dallagnol, que, apesar das denúncias do The Intercept, continua intocado. Não se cogita, sequer, de uma CPI para investigar as ilegalidades cometidas pela força-tarefa, que tanto mal fez ao país.   

Sabe-se hoje, graças ao The Intercept, que o  combate à corrupção não passou de  um biombo para esconder dos olhos da sociedade  os verdadeiros objetivos políticos da Lava-Jato. E virou o melhor  pretexto para facilitar a perseguição de adversários políticos, inclusive com ações ilegais que se caracterizaram como abusos de autoridade. Consciente disso, o Congresso aprovou a chamada “Lei Cancellier”, que prevê punição para os abusos e que está dependendo da sanção do presidente Bolsonaro para entrar em vigor. Com a aprovação dessa lei muita gente, entre magistrados, procuradores e policiais – especialmente a turma da Lava-Jato – entrou   em pânico, mobilizando-se em todo o país para pressionar o Presidente a vetá-la integralmente, certamente consciente dos riscos que correrão com a sua vigência, obviamente porque sabem o que fizeram e o fazem. Nem todos os membros dessas categorias, no entanto, temem essa lei, porque se comportam dentro dos limites da legalidade. O mesmo acontece com os homens que tratam bem as suas mulheres: nenhum deles tem medo da Lei Maria da Penha.     

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31
Ago19

Boulos quer saber quem paga a conta de Queiroz. Agora que ele foi encontrado, onde está o Adriano?

Talis Andrade

Acharam o Queiroz. E não foi a PF do Moro. A questão agora é quem paga sua estadia no Morumbi e suas consultas no Albert Einstein. Com a palavra, a família Bolsonaro. Guilherme Boulos, ex-candidato do Psol ao Planalto, no twitter

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VioMundoUm mistério de cerca de oito meses foi desfeito.

Fabrício Queiroz mora no bairro de classe média alta do Morumbi, em São Paulo.

De táxi, se desloca para tratamento de câncer no hospital Albert Einstein, em São Paulo.

A informação está na revista Veja que circula neste fim de semana.

Do ponto-de-vista legal, Queiroz não é oficialmente procurado.

Mas, para quem foi visto dançando em vídeo publicado nas redes sociais, o ex-assessor e amigo da família Bolsonaro conseguiu se manter um tempão longe dos holofotes.

Veja publicou uma foto de Queiroz tomando café dentro do hospital, sem identificar autoria da imagem.

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Ele não parece mal de saúde, mas segundo a publicação continua o tratamento — a cirurgia para retirar o tumor de intestino não teria resolvido totalmente o problema.

Queiroz alegou tratamento médico para jamais depor ao Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro.

A família Bolsonaro faz-de-conta agora que mal sabe quem é o assessor.

Até ontem, no entanto, Queiroz era tão amigo do hoje presidente da República que teria merecido de Jair Bolsonaro, então deputado federal, um empréstimo de 40 mil reais.

Parte do pagamento do suposto empréstimo Queiroz depositou na conta da hoje primeira dama Michelle Bolsonaro: R$ 24 mil.

No auge do escândalo, Queiroz foi ao SBT, emissora alinhada ao governo Bolsonaro, para dizer que ganhou muito dinheiro vendendo automóveis.

“Sou um cara de negócios, faço dinheiro”, afirmou.

Por escrito, ao MPE-RJ, Queiroz admitiu que fez dinheiro para o chefe, o então deputado estadual Flávio Bolsonaro, desviando parte do salário de assessores do parlamentar para turbinar o mandato.

Na versão de Queiroz, Flávio Bolsonaro nada sabia do esquema, nem se beneficiou pessoalmente.

Contada assim, a história não explica a evolução patrimonial do hoje senador, que avançou 397% em 12 anos ou 432% em quatro anos, de acordo com cálculos publicados pela revista Época e o UOL.

Segundo o MPE-RJ, as suspeitas sobre Flávio resultam do fato de que, entre 2010 e 2017, ele lucrou mais de R$ 3 milhões em transações imobiliárias. Ao todo, comprou 19 imóveis por cerca de R$ 9 milhões.

São dois fenômenos: Queiroz no ramo dos automóveis, Flávio no imobiliário.

Mas, o que o Queiroz tem a ver com isso?

O ex-assessor de Flávio Bolsonaro, que era íntimo da família, chamou a atenção do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) ao movimentar R$ 1,2 milhão — entradas e saída de dinheiro — em sua conta bancária.

Além disso, Queiroz fez saques em dinheiro de R$ 661 mil entre janeiro de 2016 e junho de 2018.

A suspeita é de que ele atuava como laranja financeiro da família Bolsonaro.

Para entender melhor o caso, a Justiça determinou a quebra de sigilo de 95 pessoas e empresas, inclusive de Flávio, da esposa dele, Fernanda, da empresa dos dois, a Bolsotini Chocolates e Café Ltda., de Fabrício Queiroz, suas filhas Evelyn e Nathalia e a ex-mulher Márcia.

As três trabalharam como assessoras em gabinetes da família Bolsonaro.

São suspeitas de terem sido funcionárias fantasmas.

Nathalia supostamente trabalhou dois anos no gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara Federal, em Brasília.

Teve atestada a presença de 40 horas semanais, para justificar o salário de cerca de R$ 10 mil mensais, mais benefícios.

Porém, no mesmo período, ela era personal trainer no Rio de Janeiro.

Queiroz é policial militar aposentado e, além de motorista, atuava como segurança dos Bolsonaro.

Segundo procuradores que levantaram a vida pregressa do PM, Queiroz tem no currículo ao menos dez “autos de resistência”, ou seja, matou dez pessoas em supostos confrontos.

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Por que Queiroz é suspeito de ligação com milicianos?

Segundo as explicações dadas por Flávio Bolsonaro, Queiroz tinha liberdade para agir no gabinete.

Contratava, cuidava dos arranjos com assessores.

Dentre os que serviram no gabinete de Flávio Bolsonaro estão Danielle Mendonça da Costa da Nóbrega e Raimunda Veras Magalhães.

São a esposa e a mãe de Adriano Magalhães da Nóbrega, ex-capitão do Batalhão de Operações Especiais da PM do Rio de Janeiro, o Bope.

Adriano está foragido. Ele é suspeito de ser um dos líderes da milícia que atua na Zona Oeste do Rio de Janeiro e teria envolvimento no assassinato da vereadora Marielle Franco.

Raimunda, a mãe de Adriano, aparece no mesmo relatório do Coaf que levantou suspeitas sobre Fabrício Queiroz.

De um salário líquido de R$ 5.124,62, Raimunda fez um depósito de R$ 4,6 mil na conta de Queiroz.

Tudo indica que a mãe e a esposa do miliciano foragido eram fantasmas do suspeito de ser laranja dos Bolsonaro.

Flávio hoje atribui tudo a Queiroz.

Mas Adriano, o miliciano foragido, foi homenageado duas vezes por Flávio lá atrás.

