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O CORRESPONDENTE

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31
Jan20

127.585 estupros, dos quais 63,8% ocorreram em menores de 14 anos

Talis Andrade

 “Entre 40% e 60% dos casos de gravidez na adolescência resultantes de violência sexual"

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A campanha pela abstinência sexual que Damares Alves pretende lançar durante a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, prevista para acontecer na primeira semana de fevereiro em parceria com o Ministério da Saúde, comandado pelo médico ortopedista Luiz Henrique Mandetta, vem colocando os dois ministros em lados opostos. O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos dita ―ou tenta ditar― as diretrizes da ação, mas o custo de 3 milhões de reais será bancado pelo Ministério da Saúde. Em nota técnica obtida pelo jornal O Globo no último fim de semana, a pasta comandada pela pastora evangélica afirma que o início precoce da vida sexual leva a “comportamentos antissociais ou delinquentes” e “afastamento dos pais, escola e fé”, entre outros resultados.

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Já a pasta de Mandetta afirmou, em outra nota técnica, que a campanha deve reforçar a autonomia e o protagonismo do jovem sobre sua iniciação sexual, colocando à disposição os métodos contraceptivos. Ao jornal Folha de S. Paulo o ministro afirmou que a mensagem do “comportamento responsável é válida”, mas que “o problema é complexo” e “não se pode minimizar a discussão e dar ênfase só para isso". Ele também disse que questões religiosas não devem pautar a discussão e que tem "apostado muito muito em informar as consequências, porque acredito que esse seja um ponto essencial para a conscientização”.

Fora desse embate estão os números alarmantes de estupros cometidos em meninas menores 14 anos, uma das principais causas da gravidez precoce, segundo diversos especialistas e estudos. Os dados mais recentes constam no último relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A entidade mostra que nos de 2017 e 2018 foram registrados um total de 127.585 estupros, dos quais 63,8% ocorreram em menores de 14 anos ―o que se configura como estupro de vulnerável. Além disso, 81,8% dos casos aconteceram em mulheres, 75,9% foram cometidos por alguém conhecido e em de 95% deles os autores pertencem ao sexo masculino. “É de se destacar que os crimes sexuais estão entre aqueles com as menores taxas de notificação à polícia, o que indica que os números aqui analisados são apenas a face mais visível de um enorme problema que vitima milhares de pessoas anualmente”, afirma o texto.

A ministra Damares também vem apontando para o aumento dos casos de doenças sexualmente transmissíveis, como a sífilis. Em julho do ano passado, a ONU apontou que o contágio do vírus da AIDS no Brasil cresceu 21% em oito anos, apesar das campanhas e tratamentos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Essa tendência já vinha sendo observada por entidades e especialistas, que apontam para o nível de desconhecimento das novas gerações, que não vivenciaram o pânico gerado pelos primeiros contágios a partir da década de 1980. Seja como for, o Governo Bolsonaro foi criticado por ter transformado o órgão responsável pelo combate à doença em uma coordenadoria dentro do Ministério da Saúde —antes, era um departamento específico. Na prática, isso significou que a política de enfrentamento ao vírus, tida como referência no combate ao HIV em todo o mundo, perdeu relevância.

A ministra também abordou na entrevista alguns problemas reais e apelou para o senso comum: “A gravidez precoce está crescendo de uma forma absurda. E mais do que a gravidez precoce, as doenças sexualmente transmissíveis. Sabiam que estamos em epidemia de sífilis?

Em relatório de 2017, a Unicef aponta “entre 40% e 60% dos casos de gravidez na adolescência resultantes de violência sexual”..

Além disso, o estudo destaca que os abusos ocorridos repetidas vezes aconteceram em 45,6% dos casos de meninas de 10 a 14 anos e 25,7% das jovens de 15 a 19 anos. Entre as que ficaram grávidas em decorrência de estupro, em 72,8% (10 a 14 anos) e 44,1% (15 a 19 anos) dos casos a violação teve caráter repetitivo. Portanto, continua o estudo, “a gravidez na adolescência e as notificações de estupro podem estar associadas, evidenciada pela alta prevalência de violência de repetição, de ocorrência de estupro e outras vulnerabilidades”.

A ministra Damares Alves não nega esta realidade e diz que defende a educação sexual em escolas, desde que falada “de forma certa”. Coincidindo com movimentos feministas, afirmou ao Correio que “quem for falar para a criança de 3 anos sobre educação sexual deve fazê-lo inclusive para empoderar essa criança a se proteger”. Ela inclusive aproveitou para lembrar seu histórico pessoal de violação: "Vocês conhecem a história do meu abuso, daquele momento terrível da minha vida. Se eu soubesse o que era aquilo, eu teria gritado. Eu tinha 6 anos”. 

relatório da Unicef também aponta quatro “macrofatores” causais para o alto índice de gravidez precoce: além da violência sexual, aponta para o “descompasso entre o desejo sexual e o risco de gravidez, que pode resultar na gravidez não planejada (escapulida)”; a “vontade da maternidade, que resulta na gravidez desejada”; e a “necessidade de mudança de status social, que resulta na gravidez estratégica”.

Nesse contexto cabe também destacar o elevado número de uniões estáveis e casamentos entre adolescentes, uma realidade para 23,2% das meninas com de 10 a 14 anos, e 36,8% entre aquelas de 15 a 19 anos, lembra o Ministério da Saúde. “As dificuldades para resolver os vínculos de dependência do grupo familiar podem levar os jovens a buscar uma pseudoindependência, substituindo os laços com os pais pela dependência afetiva do casal. A adolescente que vive em um meio social desprovido de recursos materiais, financeiros e emocionais satisfatórios pode ver na gravidez uma expectativa de futuro melhor, embora ela possa se tornar mais vulnerável nessa situação”, explica. A Unicef coloca o Brasil como o país com mais casamentos precoces da América Latina e o quarto de todo o mundo.

[Transcrevi trechos de reportagem de FELIPE BETIM. Leia mais no jornal El País

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