Numa moção de louvor, em 2003, Flávio escreveu que “o policial militar desenvolvia sua função com dedicação e brilhantismo, desempenhando com absoluta presteza e excepcional comportamento nas suas atividades”.

Na segunda homenagem, em 2005, Adriano recebeu a mais alta condecoração da Alerj, a Medalha Tiradentes.

Detalhe: Adriano estava preso, sob suspeita de homicídio. Ele chegou a ser condenado a 19 anos de prisão.

Quatro dias depois, em 27 de outubro de 2005, o então deputado federal Jair Bolsonaro fez discurso na Câmara em defesa de Adriano, dizendo que a condenação era injusta, fruto do depoimento de um superior que tinha desconsiderado o fato de Adriano ser um “brilhante oficial”.

Bolsonaro sugeriu que tinha assistido ao julgamento e chamou o réu de “coitado”.

Em trecho do discurso, criticou os governantes do Rio à época: “É importante saber a quem interessa a condenação pura e simples de militares da Polícia do Rio de Janeiro, sejam eles culpados ou não. Interessa ao casal Garotinho, porque a Anistia Internacional cobra a punição de policiais em nosso País, insistentemente. É preciso ter um número xis ou certo percentual de policiais presos. O Rio é o Estado que mais prende percentualmente policiais militares e, ao mesmo tempo, o que mais se posiciona ao lado dos direitos humanos”.

A condenação de Adriano seria revertida na segunda instância, mais tarde.

A contratação da esposa de Adriano, Danielle, para o gabinete de Flávio Bolsonaro foi em setembro de 2007. Ela serviu por mais de 11 anos.

Alguns meses antes, em fevereiro de 2007, Flávio fez seu famoso discurso defendendo as milícias.

Segundo ele, “a milícia nada mais é do que um conjunto de policiais, militares ou não, regidos por uma certa hierarquia e disciplina, buscando, sem dúvida, expurgar do seio da comunidade o que há de pior: os criminosos”.

A mãe de Adriano, Raimunda, foi contratada pela primeira vez para trabalhar na Alerj em março de 2015. Servia no gabinete da liderança do PP, partido ao qual Flávio era filiado.

Deixou o cargo em março de 2016, mas em junho voltou, desta vez no gabinete do próprio Flávio.

Adriano foi expulso da PM em 30 de dezembro de 2013, acusado de envolvimento numa guerra entre bicheiros.

Apesar disso, a mãe e a esposa dele continuaram “trabalhando” para Flávio Bolsonaro por quase cinco anos.

Danielle e Raimunda foram exoneradas em dia 13 de novembro de 2018.

Em janeiro de 2019, a polícia fez a operação que tentou prender Adriano. Ele conseguiu escapar, mas foi preso o major Ronald Paulo Alves Pereira.

Major Ronald ou Tartaruga, como é conhecido na Zona Oeste do Rio, é acusado de ser “chefe da milícia da Muzema e grileiro nas regiões de Vargem Grande e Vargem Pequena”, de acordo com o diário conservador carioca O Globo.

Ronald também foi homenageado por Flávio Bolsonaro na Alerj, com menção honrosa, em 2004.

O STF deve decidir até o final do ano se o inquérito contra Flávio e Queiroz continua ou será trancado pelo uso indevido do relatório do Coaf — é o que alega a defesa.

O presidente do STF, Dias Toffoli, concordou liminarmente.

Dentre as perguntas ainda a responder: Queiroz foi intermediário no repasse do dinheiro que esclarece o enriquecimento veloz de Flávio Bolsonaro? se sim, qual a origem dos valores, apenas o repasse do dinheiro público desviado de salários? houve relação financeira entre Queiroz e os milicianos Adriano e Ronald? Flávio, ao contratar parentes de milicianos, estava pagando alguma dívida anterior com os ex-PMs?

Em uma live no Facebook, ontem, o presidente Jair Bolsonaro prometeu indulto a policiais que, segundo ele, estão presos injustamente.

“Final do ano, espera aí. Aqueles indultos, eu vou escolher alguns caras, colegas, policiais que estão presos injustamente no Brasil. Presos por pressão da mídia. Até o final do ano vai ter policial neste indulto aqui”, declarou.

Independentemente disso, agora que sabemos onde anda Queiroz, é preciso perguntar: e o Adriano?

 

31
Ago19

Relações Obscenas na Vaza Jato

Talis Andrade

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Por Marcelo Ribeiro Uchôa

Portal No Leme 

 

As primeiras informações trazidas a lume pelo The Intercept Brasil confirmaram o que muitos juristas já denunciavam: que a operação Lava Jato sempre foi um arremedo judicial interessado especificamente em prender o ex-presidente Lula da Silva, custasse o que custasse em termos de malabarismos processuais. Lawfare praticado não apenas por um juiz, mas todo um corpo de procuradores da república, que não mediram esforços em confabular sobre estratégias de elaboração de teses de acusação, hipóteses probatórias, linhas de ação em audiências, até mesmo de datas de prática de atos formais, além de medidas de vazamento de informações. 

Não bastasse, as matérias publicadas endossaram que os meios de provas suscitados no processo do triplex para justificar o suposto crime de corrupção do ex-presidente, considerados esdrúxulos por um sem número de estudiosos do Direito, também eram considerados frágeis, para não dizer infundados, pelo principal procurador acusador. Em interminável ti-ti-ti confabulatório, procuradoras e procuradores da República expunham todo seu interesse punitivo motivado por razões político-ideológicas.

Mas, afinal, o que se pode questionar ou deduzir da atitude jornalística do The Intercept Brasil? Em primeiro lugar, não há como aferir, de modo categórico, a inocência do ex-presidente Lula da Silva pelas informações divulgadas, mas é possível pressupor que ele não estaria preso se não fossem as tramoias realizadas pelo sistema de justiça. Nem estaria preso, e, provavelmente, nem seria condenado, porque o próprio Ministério Público considerava sua principal prova da acusação, a suposta entrega do triplex, motivo insuficiente para justificar a vinculação do ex-presidente com o esquema de corrupção da Petrobras. Além disso, não confiava que tal apartamento havia sido efetivamente presenteado ao ex-presidente, menos ainda em suborno. Dessa maneira, o mínimo que lhe seria reconhecido seria o benefício da presunção de inocência até que eventual prova contrária irrefutável aferisse um improvável crime. 

Outro fato indiscutivelmente abstraído pelas informações divulgadas é que o ex-presidente jamais foi julgado por um juízo isento, imparcial, o que confere total validade aos recursos internos de sua defesa, bem como às alegações levadas ao conhecimento do Comitê de Direitos Humanos da ONU, de descumprimento do processo legal brasileiro e, por consequência, do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos concluído pelo Brasil. Ou seja, para todos os efeitos, o julgamento e o eventual encarceramento do ex-presidente foram totalmente nulos, devendo ser desfeitos de imediato, nem que seja para submeter-lhe a novo processo adequadamente instaurado.

Outra conclusão importante é que houve uma deliberada intenção não apenas de prender o ex-presidente, como de evitar sua nomeação como ministro da Casa Civil do governo da ex-presidenta Dilma Rousseff, sendo de ampla consciência dos atores do sistema judiciário que o vazamento dos áudios grampeados da ex-presidenta, sem autorização do Supremo Tribunal Federal, sob amparo em suposto interesse público, devia ser realizado e repassado à grande mídia, a fim de obter comoção social que evitasse a nomeação ministerial e desidratasse, ainda mais, o mandato da presidenta, em vias de questionável processo de impeachment. Na mesma toada, houve uma deliberada maquinação para impedir que o ex-presidente Lula da Silva concorresse à presidência da república, tanto existindo temor real acerca de uma provável vitória eleitoral petista, que a estratégia de manipulação também se repetiu para evitar que, já preso, concedesse entrevista jornalística, a qual se imaginava pudesse favorecer o candidato Fernando Haddad.

Afinal, foi correta a ação do The Intercept Brasil de disponibilizar para o grande público conteúdo sobre textos e áudios de juiz federal e procuradores da república sem o respectivo consentimento dos autores? Essa questão é nodal no presente debate, porque sempre foi comezinha no Direito a compreensão de que provas assim devem ser autorizadas judicialmente sob pena de nulidade, devendo ser evitadas. Contudo, foram as próprias vítimas do atual vazamento que justificaram a legitimidade deste tipo de ação, quando aplicaram a estratégia contra uma presidenta da República sem a devida autorização da Corte Suprema, amparando-se no interesse geral.

Enfim, para todos os efeitos, considerando-se a possibilidade de um revés judicial interno acerca da exposição do material divulgado, os jornalistas do The Intercept Brasil, de antemão, anunciaram que todo conteúdo probatório já estava em poder de jornalistas estrangeiros, de modo que os fatos ora narrados continuarão vivos para conhecimento da humanidade, a fim de que doravante ninguém duvide de que no país houve um julgamento de exceção em que investigadores, acusadores e juízes transformaram-se em uma só pessoa, não motivada em encerrar a corrupção no país, mas em impedir que um partido, uma mulher e um homem, pudessem continuar realizando suas obras de prover o social em favor da maioria excluída, naturalmente, em detrimento de uma minoria aristocrática, acuada pelo crescimento social do grupo oposto. 

A Lava Jato não atentou apenas contra a liberdade do ex-presidente Lula, mas contra a democracia brasileira, na medida em que turbinou propositadamente o impeachment da ex-presidenta Dilma e impediu que as eleições presidenciais de 2018 chegassem a um resultado diferente do alcançado. O que talvez não estivesse no script do conluio é que seus desdobramentos práticos acabariam, ao criminalizar a política, por enterrar a economia nacional e entregar o poder ao retrocesso civilizatório. Mas se isso não pode ser terminantemente afirmado, por outro lado, um fato concreto que não pode ser negado é que o principal juiz-protagonista de todo tumulto social-institucional causado converteu-se em ministro da Justiça do novo governo, o qual dificilmente teria alcançado o poder caso o próprio juiz houvesse se retraído às funções constitucionais para as quais recebeu sua toga. 

Finalmente, para os que duvidam da idoneidade do The Intercept Brasil, não custa lembrar que seu editor-chefe, Glenn Greenwald é um dos mais importantes jornalistas do mundo, já havendo sido laureado, à época em que contribuía com o The Guardian, com um Prêmio Pulitzer, por haver trazido à tona todo enredo por trás de Edward Snowden, o imoral programa de monitoramento global de informações (espionagem virtual) dos Estados Unidos.

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Sobrinha do Tio Sam? - A revelações exibidas pelo The Intercept Brasil já abriram capítulo especial na história nacional, tanto pela gravidade das informações que vêm trazendo à lume, como pela hesitação dos implicados em confrontá-las: ora contestando a existência de diálogos, ora denunciando distorções em textos, ora negando participação na trama, mas em todas as situações veementemente atacando o veículo informativo, ao ponto de se socorrer de um suposto esdrúxulo expediente de intimidação sobre as operações financeiras do jornal e dos jornalistas responsáveis, via articulação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) e da Polícia Federal, esta última subordinada ao Ministro da Justiça, personagem mais que comprometido nos diálogos, em reação extrema de censura à atividade de imprensa jamais vista desde a retomada do processo democrático brasileiro nos anos 1980.

À medida que o tempo passa, porém, a sociedade mais se convence da veracidade dos diálogos divulgados. Por um lado, pela insistência dos envolvidos em não facilitarem o trabalho das perícias entregando-lhes os celulares com os áudios questionados ou endossando-lhes acesso às contas da rede social Telegram (em que se deram as conversas). Por outro lado, pela inferência objetiva de que uma simples confrontação dos diálogos revelados pelo The Intercept Brasil com os pormenores processuais da Lava Jato casa perfeitamente com o curso e o desfecho dos processos, de modo que indubitavelmente se fortalece a presunção de que as tramoias trazidas à baila são verdadeiras, não o contrário.

As narrativas expostas no site do vencedor do Pulitzer Glenn Greenwald expõem um conluio umbilicalmente consolidado entre o juiz Sérgio Moro e o procurador Deltan Dallagnol, mostrando um consórcio pernicioso atentatório a um verdadeiro Estado democrático de Direito, na forma de condenável promiscuidade entre Judiciário e Ministério Público. Porém, sem reduzir a importância de nenhuma publicidade até então trazida ao conhecimento, sobretudo a injusta e indubitavelmente imoral prisão do ex-presidente Lula da Silva, é de chamar atenção a última revelação exposta, que faz alusão a uma possível trama interessada em vazar informações processuais supostamente para a oposição venezuelana, com vistas a buscar desestabilizar o governo do presidente Nicolás Maduro.

Havendo veracidade na informação (e tudo leva a crer que há, porque os principais envolvidos nas denúncias arranjam mil e um motivos para não colaborar com a elucidação definitiva das assertivas), duas conclusões podem ser imediatamente abstraídas: a primeira, é que a operação Lava Jato sempre teve total consciência sobre seu poder de servir como mecanismo de desestabilização política de uma nação. Portanto, nada de defender que era uma operação judicial normal, que visava apenas acabar com um episódio isolado de corrupção. O intuito da operação no Brasil sempre foi retirar o Partido dos Trabalhadores do poder nem que, para isso, fosse necessário sabotar o Direito e a estabilidade política do país, arruinar a economia nacional e abrir caminho para a entrega do governo às forças mais reacionárias existentes; a segunda conclusão é que a operação Lava Jato buscou agir em consórcio com forças conservadoras não só nacionais, mas internacionais também no exterior. Sabe-se, por ora, que na Venezuela a iniciativa foi pensada, porém provavelmente frustrada em seu objetivo principal. No que toca ao Peru, porém, o próprio atual Ministro da Justiça brasileiro, outrora juiz todo-poderoso da operação (juiz-investigador-acusador), por ocasião da recente final da Copa América entre as seleções brasileira e peruana, gabou-se em rede social da operação haver logrado êxito. Ou seja, também na nação andina a operação Lava Jato estendeu seus tentáculos prometendo evitar uma suposta sangria de cofres públicos, megaoperação transcontinental que precisa ser investigada com rigor, porque não só Brasil, Peru e Venezuela, mas também Argentina, Bolívia, Chile, Equador e Paraguai, e até mesmo Colômbia e Uruguai, como se sabe, vivem dias de insegurança institucional, com presença de um judiciário cada vez mais ostensivo no papel de criminalizador da política e de suposto guardião moral das sociedades, o que não espantaria se isso derivasse da presença física da Lava Jato ou de suas ramificações e repercussões.

Independentemente, um fato concreto é que a notícia de uma tentativa da operação curitibana em auxiliar num possível desmonte venezuelano trazem à tona debate mais antigo, pouco levado a sério (embora inúmeras vezes alertado pela imprensa não tradicional), sobre as constantes idas e vindas dos protagonistas da operação Lava Jato aos Estados Unidos para infindáveis cursos e reuniões no Departamento de Estado norte-americano. Após a recente denúncia da Venezuela faz todo sentido não apenas suspeitar, mas correlacionar a ligação aproximada das autoridades de justiça do Brasil e as homólogas no país do Norte como algo bem maior que rotineiras cooperações judiciais. Ao contrário, algo possivelmente programado e tencionado para fins previamente determinados, como, por exemplo, servir ao governo dos EUA dentro do Brasil, na América do Sul, com possibilidades de chegar em outros países da América Latina, Caribe, África e até Europa, como, por exemplo, Portugal, onde até um ex-premiê já foi preso em ação de questionável idoneidade. 

A propósito, para os norte-americanos a Lava Jato brasileira já possui relevância. Por aqui, mais do que alijar o PT do poder, a operação abriu caminho para a venda de estatais e a exploração de recursos nacionais, até mesmo compartilhamento de base e tecnologia espacial estratégica, acolhendo de vez o imperialismo yankee como algo comum à rotina brasileira. A situação, se consumada em outras nações, dificilmente repercutiria de modo diferente. O que resta saber é se seria a Lava Jato, de fato, um instrumento geopolítico do Tio Sam, uma operação transnacional orquestrada, instruída e monitorada pelo Departamento de Estado dos EUA? Uma versão mais ampla, sútil e moderna da Operação Condor, com asas de maior envergadura? Para tristeza e desencanto geral não há razão nenhuma para descartar-se, de antemão, qualquer hipótese especulativa, pois a história das nações trata de demonstrar que conspirações assim são factíveis e menos raras de acontecer que qualquer mente privilegiada possa mensurar. Que venha o The Intercept Brasil com mais revelações. 

    

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31
Ago19

“No Brasil a tortura não acabou”

Talis Andrade
 

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RFI - O psiquiatra Carlos Parada trabalha em várias frentes: crianças carentes, drogas e tortura. Diplomado em medicina pela Unifesp, fez residência em psiquiatria em Paris, onde mora desde 1987. Mas apesar de radicado na França, seu campo de ação sempre inclui o Brasil.

Depois de dirigir durante dez anos um centro de consultas ambulatórias para crianças em Paris, o dr. Parada é hoje psiquiatra responsável de um hospital-dia para crianças com distúrbios mentais graves na região parisiense.

Paralelamente, ele participa em São Paulo no Projeto Quixote, criado com cooperação francesa há quase 20 anos. A estrutura acolhe crianças em situação de rua (parcial ou completamente), onde cuidados médicos e assistência social se mesclam. “Sem a visão repressiva que existia no Brasil, quando se cortava o cabelo de uma criança, que era colocada na Febem, para limpar as ruas”, diz.

 

Tocar o cérebro e mudar o espírito

Em 2016, Carlos Parada lançou o livro “Toucher le cerveau, changer l’esprit”, que descreve como a tecnologia tentou alterar diretamente o espírito. “Ele conta a história da psicocirurgia a partir da lobotomia, criada por um português, Egas Moniz, que ganhou o prêmio Nobel em 1949, e depois como surgem os remédios psicotrópicos e como isso mudou a visão que temos da doença mental e do próprio sujeito”, explica.

Parada conta que a prática da lobotomia foi ampla no Brasil, onde as “moderações econômicas, éticas e sociais são mais indulgentes do que na França. “Lévy-Strauss já dizia que o Brasil tinha passado da barbárie à decadência sem passar pela civilização. Ou seja, um capitalismo sem transcendência. O Brasil foi então um grande praticante da lobotomia desde o início, com casos inclusive de o irmão de um esquizofrênico passar pelo procedimento por medida de prevenção“, relata.

A lobotomia caiu totalmente em desuso, mas Parada diz que a psicocirurgia deve voltar com os avanços da neurociência, como já se vê na China, México ou Estados Unidos. “Aqui na França as pesquisas são muito cuidadosas, mas como é que essas técnicas serão usadas no Brasil, onde quem paga leva? ”, indaga o médico.

“Hoje o Brasil é um grande consumidor de psicotrópicos. Um tema como a ritalina que é um medicamento muito usado para crianças com distúrbios de comportamento no Brasil é quase uma moda”, explica.

 

Tortura não acabou no Brasil

Carlos Parada também trabalhou no Centro Primo Levi, de Paris, para refugiados e vítimas de violência política e tortura. Para ele, a tortura cria uma fratura social, de medo e desconfiança entre as pessoas.

“A primeira consequência da tortura é na sociedade. Atendi torturados do mundo inteiro. Vi poucas, quase nenhuma pessoa torturada por causa de uma informação. Vi pessoas sendo torturadas durante um, dois meses, um, dois anos. Isso não é para obter informação, é para semear o horror. É para criar o medo e dar vazão à perversão de uns e de outros. E para mostrar à sociedade quem é que manda”, conta.

Carlos Parada acrescenta: “as pessoas que pensam que seria bom a volta de um regime que se dá o direito da tortura, como diz o atual presidente, elas se esquecem que elas próprias vão estar dentro de um regime de medo. No Brasil, a tortura não acabou. Acabou a tortura política. A tortura de classe, a que maltrata pobres e esfarrapados, é permitida e largamente praticada”.

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31
Ago19

Abjetos humanos

Talis Andrade

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por Mauro Nadvorny

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Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde) o percentual de psicopatas na população gira entre 3,5% e 4,0%. Em um universo de 100 pessoas, podemos ter algo em torno de 4 psicopatas. Não necessariamente todos ligados aqueles casos mais extremos que combinam esta falta de empatia com outros distúrbios comportamentais que os levam a cometerem crimes de extrema violência.

 

Existem milhares de membros no MPF. Muito difícil crer que os membros da Lava Jato tenham sido escolhidos de acordo com o grau de psicopatia. Não foram diagnosticados assim para fazerem parte do que se acreditava ser um grupo de idealistas lutando contra a corrupção. 

Em se tratando, pelo menos em sua maioria, de pessoas normais, o que deu errado? Em que momento perderam sua humanidade ao ponto de debocharem de indivíduos mortos, inocentes que nada tinham a ver com atos de corrupção, entre eles um menino de 7 anos? 

Dizem que para julgar o caráter de uma pessoa, basta dar a ela poder. Como colocar um uniforme de policial ou receber um cargo de mando. Se ela continuar sendo aquilo pelo qual chegou lá, trata-se de uma pessoa de bom caráter. Caso contrário, ela soube nos enganar muito bem.

Quando me refiro a caráter tenho em mente a índole. Aquele processo construído ao longo da nossa infância e juventude que molda a pessoa que somos. O que não depende diretamente da situação socioeconômica, do lugar onde nascemos ou de motivações religiosas. Aquilo que nos faz aprender o que é certo e errado quase que instintivamente. Que ainda pode ser corrigido.

Estes promotores da Lava Jato podem ser chamados de qualquer coisa, mas o que mais os define é a falta de caráter, sua má índole. Eles não apenas causaram um estrago na economia do país levando milhares de brasileiros ao desemprego, usaram de artimanhas nada recomendáveis para atingirem seus objetivos, como perseguiram um ex-presidente de forma cruel e fora da lei.

Alguns deles chegaram aos cargos que ocupam por influência de parentes. Todos são os típicos brancos, bons cristãos e membros da elite. Não me parecem que tenham sido os mais populares nos seus bancos escolares. Também não fazem o tipo de esportistas. São aqueles, não fosse a fama, nos lembramos sua existência na nossa juventude, mas nos falham os nomes.

Esta gente se auto investiu de um poder que jamais lhes foi outorgado. Se acharam acima do bem e do mal e como numa cruzada contra os infiéis, se lançaram em uma guerra contra a corrupção no Brasil. Não contra todos os corruptos, somente aqueles que ideologicamente lhes convinha. Para isso tiveram um grande aliado, o então juiz Sergio Moro. E assim de mãos dadas, respaldados pelo Grupo Globo e a maioria dos veículos da mídia nacional, juntamente com a complacência do STF, fizeram o que bem entenderam se colocando acima da lei.

Todos os avanços de sinal vermelho foram amplamente apontados. A divulgação ilegal dos áudios do Presidente Lula com a Presidenta Dilma teve ampla divulgação. A condução coercitiva do Presidente Lula e de outros acusados foi matéria nacional. O julgamento recorde no TRF-4 sem o mínimo tempo hábil de leitura do processo pelos juízes e os votos combinados receberam ampla divulgação. A condenação sem provas foi minimizada e comemorada. Viva os heróis da Lava Jato foram as manchetes da mídia escrita e televisiva.

 

Tudo o que a mídia nacional escondeu ou pouco divulgou como sendo no mínimo impróprio, um site chamado The Intercept, que tem como um de seus fundadores o renomado jornalista Glenn Greenwald, desnudou. Um imenso arquivo contendo as trocas de mensagens entre os procuradores, entre eles e Moro, incluindo áudios, começou a ser esmiuçado por eles e outras mídias. E foi aí que ficamos sabendo que aqueles idealistas realmente não passavam de agentes públicos inescrupulosos. Todos aqueles sinais menosprezados anteriormente passaram a fazer sentido. Eram Tigres de Papel.

A cada divulgação de trocas de mensagens, fomos sendo informados como a justiça pode ser manipulada, e como eles a manipularam de acordo com os seus interesses. Regras básicas de equidistância do juiz para com a defesa e a acusação foram flagrantemente desrespeitados sem o menor pudor, sempre em favor da acusação. E foram ao ponto de o juiz oferecer testemunha para ela.

Trabalharam para impedir o Presidente Lula de dar entrevistas antes da eleição, fingiram investigar FHC, deram palestras para obterem lucros pessoais, pressionaram ministros do STF inclusive se utilizando de grupos de direita para isso, acobertaram um dos seus que pagou por outdoor ilegal e vazaram informações para a imprensa de acordo com os seus interesses quando lhes convinha. Estas são algumas das insensatezes conhecidas até agora que em uma democracia normal já seria motivo de prisão com a nulidade de todos os processos nos quais tiveram envolvimento. Numa democracia normal.

Tudo o que já sabemos até aqui é manifestadamente execrável, mas nada se compara com os comentários jocosos que fizeram contra o Presidente Lula quando das perdas da sua esposa, de seu irmão e de seu neto. Para isso não existem palavras fáceis. Abjetos humanos é pouco para defini-los. A maneira como se referiram aos falecidos é impublicável, mas o fizeram no que acreditavam ser um ambiente favorável e inacessível ao público que deveriam servir de exemplo de idoneidade ética e moral.

Os diálogos que nos foram apresentados atestam inequivocamente que não estavam trabalhando de acordo com o profissionalismo esperado de um agente público. Estavam isto sim, sendo o que de mais baixo existe na humanidade, seres desprezíveis que desceram ao esgoto da sociedade e lá permaneceram para se lambuzarem com a desumanização de seus semelhantes que sequer conheciam, cujo único crime seria o parentesco com aquele que metódica e doentiamente atacaram sem piedade.

Esta gente merece o desprezo de qualquer ser humano. Suas desculpas são como lágrimas de crocodilo. Nada vai apagar a falta de bom senso e total desprezo pelo sofrimento das perdas do Presidente Lula. Erraram uma vez com a morte de sua esposa. Outra vez com a morte de seu irmão e uma terceira com a morte de seu neto. Não tem perdão. Como bons cristãos que são, penitenciem-se até o fim dos seus dias. 

30
Ago19

Lawfare, o uso do sistema como arma de guerra política e econômica

Talis Andrade

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por Cristiano Zanin e

Valeska Martins

in Alai

Em 10 de outubro de 2016, na condição de advogados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apresentamos durante entrevista jornalística o conceito de lawfare para designar o uso perverso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política, com táticas e características específicas. O fato está retratado em reportagem intitulada “Defesa de Lula diz que Lava Jato usa leis como ‘arma de guerra’ para desmoralizar o inimigo”, do jornal O Estado de S. Paulo. Buscamos, naquele momento, com base em amplo estudo científico, mostrar a realidade de Lula diante da atuação de uma parte do Sistema de Justiça brasileiro. Desde então, muito se tem escrito e falado em referência ao termo “lawfare”.

Verificamos, porém, que nem todas essas referências ao lawfare estão corretas à luz dos critérios científicos que nortearam a proposta que fizemos sobre o conceito naquela oportunidade ou com a leitura atual que fazemos sobre o fenômeno. Muitas vezes, o termo tem sido utilizado como sinônimo de judicialização da política, fenômeno que, embora real, não se confunde com o lawfare.

O termo “lawfare” provém da junção de duas palavras da língua inglesa com elevada força retórica: law (direito) e warfare (guerra). Antes de retomar o real significado de “lawfare”, de acordo com a nossa percepção, é preciso recorrer a um breve histórico. Em 2001, o major-general Charles J. Dunlap Jr. usou pela primeira vez o termo “lawfare” em texto escrito para a Kennedy School de Harvard, no qual fez uma reflexão sobre formas de “conflitos modernos”, os quais se utilizam da aplicação ou da má aplicação das leis em substituição ao campo físico de batalhas.

Sob a perspicaz ótica daquele autor, a lei pode ser vista como uma arma e, da mesma forma, pode ser utilizada para o bem e para o mal. Diz ele: “O direito é muito parecido com uma ferramenta ou arma que pode ser usada adequadamente de acordo com as virtudes mais altas do Estado de Direito – ou não. Tudo depende de quem a está empunhando”.

John e Jean Comaroff, antropólogos jurídicos da Universidade Harvard, publicaram relevantes reflexões sobre a prática do lawfare para propósitos militares, políticos e empresariais. As publicações desses professores foram muito inspiradoras para desenvolvermos e apresentarmos um conceito de lawfare levando em consideração situações que estão ocorrendo no Brasil e em diversos lugares do mundo, não apenas no âmbito político, mas também no âmbito geopolítico e empresarial. Qualquer indivíduo ou entidade pode ser alvo do uso indevido da lei para fins ilegítimos.
 
Assim como na guerra, o lawfare atua em dimensões. Das diversas dimensões da guerra, três podem ser facilmente relacionadas ao lawfare: a geografia, o armamento e as externalidades. Analisaremos, brevemente, cada uma delas.
 

Na guerra convencional, os acampamentos e campos de batalha são cuidadosamente escolhidos diante das vantagens ou desvantagens geográficas para se lutar contra o inimigo. Exércitos fazem uso estratégico da cartografia, da paisagem, da geografia. A importância da escolha geográfica é, portanto, decisiva para alcançar êxito numa guerra, ou, nas palavras do clássico Sun Tzu, “um prenúncio de vitória”. No lawfare, essa lógica se aplica na escolha do juiz ou dos tribunais mais propensos a aceitar a tese jurídica utilizada por seus praticantes.

A mídia é um meio potente para criar um ambiente propício para a aceitação e legitimação da perseguição jurídica

A segunda dimensão da guerra refere-se à arma com a qual se trava o combate – ao armamento que será mais eficaz para enfrentar determinado inimigo. No lawfare, esse armamento é representado pela escolha da lei ou das leis para atingir o alvo – com a retirada de seu patrimônio, de sua reputação ou até de sua liberdade. Não necessariamente, a lei usada é nacional. Uma realidade no Brasil, por exemplo, é a aplicação, em diversos casos, do “Foreign Corrupt Practices Act” (FCPA), uma lei norte-americana utilizada para ampliar o poder dos Estados Unidos de punir e de arrecadar valores.

A terceira dimensão tanto da guerra quanto do lawfare diz respeito às externalidades, ou seja, ao ambiente que é criado para se usar as armas legais contra o inimigo escolhido. A mídia é um meio potente para criar um ambiente propício para a aceitação e legitimação da perseguição jurídica inerente ao lawfare. Ela estimula o clima da presunção de culpabilidade do inimigo eleito.

As externalidades no lawfare, nessa perspectiva, também estão intrinsecamente ligadas ao fenômeno conhecido como “guerra da informação”, que consiste no tratamento estratégico de dados com o objetivo de obter uma vantagem competitiva sobre o adversário.

Em regra, o lawfare é praticado por aqueles que detêm o poder do Estado, aqueles que podem definir o “lícito” e o “ilícito”. Mas não se pode descartar também que agentes privados que detêm poder, político e econômico, possam adotá-lo. A triste realidade atual do Brasil é o resultado de uma intensa prática de lawfare.

 
30
Ago19

Brasil vive um clima de pré-nazismo enquanto a oposição emudece

Talis Andrade

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O silêncio dos que deveriam defender a democracia pode acabar deixando o caminho aberto aos autoritários Moro, Witzel, Doria, que se sentem ainda mais fortes diante de tais silêncios

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O Brasil está vivendo, segundo analistas nacionais e internacionais, um clima político de pré-nazismo, enquanto a oposição progressista e democrática brasileira parece muda. Somente nos últimos 30 dias, de acordo com reportagem do jornal O Globo, o presidente Jair Bolsonaro proferiu 58 insultos dirigidos a 55 alvos diferentes da sociedade, dos políticos e partidos, das instituições, da imprensa e da cultura.

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E à oposição ensimesmada, que pensa que o melhor é deixar que o presidente extremista se desgaste por si mesmo, ele acaba de lhes responder que “quem manda no Brasil” é ele e, mais do que se desfazer, cresce cada dia mais e nem os militares parecem capazes de parar seus desacatos às instituições.

Há quem acredite que o Brasil vive um clima de pré-fascismo, mas os historiadores dos movimentos autoritários preferem analisá-lo à luz do nazismo de Hitler. Lembram que o fascismo se apresentou no começo como um movimento para modernizar uma Itália empobrecida e fechada ao mundo. De modo que uma figura como Marinetti, autor do movimento futurista, acabou se transformando em um fervoroso seguidor de Mussolini que terminou por arrastar seu país à guerra.

nazismo foi outra coisa. Foi um movimento de purga para tornar a Alemanha uma raça pura. Assim sobraram todos os diferentes, estrangeiros e indesejados, começando pelos judeus e os portadores de defeitos físicos que prejudicavam a raça. De modo que o nazismo se associa ao lúgubre vocábulo “deportação”, que evoca os trens do horror de homens, mulheres e crianças amontoados como animais a caminho dos campos de extermínio.

Talvez a lúgubre recordação de minha visita em junho de 1979 ao campo de concentração de Auschwitz com o papa João Paulo II tenha me feito ler com terror a palavra “deportação” usada em um decreto do ministro da Justiça de Bolsonaro, o ex-juiz Sérgio Moro, em que ele defenda que sejam “deportados” do Brasil os estrangeiros considerados perigosos.

 

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Bolsonaro, em seus poucos meses de Governo, já deixou claro que em sua política de extrema direita, autoritária e com contornos nazistas, cabem somente os que se submetem às suas ordens. Todos os outros atrapalham. Para ele, por exemplo, todos os tachados de esquerda seriam os novos judeus que deveriam ser exterminados, começando por retirá-los dos postos que ocupam na administração pública. Seu guru intelectual, Olavo de Carvalho, chegou a dizer que durante a ditadura 30.000 comunistas deveriam ter sido mortos e o presidente não teve uma palavra de repulsa. Ele mesmo já disse durante a campanha eleitoral que com ele as pessoas de esquerda deveriam se exilar ou acabariam na cadeia.

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Inimigo dos defensores dos direitos humanos, dos quais o governador do Rio, Witzel, no mais puro espírito bolsonarista, chegou a afirmar que são os culpados pelas mortes violentas nas favelas, Bolsonaro mal suporta os diferentes como os indígenas, os homossexuais, os pacíficos que ousam lhe criticar. Odeia todos aqueles que não pensam como ele e, ao estilo dos melhores ditadores, é inimigo declarado da imprensa e da informação livre.

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Sem dúvida, o Presidente tem o direito de dizer que foi escolhido nas urnas com 53% dos votos, que significaram 57 milhões de eleitores. Nesse sentido o problema não é seu. Os que votaram nele sabiam o que pensava, ainda que talvez considerassem seus desatinos de campanha como inócuos e puramente eleitoreiros. O problema, agora que se sabe a que ele veio, e que se permite insultar impunemente gregos e troianos começando pelas instituições bases da democracia, mais do que seu, é da oposição.

Essa oposição, que está muda e parece impotente e distraída, demonstra esquecer a lição da história. Em todos os movimentos autoritários do passado moderno, os grandes sacerdotes da violência começaram sendo vistos como algo inócuo. Como simples fanfarrões que ficariam somente nas palavras. Não foi assim e diante da indiferença, quando não da cumplicidade da oposição, acabaram criando holocaustos e milhões de mortos, de uma e outra vertente ideológica.

Somente os valores democráticos, a liberdade de expressão, o respeito às minorias e aos diferentes, principalmente dos mais frágeis, sempre salvaram o mundo das novas barbáries. De modo que o silêncio dos que deveriam defender a democracia pode acabar deixando o caminho aberto aos autoritários, que se sentem ainda mais fortes diante de tais silêncios.

Nunca existiram democracias sólidas, capazes de fazer frente aos arroubos autoritários, sem uma oposição igualmente séria e forte, que detenha na raiz as tentações autoritárias. Há países nos quais assim que se cria um governo oficial, imediatamente a oposição cria um governo fictício paralelo, com os mesmos ministros, encarregados de vigiar e controlar que os novos governantes sejam fieis ao que prometeram em suas campanhas e, principalmente, que não se desviem dos valores democráticos. Sem oposição, até os melhores governos acabarão prevaricando. E o grande erro das oposições, como vimos outras vezes também no Brasil, foi esperar que um presidente que começa a prevaricar e se corromper se enfraqueça sozinho. Ocorrerá o contrário. Crescerá em seu autoritarismo e quando a oposição adormecida perceber, estará derrotada e encurralada.

Nunca em muitos anos a imagem do Brasil no mundo esteve tão deteriorada e causando tantas preocupações como com essa presidência de extrema direita que parece um vendaval que está levando pelos ares as melhores essências de um povo que sempre foi amado e respeitado fora de suas fronteiras. Hoje no exterior não existe somente apreensão sobre o destino desse continente brasileiro, há também um medo real de que possa entrar em um túnel antidemocrático e de caça às bruxas que pode condicionar gravemente seu futuro. E já se fala de possíveis sanções ao Brasil por parte da Europa, em relação ao anunciado ataque ao santuário da Amazônia.

O Brasil foi forjado e misturado com o sangue de meio mundo que o fizeram mais rico e livre. Querer ressuscitar das tumbas as essências de morte do nazismo e fascismo, com a vã tentativa da busca da essência e pureza da brasilidade é uma tarefa inútil. Seria a busca de uma pureza que jamais poderá existir em um país tão rico em sua multiplicidade étnica, cultural e religiosa. Seria, além de uma quimera, um crime.

Urge que a oposição democrática e progressista brasileira desperte para colocar um freio nessa loucura que estamos vivendo e que os psicanalistas confirmam que está criando tantas vítimas de depressão ao sentirem-se esmagadas por um clima de medo e de quebra de valores que a nova força política realiza impunemente. Que a oposição se enrole em suas pequenezas partidárias e lute para ver quem vai liderar a oposição em um momento tão grave, além de mesquinho e perigoso é pueril e provinciano.

Há momentos na história de um país em que se os que deveriam defender os princípios da liberdade e da igualdade cruzam os braços diante da chegada da tirania, incapazes até de denunciá-la, amanhã pode ser tarde demais. E então de nada servirá chorar diante dos túmulos dos inocentes.

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29
Ago19

"Tudo que está acontecendo aqui com a Lava Jato tem o dedo dos americanos" - entrevista de Lula à TVE Bahia (vídeo)

Talis Andrade

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Nas pouco mais de duas horas de conversa com o jornalista Bob Fernandes, transmitida nesta sexta-feira (16) pela TVE Bahia, mais uma vez Lula não poupou o verbo para falar sobre política externa, perseguição política, Sérgio Moro, desmonte na educação, ataques à soberania nacional e, claro, Jair Bolsonaro.

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Perseguição política

Eu me sinto numa encruzilhada diante de tanta mentira que já foi contada. Eu tenho dito que não preciso de favor. Eu preciso de justiça. Eu preciso que leiam as acusações e as provas para poderem me absolver. Se você voltar ao passado verá que eu disse ao Moro: “Você está condenado a me condenar”.

Eu estou aguardando que a Suprema Corte retome a direção do poder judiciário deste país e faça justiça. Eles estão mentindo a meu respeito desde o começo. Há quatro pessoas que sabem que eles estão mentindo. Primeiro, Deus. Segundo, eu. Terceiro, o Dallagnol. Quarto é o Moro que sabe que mentiu na sentença.

Eu tenho desafiado quem quer que seja neste país a provar que tem um real na minha vida que não seja resultado do meu trabalho.

 

Participação dos EUA

Tudo que está acontecendo aqui com a Lava Jato tem o dedo dos americanos. O departamento de Justiça dos EUA manda mais no Moro do que a mulher dele.

Essa gente não pode fazer com o Brasil o que estão fazendo. Porque Lula está aqui, mas tem milhões aí fora passando fome, desempregado. “Ah, mas nós recuperamos não sei quantos milhões”. Eu quero saber quantos bilhões vocês tiraram da boca dos brasileiros que perdeu o emprego na indústria naval, na construção civil…é isto que tem que explicar à sociedade.

O que estão fazendo com o Brasil é um processo de destruição em todos os níveis, moral, ética, ou seja, estão jogando fora tudo o que o Brasil construiu. Eles estão destruindo aquilo que dá caráter a uma nação, que é o seu conhecimento, seu investimento em universidade, em ciências, em suas fronteiras, em suas riquezas minerais e o seu povo. O que mede a qualidade de uma nação não é o tamanho do seu território é a qualidade do seu povo.

 

Bolsonaro, o falastrão

Eu às vezes considero o comportamento do Bolsonaro como o chefe de uma torcida organizada. A maioria é pacífica e vai no estádio apenas para ver o jogo. Bolsonaro está falando para a sua torcida organizada. A quantidade de bobagens que ele fala é para agradar os seus fanáticos, aqueles que não estão preocupados com o Brasil, com o povo, com a qualidade de vida. Então ele vai falando. Bolsonaro colocou o Paulo Guedes como ministro da economia para fazer todo o mal. O papel do Guedes é destruir a economia brasileira e fazer com que o Brasil seja um país totalmente vassalo, dependente dos EUA.

 

Militares e privatização

Bolsonaro colocou um grupo de militares aposentados para dar uma certa garantia para eles. “Olha, estamos aqui”. Eu às vezes vou dormir e fico pensando: Onde estão os militares nacionalistas que defendiam a indústria nacional, que defendiam a Petrobras, a Eletrobras, o etanol, que defendia tudo que feito por eles, inclusive. Aí eles vão privatizando e você vem quem comprou e descobre que é estatal espanhola, italiana, chinesa.

Eu não acho que militar é brinquedo. Eles têm papel importante na questão da soberania, de possíveis ataques inimigos, não contra o nosso povo. E é por isso que eu quero as Forças Armadas preparadas.

Quando eu cheguei na presidência, pergunte ao general Villas Boas, soldados eram liberados 11h porque não tinham o dinheiro para o almoço. Tinha soldado que não tinha coturno. Eu criei o Soldado Cidadão para que eles tivessem curso de formação profissional

 

Desmonte na Educação

Eles querem destruir as universidades porque eles sabem que foi um nordestino que só tem como formação o quarto ano do primário e um curso do Senai, que tem noção que inteligência não está ligada a quantidade de anos na escola porque eu não troco meu diploma pelo de muitos universitários que eu vejo falando por aí. Eles não querem admitir que um analfabeto filho da dona Lindu criou mais universidades do que todo mundo. O Brasil em 100 anos fez seis escolas técnicas e eu e a Dilma fizemos quase 500. E mais: triplicamos o orçamento da educação. Educação não é gasto. É investimento.

 

Reconhecimento internacional

Este que vos fala, mais os meus governos, e um homem companheiro da qualidade do Celso Amorim, fizemos com que este país pela primeira vez fosse protagonista da política internacional.

O Brasil tem que ter relação com todos os país. Um país que quer ser protagonista internacional tem que ser generoso. Ele não pode olhar para a África pensando em dinheiro. O nosso jeito desse ser a gente deve aos africanos. Então a gente tem que pensar num comércio que eles sejam superavitários.É um pagamento por 300 anos de exploração. A gente deve aos africanos.

Na América do Sul a mesma coisa. Porque os EUA nunca quis que o Brasil fosse o protagonista na América do Sul.

 

Polícia Federal

Eu não me arrependo do que fiz (fortalecer a PF). Eu acho uma instituição extraordinária, que tem que ser fortalecida, tem que ser independente. Eu fui o presidente que mais contratou gente nas Forças Armadas, que mais investiu em inteligência e não me arrependo. O fato de ter delegado me xingando, xingando a Dilma, ele vai ser julgado pela história. Ele pode ter voto que ele quiser, mas não pode ter posicionamento político. Isso valepara o Ministério Público Federal, para todos.

 

Argentina

Eu vi o discurso de Bolsonaro contra a vitória do Alberto Fernández eu não acreditei que um presidente do Brasil tivesse a insensatez de falar do seu mais importante parceiro comercial e estratégico e ofender o povo argentino, ofender quem ganhou a prévia e ainda ofender o povo gaúcho.

O que ele acha? Que bom para Argentina é o Macri que elevou a inflação a 74%, que elevou a dívida externa, que aumentou gente morando na rua.

 

Reforma política

Isso não depende do presidente da República. Você não consegue passar uma reforma política se você ferir os interesses de algum deputado. Ninguém quer furar a almofada do banco que está sentado.

 

Reforma tributária

Em abril de 2007 eu mandei para o Congresso uma política de reforma tributária aprovada por 27 presidentes de federações nacionais, por todas as centrais sindicais, por todos os líderes de partidos políticos do congresso nacional e ela foi entregue por mim. Eu achei que quando ela seria aprovada por unanimidade porque todos tinham concordado então quem não aceitou?

 

Recado aos detratores

É importante que eles saibam que eu não estou aqui inocente (…) Eu estou aqui porque eu quero. Eu poderia ter saído do país, tive um monte de oportunidade, não quis sair porque o jeito que eu tenho de colocar bandido na cadeia é ficando aqui. Quanto tempo eu não sei, mas eu quero provar que eles são bandidos e eu não.

 

Delação do Eduardo Cunha

Você acha normal uma Polícia Federal que foi em casa e levou até o tablet do meu neto não conseguiu pegar o telefone do Cunha? Não pegou porque o Moro mandou não pegar. O que tinha no telefone que o Moro não queria que ninguém soubesse?

Por que eles não aceitaram a delação do Cunha? Tudo isso Moro tem que explicar e ele não tem mais toga. Ele se escondeu atrás da toga. Ele tem de se explicar para a sociedade brasileira.

 

Outro Brasil

Eu provei com o apoio do povo brasileiro que é possível consertar este país. Eu fui amigo de todos os países do mundo. Eu não tive inimigos. Você tem que colocar dinheiro na mão do mais pobre. É por isso que nós fizemos tanta política social. A coisa que eu tinha mais orgulho é quando o cara falava para mim “Lula, estou comendo picanha”.

É importante as pessoas saberem que este país que está sendo destroçado já foi um grande país.

 

 

29
Ago19

Sob o manto da lei, o Estado pode cometer qualquer despropósito: condenar, humilhar e até matar

Talis Andrade

Controle do Abuso de Autoridade – proteção do cidadão

tacho abuso de autoridade.jpg

 

por Paulo Pimenta

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Em uma democracia, aqueles que cumprem a lei não deveriam se sentir ameaçados com a aprovação do Combate ao Abuso de Autoridade. Em nenhum momento o objetivo foi impedir as instituições de funcionarem de forma plena, autônoma e justa.

No decorrer da história, com a expansão do poder do Estado, o seu uso irregular e seus excessos, surgiu a necessidade de impor limites na relação entre este poder e o cidadão.

É nesse cenário que o Congresso aprovou o projeto que atualiza a Lei 4.898/1965, definindo os crimes de abuso de autoridade cometidos por agentes públicos, servidores ou não, que, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las, cometam excessos.

A violação dos direitos individuais, econômicos, sociais e ações contra o interesse público, são algumas das formas de abuso de poder para as quais a sociedade criou instrumentos legais, fundados no respeito aos direitos e garantias individuais, como forma de disciplinar e conter os excessos da atividade pública.

Os erros cometidos em nome do Estado, através de seus agentes, têm peso e responsabilidade superiores daqueles cometidos pelo cidadão comum. Quem de nós não conhece alguém que, em algum momento da vida tenha tido seus direitos violados pelo Estado? Na ampla maioria das vezes, a vítima submetida a humilhação e condenação pública não tem como ser reparada.

Foi o caso do Reitor da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Luiz Carlos Cancellier de Olivo. Acusado injustamente, foi algemado, despido e preso. Com o apoio da mídia virou símbolo de corrupção. Segundo a OAB, não havia contra ele nenhuma acusação desta ordem. Mesmo assim, foi afastado do seu cargo e proibido de pisar na universidade que frequentava há quatro décadas, para a qual nunca voltou. Acabou por tirar a própria vida por não suportar o julgamento injusto e a humilhação pública.

A história nos mostra que sob o manto da lei, o Estado pode cometer qualquer despropósito: condenar, humilhar e até matar. Se vier com as bênçãos e holofotes da mídia é garantia de impunidade e muitas vezes, de apoio popular.

A nova lei vale para todas as autoridades, seja do Executivo, Legislativo, MP ou Judiciário. A OAB, a maioria do STF, o presidente do STJ, entre outros, a consideram fundamental. E os defensores do Estado Democrático de Direito também.

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